Descanso (nada) em paz

-

A imagem da cruz pode ser considerada a mais comum dentro dos cemitérios. Isso acontece por motivos lógicos para qualquer família cristã que enterra nestes locais os seus, ainda mais em uma cidade tradicionalmente religiosa como Venâncio Aires.

Mas enxergar cruzes em cemitérios, o que seria algo tão corriqueiro, tem requerido um pouco mais de atenção em alguns pontos. Literalmente, as imagens de Jesus Cristo crucificado têm sumido e o que restam são marcas nas lápides, sejam elas mais antigas, ou mais recentes.

Marcas que podem, sim, ser da ação do tempo. No entanto, nesses casos, tudo indica que é outro tipo de ação que está relacionada. A ação humana e que acarreta em furtos e a consequente indignação de quem visita um túmulo violado.

Em dois grandes cemitérios da cidade, o Municipal e o Vila Rica, basta percorrer os acessos principais que a vista nem faz força para constatar a falta de crucifixos. São dezenas, muitos ‘vizinhos’, às vezes de família toda, outros sós, mas carentes de uma das imagens mais emblemáticas para os cristãos. Na maioria, resta apenas os buracos onde estavam parafusados ou as marcas da solda arrancada. Não é preciso régua para saber que grande parte era de objetos de até 60 centímetros, talvez pesados, dependendo do material.

Na prática, o tradicional ‘descanse em paz’ não tem se aplicado para os falecidos e no cemitério ninguém está imune a violações. Não escapam nem túmulos de nomes conhecidos do município, como das famílias de Reynaldo Schmaedecke e Emílio Selbach, por exemplo. Além dos crucifixos, há vários sem letras e fotos, também surrupiadas, e que viram apenas lajes vazias, sem identificação nenhuma e à mercê do esquecimento e do anonimato. Em alguns, uma única argola e três pinos indicam que em outro momento já foi mais fácil movimentar a lápide.

MOTIVOS

O titular da Delegacia de Polícia de Pronto Atendimento (DPPA) de Venâncio Aires, Vinícius Lourenço de Assunção, diz que o furto desses objetos geralmente tem uma explicação simples: a venda de materiais feitos de bronze, cobre ou alumínio. “O pessoal furta para vender para ferro velho e conseguir dinheiro para comprar drogas, mesmo que consigam pouco valor.”

Vereadora pede por vigilância

Embora os furtos não sejam novidade, a frequência de outras questões relacionadas ao vandalismo também têm incomodado. Isso passa por ‘movimentos noturnos’ que não teriam nada a ver com pessoas indo rezar por entes queridos.

O assunto foi levantado nessa semana na sessão ordinária do Legislativo de Venâncio Aires. Durante o uso da tribuna, a vereadora Helena da Rosa (MDB) informou que fez um pedido de providências ao Executivo, solicitando vigilância nos cemitérios da cidade. “Recebo reclamações frequentes. Uma pessoa, que não quer se identificar, relatou que várias situações acontecem, como gente usando drogas, tendo encontros amorosos, até orgias, fora as depredações. Como vereadora, é minha sugestão que o Executivo providencie a vigilância”, disse Helena.

O prefeito Giovane Wickert reconheceu que é difícil conseguir implementar a vigilância nos cemitérios públicos, mas indicou uma alternativa que pode contribuir. “ Agora que estamos com financiamentos e recursos para investir em tecnologias, como câmeras de vídeo para patrimônios públicos, é possível incluir essa instalação. Por aí vejo a saída para que possamos ter os mesmos resultados que a vereadora propõe.”

INSEGURANÇA

Uma costureira que mora próximo ao cemitério da Vila Rica há 24 anos, conta que ‘visitas’ ao local ocorrem frequentemente. “Claro que não vou pra rua ver, mas tem muito movimento toda noite. Tem muitos carros que param aí, pessoas que vem fazer de tudo, menos rezar. A gente tem medo dessa insegurança, então nem saio de casa.”

Já o zelador Claudino Wenzel, que há cerca de cinco anos é o responsável pelo lado evangélico do Cemitério Municipal, reconhece que são ‘tempos complicados’ e ninguém está livre de nada. “Há umas duas semanas mais de 10 portas de jazigos foram levadas. É mais fácil contar os que ainda têm, do que os que estão faltando. O pessoal não deixa escapar nada.”

Sobre ter alguém vigiando o cemitério durante as noites, Wenzel entende que a demanda é importante, mas dá um sorriso nervoso da própria opinião. “Não sei se alguém ia querer. Do jeito que a coisa está, nem o segurança estaria seguro”, afirma.

LIMPEZA

1 A reportagem percorreu os cemitérios Municipal e Vila Rica na manhã de quinta-feira, 2. Aparentemente, ambos limpos e organizados. Ou seja, vasos de pé, flores velhas nas lixeiras e trilhos entre os túmulos com fácil acesso.

2 No Municipal, onde uma placa proíbe o depósito de lixo, se veem restos de flores e entulhos (oriundos do próprio cemitério). Mas, já foi depósito de outros, como em matéria da Folha do Mate de abril de 2018. Na época, o local tinha virado ponto de descarte de galhos e embalagens. Em frente ao Vila Rica, a calçada já não tinha mais o grande volume de lixo e entulho, como estava há alguns dias, conforme registro de um leitor.

3 A Secretaria Municipal de Infraestrutura e Serviços Públicos (Sisp) é quem faz o recolhimento. “Sempre que tiver acumulado, é recolhido, no mínimo, duas vezes por mês”, informou o secretário Renato Gollmann.



Débora Kist

Débora Kist

Formada em Comunicação Social - Jornalismo pela Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc) em 2013. Trabalhou como produtora executiva e jornalista na Rádio Terra FM entre 2008 e 2017. Jornalista no jornal Folha do Mate desde 2018 e atualmente também integra a equipe do programa jornalístico Terra em Uma Hora, veiculado de segunda a sexta, das 12h às 13h, na Terra FM.

Clique Aqui para ver o autor

    

Destaques

Últimas

Exclusivo Assinantes

Template being used: /var/www/html/wp-content/plugins/td-cloud-library/wp_templates/tdb_view_single.php
error: Conteúdo protegido