Criado com o objetivo de promover atividades de vigilância em saúde, analisar e investigar os registros de suicídios e violência, realizar a busca ativa dos sobreviventes e, principalmente, desenvolver ações de sensibilização, o Comitê de Prevenção dos Suicídios de Venâncio Aires completou cinco anos de fundação em setembro.
Composto por profissionais de diferentes setores e instituições do município, o órgão é considerado exemplo no estado e marca uma nova fase no trabalho de promoção da vida na Capital do Chimarrão, que sempre foi reconhecida pela alta taxa de mortalidade por suicídio. Coordenadora do Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Outras Drogas (Caps AD), a enfermeira Patrícia Antoni foi a primeira a liderar a entidade.
Em entrevista ao programa jornalístico Folha 105 – 1ª Edição, da Terra FM 105.1, ela lembrou que antes da existência do comitê eram feitas ações isoladas de prevenção ao suicídio em Venâncio Aires e focadas, especificamente, no mês de setembro, quando tradicionalmente é desenvolvida a campanha Setembro Amarelo.
Além disso, não existia uma articulação forte entre os setores e os serviços. “A ideia do comitê surgiu depois de uma pesquisa realizada pela Secretaria Estadual de Saúde em parceria com o Cevs [Centro Estadual de Vigilância em Saúde], o Observatório do Suicídio, entre 2016 e 2017. Eu participei ajudando na coleta dos dados e na articulação das informações”, recordou.
Fundação
Os resultados desse estudo foram divulgados entre 2018 e 2019 e uma das propostas sugeridas envolvia a instituição de um plano regional de promoção da vida e prevenção dos suicídios, além do estímulo para a criação de comitês. Segundo Patrícia, a partir disso, uma das missões era a formatação de um plano municipal de prevenção dos suicídios.
“Mas isso é muito difícil de cumprir somente com uma ou duas pessoas. Foi então que surgiu a ideia de articular mais serviços e mais profissionais para planejar e executar as ações um pouco mais sistematizadas no município”, mencionou. Com o grupo sendo consolidado, o desafio na época foi encontrar os profissionais sensibilizados para discutir e pensar em políticas públicas focadas nesse assunto, especialmente em razão do tabu existente sobre a temática.
“Para estudar sobre o tema, fazer as ações e disseminar o conhecimento sobre a prevenção do comportamento suicida precisa ser sensível ao assunto, ser impactado de alguma forma. Esse foi o desafio inicial”, citou Patrícia. Ao longo desses cinco anos, o Comitê Municipal de Prevenção dos Suicídios evoluiu, aprimorou ações e capacitou os membros internos, para que eles estejam aptos a replicar os conhecimentos com outros profissionais e com a comunidade.
Para o futuro, um dos desafios é encontrar alternativas para promover o debate sobre o assunto não apenas no Setembro Amarelo. “Que as pessoas falem sobre isso nas rodas de conversas. Não sobre os mitos, mas onde é possível e como procurar ajuda”, ressaltou.
“O comitê está sendo cada vez mais conhecido e os desafios para o futuro sempre serão continuar reforçando que todos podemos fazer prevenção dos suicídios, não apenas o comitê ou os profissionais de saúde, e falar sobre esse tema do ano todo e não apenas no Setembro Amarelo.”
PATRÍCIA ANTONI
Primeira coordenadora do Comitê de Prevenção dos Suicídios
Projetos do comitê
- O Encontro de Sobreviventes Enlutados por Suicídio ocorre mensalmente na sala 5 da Paróquia São Sebastião Mártir, na rua Tiradentes, número 748, ao lado do Pavilhão de Eventos São Sebastião Mártir, no Centro, das 14h às 16h. O cronograma prevê que as próximas atividades serão promovidas nos dias 9 de outubro, 13 de novembro e 11 de dezembro.
- Projeto Informar é Prevenir, que busca promover minipalestras e um bate-papo em escolas e empresas que tenham interesse e façam contato com a entidade para receber a ação. As temáticas abordadas são variadas e pensadas conforme o público-alvo a ser atendido.
- A entidade também lidera a organização da programação do Setembro Amarelo, em parceria com a Prefeitura. Além disso, a psicóloga Zamara Silveira, que atua na Vigilância Epidemiológica e no Centro de Atendimento de Doenças Infectocontagiosas (Cadi), é responsável por entrar em contato, por telefone ou pessoalmente, com familiares que perderam alguém por suicídio.
Funcionamento
- Os encontros do Comitê Municipal de Prevenção dos Suicídios são mensais e ocorrem na segunda quinta de cada mês. A reunião envolve diversos profissionais que representam as áreas da Saúde, Educação, Atenção Primária, unidades dos Centros de Atenção Psicossocial (Caps), Vigilância Epidemiológica, Hospital São Sebastião Mártir (HSSM), Núcleo de Apoio à Saúde da Família (Nasf), Centro de Referência de Assistência Social (Cras), Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas), Conselho Tutelar, Corpo de Bombeiros, Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) e Conselho de Psicologia.
“Venâncio tem se tornado uma referência na região”
As iniciativas promovidas pelo Comitê Municipal de Prevenção dos Suicídios, com o apoio da Prefeitura, têm despertado olhares de municípios vizinhos, que veem na Capital do Chimarrão um exemplo a ser seguido. “Venâncio tem se tornado uma referência na região por estar todo esse tempo com essas ações e ideias. Vários municípios vêm nos acompanhando e nos procuram para que a gente auxilie na criação dos seus comitês. Isso é muito importante, pois estamos servindo de espelho e é muito interessante essa forma de mostrar o trabalho do comitê”, avaliou a atual coordenadora da entidade, Analuci Pesqueira.
A fisioterapeuta também concedeu entrevista ao programa jornalístico Folha 105 – 1ª Edição, da Terra FM 105.1. Na oportunidade, além de citar a relevância do comitê, ela reforçou os objetivos do trabalho realizado pela equipe, entre eles a mobilização para que as pessoas procurem ajuda na rede de atenção psicossocial e a promoção de atividades de prevenção e posvenção, esse último para auxiliar as pessoas enlutadas pelo suicídio de alguém.
Para a coordenadora municipal, outra importante missão do órgão é realizar capacitações, ações de sensibilização sobre esse tema e palestrar a respeito da prevenção do suicídio e autolesão. Ao encontro da afirmação de Analuci, o coordenador do Comitê Estadual de Promoção da Vida e Prevenção dos Suicídios, Bruno Moraes da Silva, também ressaltou que Venâncio Aires se tornou uma referência para outras cidades gaúchas com a criação de uma entidade específica para formatar e trabalhar ações focadas na prevenção dos suicídios.
De acordo com Silva, é perceptível um aumento na taxa de suicídios no Brasil e no estado essa realidade não é diferente. “Entre 2015 e 2023 a taxa de mortalidade no Brasil aumentou 38%. No Rio Grande do Sul, neste mesmo período, cresceu 32%. Fechamos 2023 com 1.548 óbitos, conforme dados preliminares. Por isso, devemos debater e discutir esse tema com os profissionais e com toda a sociedade”, salientou.
“Desde que o comitê existe, Venâncio tem tido um olhar diferente. Isso tem divulgado o nosso trabalho e mostrado porque o comitê se faz presente e a importância dele no município. Uma das principais conquistas desse trabalho é falar sem receio sobre esse assunto, mas sim com esclarecimentos e informações corretas às pessoas. Ajudar a conscientizar sobre como devemos agir quando alguém nos pedir ajuda ao falar sobre seus pensamentos, suas emoções e seus comportamentos.”
ANALUCI PESQUEIRA
Coordenadora do Comitê de Prevenção dos Suicídios
De acordo com o psicólogo, para combater esse fenômeno, desde 2016 existe o Comitê Estadual de Promoção da Vida de Prevenção dos Suicídios. Durante o programa o programa jornalístico Folha 105 1ª Edição ele explicou que o objetivo dessa entidade é apoiar profissionais, elaborar materiais e realizar eventos e campanhas para estimular que as regiões e os municípios instituam os próprios comitês. “Nesse modelo, Venâncio Aires é um exemplo a nível estadual e tem um dos comitês mais ativos do nosso estado”, afirmou.
O coordenador do comitê estadual ainda destacou que a partir da instituição de entidades municipais é possível discutir as melhores formas de abordar a prevenção do suicídio e promoção da vida na comunidade e ir ao encontro das principais dificuldades da região, além de fortalecer as estratégias que os municípios têm de melhor. Ele também reforçou a importância de discutir a prevenção do suicídio o ano inteiro. “A demanda para os profissionais e para os serviços não chega apenas neste mês [setembro]. Então, devemos fortalecer e discutir essa pauta de uma forma responsável durante todos os meses do ano.”
“Quando o próprio município institui seu comitê, a análise dos dados, a realização de campanhas e a promoção de eventos consegue captar a especificidade da região. Venâncio Aires, a partir do seu comitê, consegue fazer campanhas e realizar eventos que conversam diretamente com os dados que o município apresenta.”
BRUNO MORAES DA SILVA
Coordenador do Comitê Estadual de Promoção da Vida e Prevenção dos Suicídios
Avaliação
- A coordenadora de Saúde Mental de Venâncio Aires, Priscila Reginatto, lembrou que o Comitê Municipal de Prevenção dos Suicídios foi criado meses antes do início da pandemia de Covid-19. “Desde 2019 tivemos um marco na humanidade e as pessoas começaram a olhar mais para a saúde mental e, consequentemente, a procura pelos serviços aumentou.”
- Segundo ela, em 2021 foi criada a coordenação de Saúde Mental na Capital do Chimarrão para focar neste trabalho. “Para se preocupar com a saúde mental das pessoas, dar importância a toda a dor e a todo o sofrimento psíquico que a população de Venâncio viria a ter. De lá para cá intensificamos, também, as ações do comitê e a gestão disponibilizou uma psicóloga para atender diretamente os casos de tentativas de suicídio e de familiares enlutados por suicídio”, relatou.
- A enfermeira ainda salientou o papel fundamental desempenhado pelos meios de comunicação do município, que são parceiros na divulgação do trabalho e fomentam para que as pessoas procurem cada vez mais ajuda, se cuidem e olhem para o próximo com empatia, “porque a prevenção do suicídio é responsabilidade de todos.”
“O comitê faz um trabalho excepcional de prevenção nas empresas, nas escolas, pela cidade e pelo interior. É de fundamental importância essas ações porque com tantos desastres que aconteceram de 2019 para cá a população precisa se cuidar, olhar para a saúde mental de si e das pessoas que estão ao seu redor para prevenir cada vez mais o suicídio na cidade de Venâncio Aires.”
PRISCILA REGINATTO
Coordenadora de Saúde Mental de Venâncio