No século XVIII, quando parte dos processos fabris passou das mãos para as máquinas, foi considerada uma mudança radical. A transformação foi tamanha que o momento entrou para a história como a primeira ‘revolução industrial’. Mais de 200 anos depois, com todos os avanços tecnológicos desde então, as empresas têm trabalhado com outro conceito: a indústria 4.0 ou, na ordem da evolução, o que chamam de quarta revolução industrial.
A diferença em relação às mudanças anteriores é que não se trata apenas de uma melhora na mecanização, mas sim, a conexão de tudo isso. “É a inteligência das máquinas, o que chamam de internet das coisas ou a conectividade dos equipamentos”, resume o diretor da Metalúrgica Venâncio, Bernardo Campos.
Segundo ele, se trata de um caminho sem volta. “Esse tipo de tecnologia garante confiabilidade nos equipamentos, o que nos dá um aproveitamento melhor do tempo e qualidade no produto final. Sem falar na redução de custos e na competitividade”, destacou Campos.
No caso da Venâncio, a empresa vem investindo em tecnologia 4.0 desde 2017. Em quatro anos, foram cerca de R$ 200 milhões aplicados em equipamentos considerados de ponta, buscados na Europa e Ásia, principalmente.
Conforme o coordenador de Engenharia de Processos da empresa, Fernando Remedi, 70% do parque industrial em termos de fabricação é considerado 4.0 e a ideia, para 2022, é chegar a 95%. “Tudo que se controla nos computadores dentro da fábrica, o departamento comercial consegue acessar também. Está tudo interligado. Se controla o tempo de início, parada, término. Quanto foi produzido, a eficiência, enfim, informações completas sobre o processo de fabricação”, explicou.
Produtividade
À indústria 4.0 é creditado o aumento da eficiência e da produtividade. Para se ter uma ideia do que isso representa na prática, a Metalúrgica Venâncio quase dobrou a produção mensal na estamparia – de 400 toneladas mensais em chapas planas processadas para 750 toneladas.
A mudança começou em 2019 e impactou também na mão de obra. Eram cerca de 200 pessoas no setor e hoje são 85. “As pessoas foram realocadas para as linhas de montagem, já que a produção geral aumentou e precisamos de funcionários. Dos que trabalham diretamente nessa tecnologia, é preciso de uma mão de obra mais qualificada, que vai analisar os dados que as próprias máquinas identificam. Portanto, também são funcionários que têm um salário melhor. Então tudo está relacionado”, destacou Bernardo Campos.
A projeção de crescimento segue e com a aquisição de um novo maquinário já encaminhada, a produção da estamparia vai dobrar novamente, chegando a 1,5 mil toneladas por mês. Com o consequente aumento das linhas de produção, a empresa espera concluir a expansão da área construída. Ao longo de 2022, deve passar de 55 mil metros quadrados para 65 mil.
Migração da mão de obra
Dentro da Metalúrgica Venâncio, a implementação de novas tecnologias exigiu dois movimentos: realocar funcionários e qualificar a mão de obra. Nesse sentido, o vice-reitor e professor do departamento de Gestão de Negócios e Comunicação da Universidade de Santa Cruz Sul (Unisc), Rafael Henn, explica que a indústria 4.0 continuará impactando no quadro de funcionários das empresas.
“Já antes já da indústria 4.0, os processos de automação e robótica vinham eliminando a mão de obra na indústria. O que acontece com a chamada internet das coisas, é que toda aquela atividade humana produtiva que é repetitiva e trabalha com carga, vai ser eliminada.”
Por isso, segundo Henn, o relatório ‘Futuro do Trabalho’, emitido anualmente pelo Fórum Econômico Mundial, mostra que existe uma migração da mão de obra produtiva industrial para a área de serviço. “Vai ser necessário ter alguém que entenda de tecnologia e informática para programar e fazer a manutenção. Isso é o serviço. Não tem mais o trabalho braçal, mas tem um trabalho intelectual de programação e desenvolvimento da tecnologia”, explicou.
Demanda
Mas essa migração não se trata de um movimento tão simples, já que há uma dificuldade no meio do caminho. “O grande problema é que essa mão de obra está em falta, as pessoas não estão preparadas porque não tem uma qualificação”, considerou Rafael Henn.
Sobre isso, aliás, Venâncio Aires já tem demandas identificadas que motivaram a criação de um programa. Nos próximos meses, a Prefeitura vai implementar o Qualifica Venâncio, custeando 43 cursos profissionalizantes básicos e de curta duração em diversas áreas. Serão 500 vagas voltadas à capacitação profissional.
Universidade
Segundo o professor Rafael Henn, o tema indústria 4.0 já vem sendo trabalhado dentro das universidades há algum tempo e traz como exemplo o curso de Engenharia de Produção da Unisc. “O assunto é discutido em diversas disciplinas. O currículo foi todo atualizado, com um viés mais tecnológico, para a formação de profissionais aptos para esse novo momento da indústria. Precisamos formar talentos inovadores num ambiente de novas tecnologias.”
Ainda conforme Henn, as pesquisas realizadas na universidade também estão se voltando para as demandas que surgem da indústria 4.0. “Ao nos aproximarmos das empresas, conseguimos ajudá-las com suporte e soluções para problemas nem sempre conhecidos, que essa nova onda provoca. Através das pesquisas, a universidade consegue coletar dados de um cenário real e testar inovações num ambiente simulado, para, após, aplicar as inovações já testadas nos parques industriais.”
Painel
A indústria 4.0 será o tema da terceira edição dos debates Gente & Negócios e ocorre na próxima terça-feira, 28, a partir das 20h. O painel é promovido pela Folha do Mate e rádio Terra FM e poderá ser acompanhado ao vivo pelo 105.1 ou em vídeo pelo Facebook dos dois veículos.