
As salas de aula de escolas públicas e privadas estão vivendo um período de intensa transformação. Isso ocorre por conta das mudanças do Novo Ensino Médio. Com várias atualizações acontecendo desde 2021 – quando ocorreu a criação –, é a Lei nº 14.945, de 2024, que regulamenta o modelo desenvolvido nos educandários de todo o país.
De acordo com a legislação, a Formação Geral Básica (FGB) contempla 2,4 mil horas no Ensino Médio. Antes da lei, sancionada no ano passado, eram destinadas somente 1,8 mil horas para estudos dos componentes curriculares tradicionais, como língua portuguesa, matemática, geografia e história.
Além da FGB, os alunos estudam Itinerários Formativos de Aprofundamento (IFAs), a principal novidade da reforma do Ensino Médio. Eles complementam em 600 horas o currículo, e buscam formar oportunidades para o estudante focar em áreas de conhecimento com as quais melhor se identifica.
Itinerários no Novo Ensino Médio
Os itinerários são disciplinas e projetos escolhidos pelos alunos, de acordo com o seu ponto de vista e interesse de aprendizagem. Conforme a Seduc, o estudante ingressa na 1ª série do Ensino Médio aprendendo somente os conteúdos da FGB. Em direção ao segundo semestre, participa de uma ‘feira’ na escola, onde conhece as opções de Itinerários Formativos de Aprofundamento disponíveis para complementar a formação. Os itinerários integram a rotina somente na 2ª série. A definição vai depender da estrutura escolar, professores disponíveis, entre outros. Na 3ª série, retorna para a FGB.
Desafios para alunos e educadores
A primeira análise feita pelos alunos e educadores, que são os que realmente vivem as alterações no Ensino Médio, é a preocupação com mudanças. Elas iniciaram em 2022, quando ocorreu a implementação da reforma do Ensino Médio. Depois disso, foram novas consultas públicas e reestruturações, até a sanção da lei que está em vigor.
Por isso, a comunidade escolar teme novas mudanças que possam acontecer. Segundo Cristiane Bencke Fengler e Thalis José Girardi, respectivamente vice-diretora e o coordenador do Ensino Médio do Colégio Oliveira, alterações frequentes podem trazer prejuízos significativos ao processo de aprendizagem.
Contatada pela reportagem, a Secretaria da Educação (Seduc) destacou a boa receptividade, mas profissionais e estudantes ainda analisam com superficialidade a questão, reafirmando a necessidade de uma adaptação com estabilidade.
Organização
A experiência no dia a dia dos alunos determina organização para garantir a compreensão de todas as atividades propostas. Victor Matheus Coutinho, 16 anos, aluno da 1º série do Ensino Médio da Escola Estadual de Ensino Médio (EEEM) Frida Reckzieguel, de Vila Palanque, relata a complexidade para entender o processo. “A transição do Ensino Fundamental para o Ensino Médio exigiu um pouco mais de dedicação e, principalmente, organização”, aponta.
“Muitos dos meus colegas estão tendo uma certa dificuldade para acompanhar. Talvez isso possa ser decorrente, junto a outras causas, da quantidade de disciplinas, que no total chegam a 19”, comenta. Para ele, a ampliação da carga horária e a indefinição sobre um planejamento concreto pode contribuir para o aumento dos índices de abandono escolar.
A questão da escolha dos itinerários também é analisada com preocupação. Murilo Henrique Frantz, 17 anos, da 2º série da EEEM Cônego Albino Juchem (CAJ), explica que a decisão nem sempre depende somente do aluno. “Se eu optar por humanas, só terei essa trilha caso haja número suficiente de alunos para formar uma turma. Assim, os itinerários não são escolhas totalmente livres”, observa.
Educadores
Do lado docente, a avaliação tem o mesmo ponto de vista. A professora Patrícia Ernzen, 24 anos, que atua no Colégio Gaspar Silveira Martins e no CAJ, explica que o Novo Ensino Médio reconhece o valor do protagonismo estudantil e oferece flexibilidade para desenvolver competências como pensamento crítico e resolução de problemas. Porém, aponta a sobrecarga dos alunos e, principalmente, dos professores.
Segundo ela, a burocracia com preenchimento de planilhas, por exemplo, consome um tempo que deveria ser dedicado ao planejamento das aulas. “E isso deixa os profissionais psicologicamente exaustos”, considera. Outro desafio, conforme a profissional, é o desinteresse de parte dos alunos pelos itinerários, o que torna os planejamentos ainda mais desafiadores.
Apesar dos obstáculos, os exemplos positivos também precisam ser ressaltados, considerando as diversas realidades e os currículos adaptados em cada escola, de acordo com a sua realidade. Na EEEM Crescer, do bairro Coronel Brito, que tem atividades em tempo integral, a proposta é vista como ‘transformadora’.
A direção observa bom engajamento. Porém, a adaptação à rotina é um desafio para alunos e famílias. Muitos alunos ainda não contam com a maturidade necessária para tomar decisões autônomas de forma consciente, sugere a equipe diretiva, reforçando o papel crucial dos professores como mediadores.
Campo
Na EEEM Sebastião Jubal Junqueira, de Vila Deodoro, o Novo Ensino Médio está sendo uma oportunidade para que os alunos possam se conectar à realidade na qual estão inseridos. No caso da escola, as crianças e adolescentes são oriundos de áreas rurais. Por isso, os itinerários formativos têm foco, por exemplo, nas áreas de empreendedorismo e ações sustentáveis no campo.
“Nosso grande desafio é incentivar que esses jovens permaneçam aqui”, destaca a diretora Flávia Johann. “Que vejam no campo não apenas um passado, mas um futuro possível. Cada jovem que permanece e prospera no campo é uma semente de esperança que floresce para toda a comunidade”, completa ela.
Para acompanhar as avaliações dos profissionais da educação e estudantes, será promovida Escuta Ativa pela Seduc, no mês de outubro. A mobilização buscará medir os impactos das mudanças e construir uma política pública que faça sentido para toda a comunidade escolar.
Linha do tempo
- 2017: Aprovada a Lei 13.415/2017, que estabeleceu novas diretrizes para o Ensino Médio no país, flexibilizando o currículo e criando os itinerários formativos.
- 2022: Após alguns anos em tramitação, o Novo Ensino Médio foi implementado no país, de forma obrigatória, por todas as redes de ensino.
- 2023: Governo Federal realiza consulta pública sobre o funcionamento do ensino. No mesmo ano, foi apresentada uma reestruturação.
- 2024: Sancionada a Lei nº 14.945/2024, que regulamenta a Política Nacional do Ensino Médio, e está em vigor atualmente.
Foco no Enem
- Para auxiliar os estudantes na organização para o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), a Seduc implementou, dentro do Novo Ensino Médio, formas de ajudar. Entre os exemplos, está a maior carga horária nas disciplinas básicas e aprofundamento curricular, além de cursos online preparatórios e gratuitos para alunos da rede.
Situação
- A Seduc afirma que todas as escolas em tempo regular e integral, além da educação profissional, já estão com currículos adaptados para o Novo Ensino Médio. Apenas as escolas indígenas terão um prazo estendido até 2026.