O advogado e atual presidente da Câmara de Vereadores de Venâncio Aires, Eduardo Kappel (Progressistas), foi denunciado pelo Ministério Público (MP) à Justiça por exploração de prestígio. O próprio Kappel confirmou à reportagem da Folha do Mate, na tarde de ontem, que tem conhecimento de que a denúncia contra ele chegou à 1ª Vara Criminal do Foro da Tristeza, em Porto Alegre.
Embora as investigações tenham sido conduzidas pelo promotor João Afonso da Silva Beltrame, de Venâncio Aires, o processo foi para a Tristeza por conta de os áudios nos quais Kappel insinua que o irmão, desembargador Rinez da Trindade, poderia interferir em sentença do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS), foram gravados na Capital. Nas conversas com um homem condenado a 36 anos de prisão por tráfico de drogas, o advogado cita o nome de Trindade como um possível influenciador.
Ao comentar sobre o caso, Kappel afirmou que não é réu no processo, “pois a Justiça ainda não se manifestou sobre o recebimento ou não da denúncia”. Ele acredita que a movimentação do MP tenha ocorrido por conta de declarações dadas na Câmara. “É lógico que é um contra-ataque. Eu esperava esta denúncia para o ano que vem, mas ela foi acelerada. Eu ataquei o Ministério Público dizendo que eles não enfrentam o cartel de postos de combustíveis e o narcotráfico e agora vem isso”, disparou.
Ele também declarou que está tranquilo, vai aguardar a notificação do Judiciário e crê que será absolvido. “Na OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) de Venâncio e do estado não tenho problemas. Na esfera estadual, aliás, fui absolvido por 8 a 0. Na Câmara, o processo foi suspenso e sei que, ao final de tudo isso, serei absolvido e vou buscar a reparação dos danos a mim e à minha família”, completou.
Artigo 357
O Código Penal, em seu artigo 357, descreve o delito de exploração de prestígio, que se trata de um crime contra a administração da Justiça e consiste no ato de pedir ou receber dinheiro ou qualquer outro tipo de beneficio, sob o argumento de exercer influência sobre servidores e autoridades do Poder Judiciário, Ministério Público, demais funcionários que auxiliam no exercício da Justiça e de testemunhas. A pena prevista, em caso de condenação, é de 1 a 5 anos de reclusão e multa. As penas aumentam-se de um terço, se o agente alega ou insinua que o dinheiro ou utilidade também se destina a qualquer das pessoas referidas no artigo.
Vereadores lamentam pela imagem do Legislativo
Os vereadores Nelsoir Battisti (PSD), Tiago Quintana (PDT) e Sid Ferreira (PDT) se manifestaram, ontem, sobre o oferecimento de denúncia do MP contra Kappel à Justiça. Todos concordaram que a situação gera extremo desgaste para o presidente e tem reflexos diretos na imagem do Legislativo. “É uma vergonha para o nosso município. A notícia vai para o país todo com o nome de Venâncio Aires. Todo mundo sabia que isso ia acontecer. Pior é que a eleição dele foi bancada pelo governo”, disse Battisti.
O parlamentar do PSD, que juntamente com Quintana, Ferreira e outros três vereadores liderou o movimento ‘Legislativo Independente’ – que tinha como finalidade evitar que Kappel fosse eleito presidente da Câmara -, lembrou ainda que colocou seu nome à disposição dos colegas como forma de apresentar uma alternativa, mas que não obteve êxito em razão da “interferência do prefeito e do vice na eleição”.
Os vereadores do PDT recordaram que uma representação contra Kappel – para que a conduta do parlamentar fosse investigada – foi apresentada por eles à presidência da Câmara (na época sob o comando de Gilberto dos Santos, do PTB) e à Comissão de Ética (que tinha Ezequiel Stahl, do PTB, como presidente), porém acabou arquivada, sob alegação de que o Legislativo aguardaria uma manifestação do Ministério Público acerca do caso, para somente depois decidir sobre o pedido dos parlamentares.
Comissão de Ética
O atual presidente da Comissão de Ética da Câmara Municipal de Vereadores de Venâncio Aires, Clécio Espíndola, o Galo (PTB), disse que ouviu comentários sobre a denúncia, mas que precisa ter mais informações a respeito, para somente depois se manifestar. “Estou voltando de Porto Alegre, fiquei sabendo agora desta notícia. Tenho que tomar conhecimento sobre o que está acontecendo para, no momento oportuno, falar alguma coisa”, declarou, ontem à tardinha.
Os áudios
Áudio 1
• Em conversa com a duração de sete minutos e doze segundos (7min12s), que teria sido gravada no estacionamento de um shopping, em Porto Alegre, em data desconhecida, Eduardo Kappel e um suposto filho do interessado em uma sentença do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) falam sobre votação desfavorável que impediu a saída do cliente do sistema prisional.
• O homem diz que o pai tinha esperanças de deixar o cárcere, mas os desembargadores negaram tal solicitação por três votos a zero. Na sequência, Kappel alega que a votação teria sido proposital e que um novo pedido, após a emissão de um laudo médico comprovando problemas de saúde do cliente, prosperaria.
• Ao interlocutor, o advogado afirma que a revisão da decisão estaria assegurada pelo fato de que seu irmão – o desembargador Rinez da Trindade – atuaria nesse sentido. O preço para a soltura foi acertado em R$ 200 mil, com R$ 90 mil sendo pagos no dia em que o médico emitisse o laudo e mais R$ 90 mil repassados quando a Justiça confirmasse a decisão. Outros R$ 20 mil já teriam sido antecipados a Kappel, antes da votação que negou a solicitação.
Áudio 2
• Outra conversa vazada, com a duração de sete minutos e vinte e oito segundos (7min28s), também ocorrida em data desconhecida, traria um recado do cliente, insatisfeito com a negativa do colegiado e a cobrança do dinheiro adiantado de volta.
• O homem reclama que Kappel teria ‘brincado’ com a sua saúde, família e liberdade, além de ter envolvido o irmão desembargador na situação. O cliente pede o dinheiro de volta e alerta que buscaria os seus direitos. Ele também exige a devolução de quatro cheques do filho – sem informar o valor – que teriam sido repassado ao advogado.
• O preso afirma no áudio que havia obtido o valor antecipado ao advogado com um amigo, e que estaria pagando juros. Quando deixasse a prisão – na gravação o cliente fala em ‘indulto’ -, conseguiria levantar a quantia total da negociação. Também diz que tem mais gravações envolvendo Eduardo Kappel e finaliza: ‘Eu errei, tô preso e tô pagando. Tu também pode ser preso, perder teu emprego e fazer o teu irmão perder o emprego dele também’.