Cerca de 70% dos casos atendidos pelo Conselho Tutelar em Venâncio Aires foram relacionados a conflitos familiares.
Infrequência escolar, abuso, violência doméstica, alcoolismo, drogas e até vacinas atrasadas. São diversas as denúncias que chegam ao Conselho Tutelar de Venâncio Aires toda semana. Trata-se de uma demanda crescente e que alcançou, em 2024, 2.572 atendimentos – média de sete por dia. Por resolução federal, é preciso um conselho para cada 100 mil habitantes – caso de Venâncio Aires. O conselho local conta com cinco conselheiros titulares e cinco suplentes, eleitos de forma popular nos mesmos moldes de um processo eleitoral político, ou seja, a cada quatro anos.
Maria Roseli Henz é a mais experiente do atual grupo e trabalha como conselheira desde 2011. Ela observa que, do total de atendimentos no ano passado, cerca de 70% são relacionados a conflitos familiares, aqueles que acontecem dentro de casa, como violência doméstica, abuso sexual, alcoolismo, uso de drogas e separação de casais. “São situações que se repetem nas gerações seguintes da mesma família, porque mesmo com toda assistência, é muito difícil cortar esse ciclo.”
Responsabilidade dos pais
Depois dos conflitos familiares, os problemas com estudantes faltosos em sala de aula também costumam demandar muito. “Tem pais que nem buscam os boletins dos filhos e eles precisam participar da vida escolar, serem presentes na vida dos filhos. É responsabilidade do pai e da mãe, mas na maioria dos casos isso não acontece. Então temos uma parceria muito grande com as escolas, que comunicam esses casos de infrequência”, destaca Aline Machado da Silva, conselheira há 9 anos.
Por mudanças no sistema on-line utilizado, não há dados específicos sobre os atendimentos de anos anteriores, mas, conforme Aline, a demanda tem aumentado a cada ano. Ao comparar os dois últimos meses de janeiro, por exemplo, já houve crescimento: foram 131 atendimentos em 2024 e 198 em 2025 – aumento de 51% no período.
Encaminhamentos do Conselho Tutelar
O Conselho Tutelar é o órgão colegiado encarregado pela sociedade de zelar pelos direitos das crianças e adolescentes. Na prática, embora as demandas cheguem diretamente a ele, o conselho encaminha para a rede de atendimento, como Centro de Referência de Assistência Social (Cras), Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas), Centros de Atenção Psicossocial (Caps Adulto e Caps Infantil) e Ministério Público. “O conselho acompanha administrativamente se a família está indo ao atendimento e se o serviço está sendo oferecido”, explica Aline. O Conselho Tutelar também conta com a parceria da Brigada Militar. “Qualquer crime contra criança, primeiro se aciona a Brigada Militar e depois ela aciona o conselho.”
Infrequência escolar
A Ficha de Comunicação de Aluno Infrequente (Ficai) é um formulário preenchido no site do Ministério Público. A situação de um aluno é assim registrada quando ele tem cinco faltas injustificadas ou 20% de ausência no mês. Outros casos são de famílias que mudam de endereço e telefone com frequência, o que torna difícil a localização.
Uma criança ou adolescente estar no Ficai não significa uma situação clara de abandono escolar. Porque esse estudante pode decidir voltar, seja a partir de conversas com o Conselho Tutelar ou a própria escola. O educandário, aliás, faz todas as tentativas, antes de enviar o caso ao conselho.
Quando o próprio conselho não consegue resolver ou é uma situação extrema (que acontece há meses), o caso vai para o Ministério Público. Alguns registros não tratam apenas de jovens que querem parar de estudar. Envolve crianças de quatro anos, por exemplo, moradoras do interior, que ainda não frequentam a escola como prevê a legislação.
Antes de completar 18 anos, todo jovem tem direito a estar na escola e é dever da família matriculá-lo. Mas muitos adolescentes entre 14 e 16 preferem o trabalho ao estudo ou abandonam por imposição dos pais, para ajudar no orçamento da casa. Independente da decisão, a responsabilidade de mantê-lo na escola é sempre da família.
Assim, qualquer cobrança cairá no colo dos pais, que podem ser responsabilizados pelas faltas. As medidas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) vão desde encaminhamento a cursos ou programas de orientação até advertência e perda de guarda. Também conforme previsto no ECA, a escola tem a obrigatoriedade de notificar o conselho diante dos casos de evasão escolar, para que haja a devida investigação.
Contato do Conselho Tutelar
- O Conselho Tutelar de Venâncio atende na rua General Osório, 910, na quadra entre a avenida Ruperti Filho e a rua Coronel Agra. Está neste endereço desde maio de 2022. Trata-se de uma casa alugada pela Prefeitura. “O espaço melhorou em relação ao anterior, é maior, com mais salas, tem sala para as crianças”, comenta Aline. O único apontamento é que o local precisa de uma adequação na entrada: uma rampa para acessibilidade.
- O atendimento presencial ocorre de segunda a sexta das 8h às 17h, sem fechar ao meio-dia. As denúncias, que são mantidas em sigilo, também podem ser feitas através do telefone 2183-0741. Fora desse período, no sobreaviso noturno, de fim de semana e feriados, o contato deve ser feito pelo telefone 997735097, que também é WhatsApp.
Os cinco conselheiros titulares de Venâncio, eleitos em outubro de 2023, são Jeferson Schultz, Luciane Wagner, Aline Machado da Silva, Fernando Marcelo da Silva Trindade e Maria Roseli Henz.