O soco e o pontapé desferidos por Willian Cavalheiro Ribeiro, de 30 anos, contra o árbitro Rodrigo Crivellaro, aos 15 minutos da etapa final do confronto entre Guarani, de Venâncio Aires, e São Paulo, de Rio Grande, na noite de segunda-feira, 4, no Estádio Edmundo Feix – partida válida pela Divisão de Acesso -, não foram os primeiros golpes aplicados pelo meio-campista ao longo de sua carreira. Assim que as imagens da agressão covarde ganharam os meios de comunicação de todo o país, as informações a respeito do histórico do jogador se multiplicaram rapidamente.
Matérias dos mais variados veículos – houve repercussão até fora do Brasil – traçaram um paralelo entre as qualidades de um jogador que reúne condições para vestir a camisa 10 do seu time e o comportamento agressivo que, por muitas vezes, impediu que ele decolasse na carreira de atleta profissional. Revelado pelo Progresso, de Pelotas, o meia teve passagens por quase duas dezenas de equipes do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Paraíba. Em determinado momento, assinou contrato com o Internacional, de Porto Alegre, onde atuou na base.
No entanto, o mau comportamento do atleta esteve em evidência por muitas vezes. Ainda no Progresso, ele agrediu um árbitro e chegou a investir contra o pai de um jogador adversário. Os repetidos atos de indisciplina fizeram com que o meia colecionasse curtas passagens pelos clubes que lhe davam chance. Na Polícia, são três boletins de ocorrência, dois deles por lesões corporais e um por vias de fato. Os registros são de 2009, 2015 e 2021. O mais recente é ainda do mês passado, quando Willian Ribeiro agrediu um torcedor do São Paulo, de Rio Grande, que fazia cobranças ao treinador do time.
Depois da agressão e da prisão do jogador, o São Paulo, que já havia repudiado a atitude por meio de nota, anunciou a rescisão do contrato do atleta. Em razão da repercussão que o caso ganhou, não é devaneio afirmar que os 60 minutos de atuação diante do Guarani – time pelo qual ele também já teve passagem -, no Estádio Edmundo Feix, tenham sido os últimos de Willian como profissional.
Indiciado pelo crime de tentativa de homicídio pelo titular da Delegacia de Polícia de Pronto Atendimento (DPPA), Vinícius Lourenço de Assunção, o agressor foi encaminhado para a Penitenciária Estadual de Venâncio Aires (Peva), em Vila Estância Nova, de onde foi liberado na noite de terça-feira, 5, por volta das 20h.
AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA
Isso porque, em audiência de custódia realizada no fim da tarde, a juíza Cristina Junqueira, da Comarca de Venâncio Aires, concedeu livramento provisório ao jogador, que vai responder ao processo em liberdade. Representante do Ministério Público (MP) contatado pela reportagem da Folha do Mate garante que irá recorrer da decisão ao Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS). Assim que o inquérito policial estiver concluído, a Promotoria vai oferecer denúncia contra o agressor.
Árbitro depõe
• Na tarde de terça-feira, 5, enquanto Guarani e São Paulo completavam o jogo no Edmundo Feix – que terminou com placar de 1 a 0 para o time da casa, gol de Yan Petter -, o árbitro Rodrigo Crivellaro prestou depoimento na DPPA.
• Ele esteve acompanhado da esposa e, depois de ser ouvido, retornou para Santa Maria. Depois da agressão no gramado, Crivellaro ficou desacordado e precisou ser levado para o Hospital São Sebastião Mártir (HSSM).
• Lá, passou por uma bateria de exames e permaneceu em observação. Teve alta somente na tarde de terça-feira. Ao deixar a casa de saúde, o profissional disse que estava bem e garantiu que, apesar do episódio de agressão, pretende voltar a atuar como árbitro.
Segundo apurou a reportagem da Folha do Mate, embora a agressão tenha sido extremamente violenta, não há previsão legal para Willian ser banido do futebol, como chegou a se especular. Ele pode pegar até 180 dias de suspensão. O caso respeitará o mesmo regramento dos julgamentos do Tribunal de Justiça Desportiva e, no momento, o jogador está suspenso preventivamente.
Márcio Chagas: “Isso é omissão e covardia”
O ex-árbitro Márcio Chagas da Silva, de 45 anos, que encerrou sua carreira em 2014, após sofrer injúrias raciais quando apitava uma partida entre Esportivo e Veranópolis, em Bento Gonçalves – teve ainda bananas jogadas contra o seu veículo, que também foi danificado a chutes -, publicou no Instagram uma manifestação repudiando o episódio ocorrido em Venâncio Aires. Na manhã de ontem, a reportagem da Folha do Mate falou com ele. O ex-árbitro fez duras críticas à Federação Gaúcha de Futebol (FGF), que no seu entendimento deveria ter dado o confronto por encerrado: “Isso é omissão e covardia”.
De acordo com Márcio Chagas, “transferir a responsabilidade para a Justiça Desportiva é algo que não se explica”. Ele acrescentou que, ao não encerrar a partida e dar os três pontos ao Guarani, a FGF “jogou a pressão para cima dos colegas que, um dia antes, tinham presenciado aquela cena estarrecedora”. “Faltou amparo psicológico, financeiro e hospitalar. A atuação foi mais protocolar do que de preocupação”, comentou.
Ele também classificou a categoria como “egoísta”. “Não vi nenhuma manifestação dos árbitros de ponta. Aconteceu com este árbitro a mesma coisa que aconteceu comigo em 2014, quando a FGF queria mesmo era que eu ficasse de boca fechada, o que é uma prática corriqueira. Por isso há esta falta de vontade de que os árbitros sejam profissionais”, argumentou. Para ele, a preocupação com a imagem da federação, dos clubes e do estado está sempre acima dos problemas que se acumulam em relação aos profissionais de arbitragem.
“De seis em seis meses, o árbitro apresenta certidões negativas criminal, de SPC e Serasa. Não tem a mesma cobrança para dirigentes e jogadores. Se fosse obrigatório, certamente muitas pessoas que estão envolvidas com o futebol não estariam exercendo suas funções.”
MÁRCIO CHAGAS DA SILVA – Ex-árbitro Fifa
