‘Negro: uma história em nossa história’ será lançado neste ano

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Contar histórias é uma das maneiras de manter memórias e pessoas vivas. Também é uma forma de conhecer mais o passado e entender o presente. Por isso, o professor de História e presidente do Movimento Negro de Venâncio Aires, Jair Luiz Pereira, 60 anos, pretende escrever o livro ‘Negro: uma história em nossa história’. Serão pelo menos 15 relatos de filhos, netos e bisnetos de pessoas negras do município, entre elas da professora Taís Graziele de Quadros, 27 anos, que irá relembrar a história de seus antecedentes, em especial dos avós.

Taís comenta que começou a buscar um pouco mais da história em novembro, quando o presidente do movimento a convidou para escrever também. Sua mãe, Maria de Lourdes da Rosa, 66 anos, é quem está ajudando a jovem, pois os avós Juvelino dos Santos e Nair Aurora dos Santos, já faleceram. “Foi um grande desafio e também uma alegria”, relata, ao lembrar que seus falecidos avós não contavam muito sobre o que haviam vivido.

Juvelino – avô de Tais – era órfão e isso chamou muito a atenção dela, pois é algo que não sabia. “O meu avô não conheceu sua mãe biológica e também não foi registrado quando era pequeno. Essas são informações que me marcaram muito”, expõe. Ela também afirma que o avô sempre relatava que era descendente de escravos, porém não confirmava qual membro de sua família era escravo. “Uma vez chegou a falar que poderia ser alguém da família materna adotiva, mas não nos deu mais detalhes sobre a história”, ressalta a professora.

Mesmo com dificuldades para ter mais detalhes das histórias, Taís fica feliz em estar ajudando nesse livro, pois salienta ser uma pesquisa importante para a história em geral. “As histórias que encontrei até agora foram relatadas por minha mãe e meus tios, mas como meu avô era bem reservado, não gostava muito de tocar no assunto de sua história, não consegui levantar muitas informações. Como se tratava de uma história de sofrimento e dificuldades, ele preferia não falar”, completa.

PROJETO

O professor Jair Pereira projetava lançar o livro no meio do ano, no aniversário da Associação Négo Football Club Acadêmicos do Samba de Venâncio Aires, mas ele não tem certeza se terá retorno de todas famílias em tempo hábil. Por isso, ainda não tem uma data definida para lançar a obra, que visa contar a história dos negros pelos próprios negros. “A proposta é termos negros contando suas histórias de vida, ou descendentes dessas pessoas relatando as lembranças”, explica.

Ele tem como objetivo receber todas as histórias das famílias ainda neste mês, para então escrever ela junto com o conhecimento da pesquisa que ela já havia feito dessas família para sua tese de mestrado. Mas, mesmo assim, afirma que leva um pouco de tempo para escrever tudo. “Tenho muita informação sobre essas mesmas famílias de uma pesquisa que fiz há alguns anos, mas agora quero primeiro ouvir essas histórias contadas por elas mesmas e não pelo que eu ouvi há anos”, argumenta Pereira.

Ele diz que algumas pessoas têm bloqueios nas memórias, principalmente quando são memórias mais cruéis. “Pessoas que foram escravas ou passaram por grandes traumas por serem negras, acabam bloqueando a lembrança ou não comentam sobre para não sofrerem mais. Por isso, temos um pouco de dificuldade em contar histórias de vida”, esclarece.

Além de escrever e ter a história registrada, o presidente do Movimento Negro também pretende despertar essa vontade de conhecer os antepassados nos jovens. “Quero ver os jovens sentando com os avós e escutando as histórias. Não é só para publicar algo, mas criar laços e guardar essas informações”, salienta.

“Enquanto o leão não tiver seu historiador, prevalecerá a história do caçador. Por isso, eu digo: vamos escrever a nossa história.”

JAIR PEREIRA
Historiador e presidente do Movimento Negro de Venâncio Aires

O livro

• Com linguagem simples, ele pretende escrever o livro para que todos tenham acesso. Ele quer que seja um material que circule nas escolas para alunos de todas idades e também que sirva para pesquisas universitárias.

CURIOSIDADES

  1. O professor Jair Pereira afirma que Associação Négo Football Club Acadêmicos do Samba, de Venâncio Aires, era o refúgio dos negros, por muitas décadas, pois era o único clube que eles podiam frequentar. No clube, faziam festas, desfiles de Carnaval, concursos de beleza e jogavam futebol.
  2. Ele comenta que no local onde fica a Igreja Católica São Sebastião Mártir foi, por anos, um cemitério de escravos. Os escravos, segundo Pereira, eram criados para venda, como se fossem animais domésticos. “Os caras batizavam os escravos em casa, e assim nasceu a cultura. Criavam e depois vendiam ou trocavam por terra”, diz.
Jair Pereira (Foto: Eduarda Wenzel/ Folha do Mate)
Jair Pereira (Foto: Eduarda Wenzel/ Folha do Mate)

Movimento

• Em 18 de junho de 1978, o feirante Robson Silveira da Luz, que tinha 27 anos, foi acusado de roubar frutas na feira onde trabalhava. Ele foi levado para a 44º Delegacia de Polícia na Zona Leste de São Paulo, onde foi torturado e morto.

• Os negros de São Paulo realizaram atos de protesto, os quais se espalharam pelo país. Foi nesse momento de reação nacional que o Movimento Negro Unificado (MNU) do Rio Grande do Sul estabeleceu o dia 20 de novembro, em 1978, como o ‘Dia da Consciência Negra’, para ser o dia em que se refletisse contra o racismo e a discriminação racial.

• Em Venâncio Aires, Jair Luiz Pereira assumiu a tarefa. O encontro foi realizado na sede social do Négo. A proposta do MNU era que a diretoria assumisse a caminhada. A criação do Movimento Negro do município, oficialmente, só ocorreu em meados de 1980, com a proximidade do centenário da abolição da escravatura, aproveitando a divulgação e festividades e Campanha da Fraternidade.

• Os membros fundadores foram Jair Luiz Pereira, Nestor de Azeredo, Darci Porto, Sérgio Pinheiro da Silva, Maria Susana de Carvalho, Silvania de Carvalho, Mara de Oliveira, Márcia Pereira, os irmãos Sérgio da Rosa e Júlio Cézar da Rosa e Sérgio Luiz da Silva.

O livro e todas fotografias, histórias e documentos devem ficar à disposição da comunidade para estudos. A ideia é ter um espaço na Associação Négo Football Club Acadêmicos do Samba.

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