
O deputado estadual Airton Artus (PDT), médico e ex-prefeito de Venâncio Aires, embarca neste sábado, 15, para Genebra, na Suíça, onde acompanhará a 11ª Conferência das Partes (COP 11) da Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco, promovida pela Organização Mundial da Saúde (OMS). O evento ocorre de 17 a 22 de novembro e reunirá representantes de mais de 180 países para debater políticas globais relacionadas ao combate ao tabagismo. Realizada a cada dois anos, a COP é um evento que gera apreensão da cadeia produtiva do tabaco, devido às decisões que podem ser aprovadas e, por sua vez, venham a impactar o setor que é base econômica do Vale do Rio Pardo.
O parlamentar integrará uma comitiva formada por lideranças políticas e representantes de entidades, que estarão no país europeu para defender a relevância econômica e social do setor. Como ex-prefeito de Venâncio e ex-presidente da Câmara Setorial do Tabaco, Artus já participou de quatro das 10 edições anteriores da Conferência das Partes — a COP 4, no Uruguai, COP 5; na Coreia do Sul; COP 6 na Rússia e; a COP 7, na Índia. Na entrevista abaixo, o deputado fala sobre o papel econômico e social do setor, discute as pressões internacionais e defende equilíbrio nas decisões.
“Nós vamos lá defender o setor, especialmente a relevância econômica e social da cadeia produtiva para a nossa região. Já estive em quatro COPs, onde a gente travou lutas fortes para manter a produção e impedir que eles implantassem regras para diminuir o plantio e mostrar para o mundo a importância socioeconômica deste setor.”
AIRTON ARTUS – Deputado estadual
Entrevista
O senhor foi prefeito de Venâncio Aires, município onde a fumicultura tem grande relevância econômica e social. Na sua avaliação, qual é o papel do setor do tabaco no desenvolvimento regional e na geração de renda para as famílias?
Realmente, a cadeia produtiva do tabaco tem uma relevância muito grande para o município, e, como prefeito, eu fui testemunha disso. Nos municípios produtores, além do benefício aos produtores rurais, ao colono, ao fumicultor, há um impacto muito grande na cidade. As pessoas que plantam fumo gastam e consomem no comércio local, o que movimenta bastante a economia. Além disso, há também o retorno do ICMS, que aumenta a arrecadação e os tributos destinados aos cofres municipais. Com isso, as prefeituras passam a ter mais condições de realizar investimentos e aplicar recursos em setores como saúde e educação, por exemplo.
Para mim, que fui prefeito, o tabaco tem uma importância muito grande para os municípios. No caso de Venâncio Aires, assim como em Santa Cruz, há ainda um fator adicional: como temos a indústria fumageira, existem também os empregos gerados por essas empresas. São trabalhadores do setor que fazem com que o impacto seja ainda maior. Assim, no comparativo, são cerca de 300 municípios que têm a vantagem de contar com a fumicultura, mas alguns deles ainda possuem a indústria, o que amplia significativamente seus benefícios econômicos.
Como o senhor acredita que os gestores públicos e os parlamentares podem contribuir para garantir mais segurança e estabilidade aos produtores, especialmente diante das pressões internacionais contra a cultura do tabaco?
Nós, políticos, precisamos fazer a nossa parte, compreendendo a importância da cadeia produtiva, e permanecer atentos não apenas às medidas governamentais relacionadas ao financiamento da produção agrícola e às condições para que a indústria possa processar o fumo e realizar exportações com segurança e garantias, evitando problemas como a recente taxação das exportações para os Estados Unidos, mas também às questões que envolvem medidas que, por vezes, são tomadas por motivos ideológicos contra o setor, como já ocorreu aqui no Brasil.
Além disso, é preciso observar o apoio que o governo, em certas ocasiões, concede às ações da Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco, por exemplo. Portanto, nós, políticos, devemos estar atentos tanto ao comportamento dos governos internamente quanto às suas posições no cenário internacional, especialmente em relação a acordos como essa convenção.
Apesar da importância econômica e social do setor, ainda são poucos os políticos que se manifestam em defesa da cadeia produtiva. A que o senhor atribui esse distanciamento?
Primeiro, porque os políticos muitas vezes não têm coragem de assumir determinadas posições, seja por medo de uma avaliação negativa da sociedade ou do eleitorado, seja por ignorância ou desconhecimento da área. Muitos não têm noção do impacto que isso gera na produção primária, no processo de beneficiamento, na comercialização e, também, como mencionei antes, no comércio e em outras áreas da economia, além do reflexo direto nos municípios.
Percebo também que muitos políticos, quando demonstram preocupação, focam exclusivamente na questão da saúde. No entanto, não fazem uma avaliação relativa e comparativa com outros produtos que também são prejudiciais à saúde, mas que não recebem o mesmo tratamento dado ao tabaco e que, muitas vezes, empregam muito menos pessoas e geram bem menos receita para o estado, os municípios e o país.
Em discursos recentes, o senhor destacou que o debate em torno do tabaco muitas vezes é contaminado pela polarização política. Essa divisão pode dificultar o diálogo e as políticas públicas voltadas ao setor no Brasil?
A questão não é propriamente de polarização, e sim de um ranço ideológico contra o setor do tabaco que existe já há muitos anos, desde 1995. Não tenho nenhuma dúvida de que isso pode ter um impacto negativo. No entanto, mais do que nunca, o papel dos políticos deve ser o de proteger o setor desse tipo de postura política, e é isso que temos procurado fazer ao longo do tempo.
No meu discurso, que foi bastante incisivo, mencionei novamente produtos como alimentos ultraprocessados, produtos falsificados e até medicamentos. Trata-se de uma série de itens que também fazem mal à saúde, mas que não recebem o mesmo tratamento dado ao tabaco e que, muitas vezes, geram muito menos empregos. Quando a preocupação é a saúde, deveríamos priorizar o combate ao contrabando, que chega a 40% do consumo brasileiro. Produtos de baixa qualidade sem fiscalização. Isso, sim, faz mal.
O senhor já participou de edições anteriores da Conferência das Partes (COP) da Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco, em países como Coreia do Sul, Rússia e Índia. Como o tema da produção é tratado nesses encontros internacionais? Que aprendizados essas experiências trouxeram?
Eu participei da COP em 2010, no Uruguai, em Punta del Este; em 2012, em Seul, na Coreia do Sul; em 2014, em Moscou, na Rússia; e em 2016 em Nova Déli, na Índia, todas elas enquanto prefeito e, na última, também como presidente da Câmara Setorial do Tabaco.
Em todas essas conferências, a pauta principal sempre foi a produção. Em muitas delas, houve tentativas de reduzir ou limitar a área de plantio, o que seria extremamente prejudicial para o Brasil. Nesses momentos, atuamos em conjunto com a diplomacia e com o Ministério das Relações Exteriores, conseguindo evitar que fossem tomadas medidas que pudessem afetar negativamente a produção nacional.
Acredito que, mais uma vez, esse será o tom: estaremos lá para evitar que qualquer medida extraordinária prejudique o setor e cause um impacto abrupto na nossa economia ao longo dos anos. É claro que podem ocorrer modificações, inclusive na matriz produtiva, e é visível que, em muitos lugares, o número de fumantes vem diminuindo. Precisamos estar preparados para isso, mas de forma gradual e planejada, para que a economia não sofra impactos bruscos.
Na sua percepção, qual deve ser o posicionamento do Brasil na COP 11 em relação à cadeia produtiva do tabaco e aos milhões de brasileiros que dependem dela?
É preciso convencer os participantes sobre a importância que essa cadeia produtiva tem para o Brasil. Uma importância social, econômica e também para a população e o setor público.
Precisamos entender, de uma vez por todas, que não há uma relação direta entre produção e consumo: se o Brasil deixar de produzir, outros países produzirão e venderão para o mundo. Portanto, não é a nossa produção que prejudica a saúde global. O que existe, de fato, é um consumo mundial, e o Brasil, sendo um dos maiores produtores e o principal exportador, não pode simplesmente abrir mão dessa riqueza de uma hora para outra.
Se parar de produzir resolvesse o problema, a abordagem seria diferente, mas não é o caso. A nossa produção precisa ser protegida, e a cadeia produtiva do tabaco deve ser valorizada. É exatamente esse o propósito da nossa atuação em Genebra, na Suíça.
Há uma expectativa de que temas sensíveis, como a redução gradual do cultivo e o controle da nicotina, voltem à pauta da COP 11. Como o senhor avalia esses possíveis encaminhamentos?
Essa questão da redução gradual do cultivo não está sendo pautada pela primeira vez. Foi uma discussão muito intensa em Seul e também em Moscou. Naquelas ocasiões, o texto final chegou a mencionar a redução do cultivo, e eu repito: isso não é o que vai resolver o problema. A questão central é o consumo, que não tem relação direta com a nossa produção.
Se fosse assim, também teríamos problema com outros tipos de drogas, com outros componentes e produtos que são consumidos em todo o mundo. Por isso, precisamos ter cuidado, porque essa proposta é, de certa forma, uma armadilha, um verdadeiro ‘pega-ratão’. Temos que estar muito atentos a isso durante a COP 11.
O senhor acredita que o Brasil tem conseguido equilibrar os compromissos assumidos junto à Organização Mundial da Saúde e a defesa dos interesses dos produtores e trabalhadores do tabaco?
A gente tem conseguido, sim, conciliar os interesses dos produtores e trabalhadores no Brasil, tanto os produtores rurais quanto os trabalhadores do campo e da cidade. O que não podemos é, e quando digo ‘nós’ me refiro ao nosso Governo Federal, prejudicar um setor tão importante para o Brasil.
Veja os Estados Unidos: historicamente, eles protegem o tabaco, assim como outros produtos, para preservar sua produção em diversas áreas. No Brasil, precisamos adotar o mesmo raciocínio: proteger a nossa produção enquanto há consumo. Depois, quando houver mudanças e surgirem novas tendências, aí sim podemos revisar essa questão.
De que forma a tecnologia e a diversificação produtiva podem fortalecer o setor, sem comprometer a principal fonte de sustento das famílias que vivem da fumicultura?
Bom, nós já observamos uma grande mudança na diversificação produtiva das propriedades há bastante tempo. O fumicultor, por exemplo, trabalha com hortaliças, com milho, e alguns também com soja, além da criação de gado, tanto leiteiro quanto de corte, ovos e aves.
Essa transformação mostra que já existe uma mudança no perfil do produtor rural, evitando a monocultura e tornando a propriedade mais produtiva, mesmo em pequenas áreas.
O que o senhor espera concretamente da participação brasileira na COP 11? Há algum ponto que o senhor considera inegociável na defesa dos produtores?
Na verdade, nós queremos manter o ‘status quo’, ou seja, permitir que o setor continue funcionando sem nenhuma medida artificial, deixando que as mudanças ocorram de forma gradual e orgânica. Se houver uma redução no consumo, se as pessoas adotarem um pensamento diferente e se conscientizarem sobre o uso do tabaco, então as transformações virão naturalmente. Não há necessidade de atropelar esse processo, pois se trata de uma evolução natural. Eu espero que o governo não se precipite nesse sentido.
Comparando essas edições anteriores com o cenário atual, o senhor percebe alguma mudança na postura dos países desenvolvidos em relação aos produtores de tabaco dos países em desenvolvimento, como o Brasil?
Não acredito que, em relação às COPs anteriores, haja uma mudança de postura por parte dos países desenvolvidos. Em muitos deles, o consumo de tabaco ainda é encarado normalmente. Lembro-me, por exemplo, de que na Europa os cigarros feitos com fumo Virgínia puro eram muito caros, justamente por exigirem um fumo de alta qualidade.
Mesmo assim, países como Itália, Espanha, Portugal, Bélgica e até regiões do mundo árabe continuam consumindo muito tabaco. Enquanto houver consumo, alguém continuará produzindo, e não há razão para abandonarmos essa cadeia produtiva e essa riqueza que é nossa.
O Brasil produz um fumo de altíssima qualidade, especialmente na nossa região, em Vila Arlindo, no interior de Venâncio Aires, em direção a Santa Cruz, no Vale do Sol, considerada o epicentro do melhor fumo do mundo. Enquanto os países desenvolvidos continuarem consumindo, nós vamos plantar e continuar exportando.