Nos últimos anos, para evitar a colheita do tabaco em meses muito quentes, aumentou o número de produtores que têm antecipado o plantio. É comum ver mudas já em pleno desenvolvimento nas lavouras durante o mês de maio ou, nos canteiros, estarem em preparação final. Infelizmente, este período em 2024 coincidiu com a maior enchente da história, prejudicando agricultores que já tinham plantado ou que estavam em vias de plantar.
Não bastasse as áreas completamente perdidas em Venâncio Aires na safra 2024/25 – 28 hectares nos distritos de Vila Mariante e Vila Estância Nova, conforme levantamento da Emater – , este ciclo vai ter uma redução de cerca de 200 hectares em todo o território municipal. Dos 8,4 mil projetados em condições normais, caiu para 8,2 mil diante do novo cenário. Além de não dar o tempo necessário para recuperar o solo, o que demandaria cerca de dois meses, muitos produtores perderam as mudas e até as estufas, portanto nem têm lugar para secar o tabaco. Assim, algumas propriedades se tornaram inviáveis e forçaram os agricultores a buscarem outras terras.
É o caso dos Silva, que moravam há quase 30 anos em Picada Mariante, uma das localidades inundadas pelo avanço do rio Taquari. A enchente destruiu galpões, estufa e os canteiros onde foram preparadas 30 mil mudas, as quais já seriam levadas para a lavoura na primeira semana de junho. Também morreram 23 cabeças de gado e quatro cavalos. “Para lá a gente não volta”, garantiu Marcia Brandão da Silva, 54 anos. Depois de serem resgatados da enchente, ela, o marido Ademar, 58 anos, e o filho Kelvyn, 19, foram acolhidos na casa da filha Kelly, 32, que reside no bairro Santa Tecla. Começaram, então, a busca por um novo pedaço de chão para seguir a vida e encontraram uma área em Linha Tangerinas. Toda a propriedade, que também tem casa e galpões, será arrendada para os Silva conseguirem fazer a safra.
A ideia, segundo Ademar, é plantar de 40 mil a 50 mil mudas, e ele já está em tratativas com conhecidos para consegui-las. “Agora é preparar a terra e plantar até o fim de julho. Queremos seguir na agricultura, é nosso ganha-pão”, destacou Ademar. Na noite de terça, 4, foi a primeira da família dormindo na nova casa, mobiliada com móveis doados. “Dizem que na vida a gente vai para onde o vento leva. Nós viemos para onde a água levou. Mas não tenho do que reclamar. A gente tem saúde e vai trabalhar, porque o futuro a Deus pertence.”
Em busca de outra área
Entre os agricultores que ainda estão em busca de um novo pedaço de chão para garantir a safra 2024/25 está Luís Carlos da Silva, 35 anos, que também morava em Picada Mariante. Na propriedade dele, a enchente, além dos galpões e fornos, destruiu a casa. Desde então, ele, a esposa Sheila, 40 anos, e a filha Isadora, 7, estão morando em Bom Retiro do Sul, com a sogra de Luís.
O produtor já tinha plantado 10 mil pés de tabaco e perdeu mais 40 mil mudas. “Eu tirei as bandejas e coloquei em cima do forno, achando que iam estar seguras. Mas a água cobriu tudo.” Segundo Luís da Silva, a intenção é fazer uma safra, mas está difícil encontrar área. “A gente não vai voltar para Picada Mariante e estamos pensando seriamente em ir para outro lugar. Em Venâncio está difícil, por isso talvez vamos para Santa Cruz. Lá ainda tem mais terra disponível.”
“Para quem saiu só com a roupa do corpo e 35 dias depois já ter uma casa e estar pensando na safra de tabaco, não posso reclamar. Só agradeço a Deus de poder acordar de manhã e ver o sol, porque tem milhares numa situação muito pior.”
ADEMAR DA SILVA – Agricultor
R$ 1,740 milhão – é o prejuízo financeiro no tabaco devido à enchente e excesso de chuva. Considerando todas as culturas, as perdas na agricultura passam de R$ 65,1 milhões.