Visão (e a falta dela)

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Recorro outra vez à visão privilegiada de Raulzito no retorno a este espaço. Em Aluga-Se, escrita no já distante ano de 1980, Raul Seixas, o baiano mais ianque da música do século XX, saca que não há mais solução para a Pátria Amada se não ganhar algum dinheiro e locá-la para alguém do estrangeiro. Quase quarenta anos se passaram e ainda não surgiu hipótese mais razoável. Vejamos um minúsculo de exemplo do que (não) acontece por aqui.

Aleluia

Está estampado no noticiário da semana: comissão do Senado aprova projeto de lei do senador Dário Berger (MDB-SC), que transfere para as segundas-feiras todos os dias festivos que coincidirem entre terças e sextas-feiras. Com exceção de feriados maiores e mais tradicionais, como 1º de Janeiro, Natal, Sexta-Feira Santa/Páscoa, Corpus Christi, Independência, Nossa Senhora Aparecida e Dia do Trabalho, bem como os de cunho municipal e estadual. O projeto segue para a Câmara dos Deputados e, se acatado, já vai para sanção presidencial.

Obviedade

Pois bem: antes muito tarde do que incrivelmente ainda mais tarde para se pensar em algo tão evidente. Mas a limitação é tamanha que até para meramente copiar algo simples, há tanto tempo praticado noutros lugares, o Brasil se complica. Com exceção de datas muito representativas, vide as supracitadas, feriado é na segunda-feira, emendado no fim de semana e com data pré-definida. Por motivos óbvios. O exemplo dos EUA e outros lugares é claro. Dia do trabalho (para eles)? Na primeira segunda-feira de setembro. Aniversário de George Washington, o primeiro presidente da nação? Terceira segunda-feira de fevereiro. E ponto final. Cristalino e funcional como o Brasil faz questão de não ser.

Eu quero ver o oco

A fraqueza intelectual é tamanha que, em Sebastianfield, é recorrente a discussão sobre o feriado de aniversário do município, em 11 de maio, ter sido trocado por outro regional (Dia do Colono e Motorista), para atender a um pedido do comércio, sob o pretexto de evitar prejuízos nas vendas para o Dia das Mães. Pois bem: em meio a tantos inócuos apertadores de mãos profissionais pretendentes à ocupação de tribunas, nenhum teve tirocínio sequer para sugerir que a data seja comemorada anualmente na segunda-feira imediatamente após a data de homenagem às mães – o que cairia sempre entre 9 e 15 de maio. Ficaria em paz com os lojistas e com a própria data – e ofereceria um feriadão do qual duvido que alguém ia reclamar.

Três acordes

# Ah: o Brasil possui muitos feriados no calendário, de fato. Só os nacionais, na prática, são doze. Mas os EUA possuem dez. Não está tão grotescamente acima.

# Numa terra em que é tamanha a dificuldade de ver o óbvio é meramente seguir algo simples que funciona, o buraco é muitíssimo mais embaixo do que o número de dias de folga do trabalho.

# Em tempo: qualquer interessado, com absoluta razão, vai impor como cláusula pétrea para locação nacional que esta se restrinja à área física do Brasil e tudo o que ela comporta. O sistema de (falta de) funcionamento das coisas serve não mais do que para ser dinamitado sem cerimônias.

    

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