Nascido em Maringá, no Paraná, Luís Bonifácio Junior dificilmente imaginaria que encontraria sua segunda casa aos 35 anos. O fixo de imponência e cara fechada é, para quem o conhece, um personagem ímpar e um ser humano especial. Boni esbanja juventude, no topo dos seus 42 anos, e é um dos líderes do atual elenco da Assoeva – equipe da qual veste o manto desde 2015.
Antes da equipe venâncio-airense, Boni havia trabalhado com o treinador Fernando Malafaia no Umuarama, do Paraná, onde ficou por nove anos. O primeiro ‘flerte’ com a Assoeva foi em 2014, quando não aceitou o convite – à época, o clube já era comandado por Malafaia. Contudo, não resistiu ao desafio no ano seguinte. “Tinha uma escolinha em Umuarama e ficava próximo da minha cidade natal, mesmo assim, precisava de novos ares”, frisa.
Porém, quem não acompanhou a trajetória desde o princípio, não sabe que os primeiros passos foram complicados. “Demorei para me adaptar, nos primeiros jogos não estava bem. Em 2016, tudo começou a fluir para mim, comecei a me conectar mais com o clube e a cidade”, relembra o atual capitão da Assoeva.
Chegou, então, 2017, tão citado em todas as histórias, pelas conquistas do Gauchão Adulto e Sub-20 o vice-campeonato da Liga Nacional de Futsal (LNF). Este que, para o fixo, foi ainda mais especial, pois havia feito uma cirurgia de tendão no ano anterior e finalizava sua recuperação. “Fiz um grande ano. Estive na seleção da Liga Nacional de Futsal da temporada, comecei a fazer história dentro do clube, claro que não estava sozinho, mas com todo o elenco”, detalha.
Amor da torcida
Considerado um dos maiores – senão o maior – ídolo da história da Assoeva, Boni acredita que a conexão com o torcedor ocorre pela identificação criada a partir da vontade e raça que impõe em quadra. “Me considero uma pessoa humilde e contente com o que faço, me dedico ao máximo em tudo. Posso não ter a qualidade de craques como o Valdin, mas tenho dedicação e raça”, autoavalia.
Inclusive, essa raça foi se alterando com o passar dos anos. Atualmente, Boni considera que ‘pensa mais do que corre’, e, com isso, consegue ajudar a equipe de outras formas. “Não tenho mais a explosão física que tinha antes, minha recuperação é mais demorada, mas a experiência auxilia nisso.”
Para Boni, o projeto desenvolvido nas categorias de base é o que, a longo prazo, pode formar novos ‘Bonis’ e ‘Valdins’. Mas o fixo não pensa em aposentadoria e espera terminar mais forte em 2022, renovando por acreditar nesse novo projeto.
Venâncio é a minha segunda casa. Minha filha está morando aqui, fui pai recentemente, minha esposa mora aqui. Aprendi a amar a cidade e a cada dia amo mais. O projeto é que eu fique, mesmo após a carreira, talvez tendo outra função dentro da Assoeva, ajudando o clube a se manter por outros 70, 90, 100 anos.”
Atual elenco
Goleiros: Pedro Henrique, Vitinho e Andrey
Fixos: Boni, Kauê Brazil, Mateus Lima e Zé Antônio
Alas: Guilherme, Ian Lucas, Romarinho, Valdin, Léo Borges, Biro, Rafinha, João Rey
Pivô: Éverton
Comissão técnica: supervisor – Eliel Hammes; técnico – Fernando Malafaia; preparador de goleiros – Carlos Moises Pereira Dipp; preparador física – Airton dos Santos Alonço Junior; fisioterapeuta – Angelo Cattani Pereira; atendente/roupeiro – Jair Vanderlei Candido (Lei); médico – Wladimir Scalcon de Moraes e fotógrafo – Cristian Frantz.
Momentos marcantes
Em 2016, numa partida contra o Intelli, de Santo André (SP), o grupo estava em um ótimo momento e o adversário tinha atletas de alto gabarito. Foi quando o treinador Fernando Malafaia estava fazendo a preleção e entraram dois pássaros no local e ficaram cantando. “O Malafaia falou ‘esse é um bom sinal, vamos vencer’. Resumindo, perdemos de 4 a 0 e não vimos a cor da bola. Até hoje, nunca mais deixamos os pássaros entrarem”, brinca Boni.
Os momentos mais complicados foram durante a pandemia de Covid-19, quando, segundo o capitão, a ausência de pessoas importantes dentro da Assoeva o balançou bastante. “Estávamos presentes e colocamos a cara à tapa. O auge foi em 2017 e não poderíamos, após três anos, fechar as portas. Não podemos deixar que uma trajetória importante acabe.”
A nova geração
Quem se inspira em Boni e busca criar sua própria história é o ala/pivô João Rey, de 20 anos. Criado no interior de Venâncio Aires, em Vila Mariante, o atleta teve sua primeira oportunidade em 2021, após ser selecionado em uma peneira para a disputa do Gauchão Sub-20. “Em janeiro recebi a proposta de integrar o profissional e a minha reação foi de enorme felicidade, estava realizando um sonho de criança, além de ser o sonho da minha avó, que era uma torcedora fanática da Assoeva e grande incentivadora”, ressalta.
De acordo com ele, esses primeiros meses estão sendo de aprendizado e adaptação, nesta, que é sua primeira experiência profissional. Anteriormente, ele havia atuado no futebol por quatro anos em clubes da região e disputou o Campeonato Gaúcho de base pelo Esporte Clube Pinheiros, de Taquari, pelo Novo Hamburgo e, o próprio Guarani, de Venâncio Aires.
O atleta afirma que, no começo, quem mais o orientou foi Boni, o qual considera um ‘paizão’, e o treinador Fernando Malafaia, que ajudou consideravelmente nos aprendizados táticos. “Os jovens também se apoiam, principalmente o Guilherme e o Romarinho, que sempre me aconselham. Agora, já me sinto em casa”, comemora. Segundo João Rey, o sonho é fazer história com a equipe e deixar a família orgulhosa, assim como toda a cidade.
Malafaia, um treinador que passou a amar o clube e a cidade
A carteira de identidade pode até informar o nascimento no Rio de Janeiro, mas Fernando Malafaia tem um pé em Venâncio Aires. Em 2013, a convite de Irineu Henn, então presidente da Assoeva, aceitou o convite para ser treinador da equipe, após período no Umuarama, do Paraná.
O objetivo inicial era impulsionar a carreira e buscar novos desafios, contudo, os primeiros passos confirmaram que não seria uma tarefa simples. “Fomos fazendo um trabalho de garimpo, iniciado em 2014, organizando a estrutura. Eram três anos na Liga sem classificar para os playoffs. Até chegar em um elenco que fiquei 100% dono, já era 2015”, recorda.
Se o período de adaptação com o time foi complicado, com o município a identificação foi imediata. Ele relembra que, quando chegou, morava próximo ao Supermercado Imec e se dirigia a pé para o Ginásio Poliesportivo, no Parque do Chimarrão. Na primeira vez que fez o caminho, umas seis pessoas passaram e lhe disseram ‘seja bem-vindo’. “Nunca tinha visto isso na minha vida”, diz ele, que fez diversos amigos na cidade.
Malafaia conta que chegou a receber propostas de outros times durante a primeira passagem pela Capital do Chimarrão. Em 2014, a ACBF, de Carlos Barbosa, fez uma proposta irrecusável, mas que a diretoria da Assoeva foi franca e confirmou a confiança despejada no treinador, que decidiu ficar.
O trabalho começou a se desenvolver e os resultados apareceram, com a semifinal da LNF em 2016 e final em 2017. Porém, em 2018, veio um novo baque com a necessidade de reconstruir o elenco. “Sempre digo que a minha segunda passagem não é a atual, e sim em 2018, quando perdemos todo o elenco, porque o clube não tinha aporte financeiro.”
Depois dos desafios que marcaram 2018, no ano seguinte, Malafaia deixou o clube, tendo retornado neste ano. Marcado pela fala firme, o treinador comenta que, quando voltou, em 2022, e viu o ginásio lotado, mesmo na derrota, agradeceu a Deus por ter retornado. “Foi a melhor decisão.” Ao falar do futuro, ele acredita ser parte de um projeto que está se desenvolvendo para resultados a longo prazo. “Não importa a realidade financeira, meu desejo é ficar.”
“Tenho paixão e admiração pela cidade, no mínimo, como quem nasceu aqui. Perdendo ou ganhando, gosto de levar alegria e contagiar as pessoas.”
FERNANDO MALAFAIA
Treinador