Projeto sobre alimentação saudável da Emef Nossa Senhora de Fátima vira exemplo para alunos e famílias

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Preocupação que só aumenta entre adultos, a obesidade também já é uma realidade crescente entre crianças e adolescentes. A Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN) reconheceu, em 2022, que a obesidade é um problema de saúde pública e hoje, 3 de junho, é o Dia da Conscientização contra a Obesidade Infantil. Conscientização, aliás, tem sido palavra forte dentro de muitas casas e em escolas, preocupadas com a saúde das crianças.

Davi, 5 anos, adora arroz, feijão, carne e saladas (Foto: Débora Kist/Folha do Mate)

Em Venâncio Aires, por exemplo, um projeto muito bacana ocorre desde o fim do ano passado, na Escola Municipal de Ensino Fundamental Nossa Senhora de Fátima, de Linha Campo Grande. No educandário que tem menos de 40 alunos, entre pré e 5º ano, foi implementado o ‘Criança na Cozinha’, idealizado pela professora e diretora Eliziani Szabelsky de Mattos. Na prática, as turmas de pré A e pré B, que têm 13 crianças entre 4 e 5 anos, participam de atividades lúdicas para conhecer, preparar e provar alimentos ‘de verdade’, a partir de receitas tradicionais e adaptadas. Dessas práticas, que incluem fábulas infantis, visitas nos vizinhos da escola que plantam alimentos e criam animais e, literalmente, colocar a mão na massa no refeitório, as crianças já fizeram, por exemplo, bolo de feijão, biscoito de banana com aveia e cacau e panquecas coloridas, que ganham cor com beterraba, couve e cenoura. “É um momento, nessa fase, que eles assimilam mais. Precisam ter esse conhecimento das várias formas de alimentos para provarem e saberem se gostam ou não. E aprender sobre todos os benefícios dos alimentos. Começamos esse projeto porque muitas crianças não tinham o hábito de lanchar e ficavam a manhã toda sem querer comer. Foi uma forma lúdica que a gente encontrou”, explica Eliziani.

Agente escolar Gislene, a Gi, ajuda no preparo das refeições com as crianças (Foto: Débora Kist/Folha do Mate)

Segundo a diretora, o projeto segue a ideia já implementada há mais tempo pela Secretaria Municipal de Educação (veja a seguir) e, além de se preocupar com hábitos saudáveis, a prática com os pequenos em Linha Campo Grande ajudou num outro ponto: a motricidade. “A maioria veio para a escola com quatro anos e manusear alimentos e mexer com talheres nas receitas ajudou na coordenação dentro da sala de aula, para escrever, pintar e recortar, por exemplo.” Na cozinha, quem dá todo apoio é a agente escolar Gislene Aparecida da Silva, a Gi, que colhe os temperos e alface direto da horta da escola, cultivada dentro de pneus velhos. Em breve, reutilizando canos que sobraram da reforma na escola ano passado, serão cultivados morangos.

Diretora Eliziani no espaço da horta e de temperos da escola (Foto: Débora Kist/Folha do Mate)
Crianças participam do preparo de várias receitas (Foto: Débora Kist/Folha do Mate)

Apoio das famílias

Eliziani Szabelsky de Mattos acredita que projetos mostrados na escola e que as crianças se envolvam na prática, acabam instigando bons hábitos junto às famílias, que também ajudam com doações de alimentos e para a horta. Um exemplo está dentro da casa de Davi Miguel da Luz, 5 anos, aluno do pré B da Nossa Senhora de Fátima. O menino adora um bom prato de comida. “Ele come tudo. Arroz, feijão, carne, ovo cozido e vários tipos de salada. Sempre influenciamos e ele tomou gosto desde muito pequeno. Sei que na escola também adora. Assim é com fruta e não nega nada”, detalhou a mãe, Marcia Lopes dos Santos, 35 anos. A agricultora, que mora em Linha Cerro dos Bois, revelou que Davi até cobra o irmão mais velho, de 17 anos. “Ele diz: mano, tu não come nada saudável. Vai ficar fraco e doente.” E, quando o primogênito diz que não gosta de algo, o caçula segue exigente. “Como tu diz que não gosta, se nem provou?” Marcia ainda elogiou a iniciativa da escola. “A gente sempre quer o melhor para os filhos, né, como ter uma alimentação saudável, para crescerem bem. Na escola fazem esse trabalho bonito e o Davi sempre chega empolgado. Então a gente procura ser parceiro da escola.”

Davi, 5 anos, e a mãe, Marcia: importância de seguir com bons hábitos em casa (Foto: Débora Kist/Folha do Mate)

No fim de 2022, 37% dos alunos de Emefs estavam com excesso de peso

Em 2020, uma resolução do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) proibiu o uso de açúcar no preparo dos alimentos para crianças de até 3 anos nas unidades de ensino. Em Venâncio Aires, a medida se estendeu para todas as turmas das Escolas de Educação Infantil (Emeis) o que, naturalmente, abrange crianças até cinco anos, pelo menos. Nas Emeis, toda alimentação é sem açúcar e o que tem sido usado para adoçar bolos, por exemplo, são uva-passa e banana. A questão nutricional nas escolas municipais é acompanhada de perto pelo Município e, em 2022, foi feito um levantamento em mais de 2,6 mil crianças e adolescentes entre 6 e 15 anos, que estão no Ensino Fundamental. “Do total de avaliados, 37,6% tinham excesso de peso. O dado mostra que vem aumentando, porque há cerca nove anos, indicava 33%”, destacou Josiane Pacheco, nutricionista da Secretaria de Educação.

Dentro desses 37,6% com excesso de peso, 519 alunos tinham sobrepeso, 334 estavam obesos e 145 estavam com obesidade grave. “Os casos identificados como obesidade grave foram encaminhados para a Secretaria de Saúde, para consulta com nutricionista na UBS do bairro Cruzeiro. Já no início deste ano, um bom número de pais marcou consulta e soubemos que já procuraram mudar hábitos em casa antes mesmo do atendimento”, relatou a também nutricionista da Educação, Luana Gomes. Esse mesmo levantamento feito nas Emefs já foi iniciado nas Emeis, mas ainda não há dados concretos dessas avaliações.

O que está proibido nas Emeis e Emefs

• É proibida a utilização de recursos no âmbito do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) para aquisição dos seguintes alimentos e bebidas ultraprocessados: refrigerantes e refrescos artificiais, bebidas ou concentrados à base de xarope de guaraná ou groselha, chás prontos para consumo e outras bebidas similares, cereais com aditivo ou adoçado.

• Também estão proibidos bala e similares, confeito, bombom, chocolate em barra e granulado, biscoito ou bolacha recheada, bolo com cobertura ou recheio, barra de cereal com aditivo ou adoçadas, gelados comestíveis, gelatina, temperos com glutamato monossódico ou sais sódicos, maionese e alimentos em pó ou para reconstituição.

Conscientização dos pais*

Segundo a Sociedade de Pediatria do Rio Grande do Sul, a conscientização dos pais é o maior desafio para combater a obesidade infantil. O relatório público do Sistema Nacional de Vigilância Alimentar e Nutricional, com dados de pessoas acompanhadas na Atenção Primária à Saúde, aponta que, até setembro de 2022, mais de 340 mil crianças de 5 a 10 anos foram diagnosticadas com obesidade. Em 2021, a APS diagnosticou obesidade em 356 mil crianças dessa mesma idade.

A condição traz consequências para a saúde, como desenvolvimento de doenças cardiovasculares, diabetes tipo 2, distúrbios alimentares e baixa autoestima. Atualmente, a região Sul tem 11,52% de crianças de 5 a 10 anos obesas, maior índice do país. A pediatra e membro da Sociedade de Pediatria RS, Cristiane Kopacek, ressalta a importância dos pais terem consciência sobre a relevância de uma alimentação saudável.

“É fundamental discutir as dúvidas com o pediatra, mas o bom senso desempenha um papel crucial. Se perguntarmos a uma criança qual é a opção mais saudável entre uma maçã e uma bolacha recheada, ela saberá responder que a fruta é melhor. Portanto, é importante que os pais também se preocupem em educar seus filhos em relação ao comportamento alimentar”, afirma. (*Fonte: Assessoria de Imprensa Sociedade de Pediatria do Rio Grande do Sul)

“A obesidade infantil tem relação direta com problemas na vida adulta”, alerta pediatra

Pediatra em Venâncio Aires, Fernanda Sousa de Almeida relata que tem aumentado o número de crianças e adolescentes com sobrepeso e obesidade e isso ela percebe tanto nos atendimentos no consultório particular, quanto na rede pública. “Vemos uma preocupação no município com a prevenção nas Emeis, onde não se usa nenhum alimento com açúcar, nem industrializados. Os dados mostram que a obesidade tem muita relação com os alimentos ultraprocessados, pelo fato de serem de fácil acesso, mais baratos, com embalagens coloridas e com personagens, o que atrai.”

“É de vital importância investir na infância, que é onde conseguimos realmente investir em prevenção.” FERNANDA SOUSA DE ALMEIDA Pediatra (Foto: Arquivo pessoal)

A médica explica que o cálculo de Índice de Massa Corpórea (IMC), para crianças, considera a faixa etária e tem diferença pelo sexo. “Sempre que é identificado sobrepeso e erros alimentares, se faz o encaminhamento para a nutricionista. Na rede pública tem disponível também. Medicamentos não são usados na infância e se investe em mudança de hábitos alimentares e incentivo à atividade física”, destacou a pediatra. Ainda conforme Fernanda, o tratamento passa por mudar hábitos em toda a família. “O mais comum é ver o grupo familiar todo com erros alimentares. Não adianta a família ter maus hábitos e querer que a criança faça as mudanças. A obesidade infantil tem relação direta com problemas na vida adulta, como diabete e hipertensão.”



Débora Kist

Débora Kist

Formada em Comunicação Social - Jornalismo pela Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc) em 2013. Trabalhou como produtora executiva e jornalista na Rádio Terra FM entre 2008 e 2017. Jornalista no jornal Folha do Mate desde 2018 e atualmente também integra a equipe do programa jornalístico Terra em Uma Hora, veiculado de segunda a sexta, das 12h às 13h, na Terra FM.

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