Antônio Brandão e Rose Pereira estão no aluguel social, mas seguem na expectativa de serem convocados para o Compra Assistida (Foto: Débora Kist/Folha do Mate)
Antônio Brandão e Rose Pereira estão no aluguel social, mas seguem na expectativa de serem convocados para o Compra Assistida (Foto: Débora Kist/Folha do Mate)

Moradores atingidos pela enchente de 2024 seguem na expectativa pelo Compra Assistida. Prefeitura diz que critérios cabem ao Governo Federal.

Foi em dezembro de 2024 que saiu a relação dos primeiros possíveis beneficiários em Venâncio Aires do Minha Casa, Minha Vida – Reconstrução, na modalidade Compra Assistida, da Caixa Econômica Federal. O programa é voltado a moradores em áreas de risco que tiveram as casas destruídas ou interditadas permanentemente após a enchente de maio do ano passado.

Naquela primeira lista, eram 21 nomes elegíveis, sendo que, ao todo, o município teve aprovadas 341 unidades habitacionais. Sete meses depois, Venâncio teve 111 convocados para o programa e, para aqueles que ainda esperam aparecer nas listas da Caixa Federal, há dúvidas e sentimento de insegurança.

Nos últimos dias, a Folha do Mate e a Terra FM receberam contatos de moradores preocupados com a situação. Entre eles, o casal Antônio Carlos Cassemiro Brandão, 65 anos, e Rose Mari Pereira, 58. Frustrados com a demora das definições e sem certeza se serão beneficiados, eles questionam, na fala deles, a falta de critério para a lista. “Tem gente com muita posse, com terra em Vila Mariante e imóvel na cidade, que está na lista. Assim como pessoas que não trabalhavam, que não tinham casa, e estão na lista. Tem gente que está na lista para a área rural e na lista da área urbana. Minha casa está lá, condenada por um laudo, paguei sempre IPTU, trabalhei 36 anos e não aparece nosso nome”, desabafa Brandão.

O marinheiro aposentado diz que está preocupado porque não sabe se vai se enquadrar em algum dos programas ou projetos habitacionais previstos em Venâncio. “Será que vamos ganhar alguma coisa ou vamos ter que pagar aluguel depois? É um sentimento de insegurança pro futuro. O que vai ser do povo que está esperando? Porque não é só a gente que está nessa situação.”

Casa condenada já foi alvo de furto

“O prefeito sempre nos disse que ninguém vai ficar na rua. Mas até quando a Prefeitura vai ter dinheiro pra manter os aluguéis sociais? Nós estamos no aluguel social e agradecemos a Prefeitura por isso. Mas uma hora isso vai terminar e a gente se preocupa”, destacou Antônio Brandão.

Ele e a esposa residem num prédio da área central há mais de um ano, depois que a enchente do rio Taquari passou por cima do telhado da casa, a número 50 da rua Augusto Fernando Schneider, em Vila Mariante. Um laudo técnico de vistoria apontou ‘dano estrutural’ e a residência acabou condenada. Dos móveis que a enchente destruiu ou levou embora, eles tinham sido comprados em setembro de 2023 (após outra cheia). “Na nossa casa, no Mariante, a gente não pode mexer, não pode colocar um prego lá. Mas enquanto isso já roubaram portas, janelas e até o box do banheiro”, lamentou Rose.

Camilla Capelão sobre o Compra Assistida: “Estamos em contato direto com o Ministério das Cidades”

Dos 111 nomes convocados em Venâncio pela Caixa Federal, até a quinta-feira, 24, a Secretaria de Habitação e Desenvolvimento Social informa que 80 foram para a zona urbana (imóvel de R$ 200 mil), oito para a zona urbana faixa 3 (R$ 40 mil) e 23 para a zona rural (R$ 86 mil). “O Governo Federal diz que zona rural pode migrar para zona urbana e vice-versa. Mas toda vez que sai uma nova lista, nós chamamos para conversar e explicar”, destacou o assistente social Maicon Santos, técnico responsável dos projetos habitacionais da calamidade.

Questionada sobre as dúvidas de moradores em relação aos critérios da União, a secretária de Habitação e Desenvolvimento Social, Camilla Capelão, esclarece que, à Prefeitura, coube o papel de identificar as 341 unidades habitacionais destruídas. “Informações cadastrais e de renda, isso é uma busca que o Governo Federal faz. Mas um dos pontos é que, para a renda, a União usa como base o período de maio de 2023 a abril de 2024. Só que um ano depois da enchente, a realidade das famílias já é outra. Tem gente que tem mais renda ou menos renda do que tinha um ano atrás.”

Acompanhamento das listas do Compra Assistida

Nesse sentido, Camilla garante que, a partir de cada nova lista de convocados divulgada, a Prefeitura faz uma análise dos nomes para confirmar as informações. “As pessoas podem ficar muito à vontade para vir aqui ou mesmo fazer denúncias, caso suspeitem de irregularidades. Tem informações divergentes em dados cadastrais ou contratos de gaveta dos imóveis, por exemplo. Quando nós conseguimos identificar algum nome que na verdade não se encaixaria, como por exemplo ter renda superior a R$ 4,7 mil, fizemos um ofício e mandamos para o Ministério das Cidades e para a Caixa Federal. Estamos em contato direto com o Ministério das Cidades.”

Ainda conforme a secretária, dos oito convocados para auxílio de R$ 40 mil, já houve desistências. “Alguns desistiram porque não têm condições de financiar o restante do valor para comprar um imóvel. Nesse caso vamos tentar encaixar em outro programa habitacional, mas a pessoa acaba indo para o fim da fila.”

Secretária de Habitação e Desenvolvimento Social, Camilla Capelão, e assistente social Maicon Santos, acompanham as listas de convocações (Foto: Débora Kist/Folha do Mate)

Critérios

O Governo Federal definiu alguns critérios para o Compra Assistida. As unidades são destinadas às faixas 1 e 2 do Minha Casa, Minha Vida, de famílias com renda total de até R$ 4,7 mil. Além disso, o imóvel, novo ou usado, também pode ser adquirido em qualquer cidade do estado. Mas essa unidade habitacional precisar estar em áreas que não foram impactadas pela enchente e também devem custar até R$ 200 mil.

Prorrogação do aluguel social

Venâncio Aires chegou a ter 306 famílias em aluguel social. Na quinta, 24, eram 185. Antes da enchente, o Município já tinha, regulamentado por lei e decreto, o benefício eventual do aluguel social para pessoas em situação de vulnerabilidade social e econômica. Com as enchentes, foi regulamentado por decreto o benefício eventual por calamidade, então não foi necessária avaliação por critério de renda, apenas o fato de ter a casa destruída ou inabitável. O contrato era de seis meses, podendo chegar, no máximo, a 18 meses – novembro de 2025.

“Ninguém ficará desassistido e o Município já trabalha na prorrogação dos prazos do aluguel social”, garantiu a secretária de Habitação e Desenvolvimento Social, Camilla Capelão. Ainda conforme ela, a Prefeitura tinha previsto, até o fim de 2025, R$ 1,6 milhão do orçamento para o aluguel social. “Então recurso tem e essa lista tem diminuído.”

Das 185 famílias em aluguel social, Camilla diz que há 108 elegíveis para o Compra Assistida, mas ainda não se sabe em qual modalidade o Governo Federal vai encaixar cada uma. Dos 108 elegíveis, 42 estão em processo de pós-convocação: encaminhando documentos ou já com contrato assinado. Das 77 restantes, a secretária diz que a Prefeitura trabalha para colocá-las em outros programas habitacionais. Nesse caso, seriam para as 102 casas que serão construídas em Vila Estância Nova (área do antigo IPM) e no bairro Brands.

125 – é o número de famílias de outros municípios, contempladas no Compra Assistida, e que compraram imóveis em Venâncio Aires. A informação é da Secretaria de Habitação e Desenvolvimento Social.

Compra Assistida deve pautar audiência pública na Câmara de Vereadores

Na segunda, 21, o casal Antônio Brandão e Rose Pereira foi até a Câmara de Vereadores e conversou diretamente com os parlamentares Claidir Kerkhoff Trindade (Republicanos), Nelsoir Batttisti (PSD) e Ezequiel Stahl (PL). Segundo Claidir, que propôs a criação da Frente Parlamentar de Acompanhamento do Programa Compra Assistida no Legislativo, existe a possibilidade de realizar uma audiência pública. “Eldorado do Sul, que tem quase 2 mil famílias esperando, fez audiência, convocou os órgãos envolvidos e a partir disso começou a se fazer uma pressão.”

Ainda conforme a vereadora, há questionamentos sobre o programa. “Tem muita dúvida, é um programa bem complexo. A pessoa se inscreve, vai tudo para Brasília e lá fazem o cruzamento de dados. Vamos chamar Caixa Federal, Ministério Público, secretarias de Habitação e Planejamento. Estamos pensando para o dia 13 de agosto a audiência. Será a oportunidade de escutar os técnicos sobre o porquê da demora e a duplicidade de cadastros. Tudo isso tem que ser avaliado.”

Brasília

No dia 9 de julho, em Brasília, uma comitiva de Venâncio Aires esteve na Secretaria Nacional de Habitação e conseguiu destravar 60 convocações. Um dos entraves apontados estava na divergência de informações na base de dados do Governo Federal, o Dataprev, que também foi utilizado para o Auxílio Reconstrução. Conforme a Prefeitura, havia casos em que o endereço da família aparecia com nomes diferentes ou mais de uma designação para o mesmo local, o que impedia a validação das informações pelo sistema.