Município destina cerca de R$ 200 mil mensais para manter contratos do aluguel social, para pessoas atingidas pelas cheias de 2024.
Quase meio ano após a maior enchente da história no Rio Grande do Sul, milhares de famílias gaúchas precisaram trocar de endereço. Algumas de forma provisória, porque conseguiram voltar para casa posteriormente. Mas tantas outras de forma definitiva, porque tiveram as residências completamente destruídas ou condenadas, em áreas agora consideradas inabitáveis.
Em Venâncio Aires, as cheias do rio Taquari e arroio Castelhano impactaram, de alguma forma, 23 mil pessoas, sendo que quase 460 ficaram provisoriamente em três abrigos. Mais de cinco meses depois, muitas conseguiram retornar para casa, reconstruíram, alugaram ou seguem com familiares. No entanto, duas centenas de famílias ainda esperam por um lar novo e, enquanto isso, moram em imóveis mantidos pelo aluguel social.
Conforme a Secretaria de Habitação e Desenvolvimento Social, são 258 famílias (cerca de 700 pessoas) morando em casas ou apartamentos custeados pela Prefeitura de Venâncio Aires, por meio do aluguel social. Entre elas, Rose Mari Pereira, 57 anos, e o marido, Antônio Brandão, 65. O casal está desde maio residindo num prédio da área central da cidade, depois que a enchente do rio Taquari passou por cima do telhado da casa, a número 50 da rua Augusto Fernando Schneider, em Vila Mariante.
Um laudo técnico de vistoria apontou ‘dano estrutural’ e a residência acabou condenada. Do que havia dentro, apenas a TV resistiu, isso porque tinha sido levada para a casa do vizinho, o vereador Clécio Espíndola, o Galo, a quem ela faz questão de agradecer. “O Galo ajudou muitas pessoas, sou muito agradecida a ele.” Os móveis que a enchente de 2024 destruiu ou levou embora tinham sido comprados em setembro de 2023 (após outra cheia) e o casal ainda tem prestações deles a pagar. Isso inclui geladeira, mesa, cadeiras, cama, roupeiro, armário e sofá.
Em Vila Mariante, Rose já trabalhava como faxineira e, desde que está na cidade, conseguiu alguns locais para seguir com as faxinas e ajudar no orçamento doméstico. O marido dela é marinheiro em Porto Alegre e só retorna aos fins de semana. “Ele é aposentado, mas continua trabalhando por causa das dívidas. O que tem dentro do apartamento também compramos e ainda estamos pagando. Roupas ganhei muita coisa de amigas e peguei doações nos pavilhões [São Sebastião Mártir].”
Sem volta
Ao rever as fotos no celular, de como era a casa em Mariante e como ela ficou, Rose lamenta o cenário que encontrou logo depois que a água do Taquari retrocedeu. “Sempre gostei de tudo limpinho e arrumado, dentro de casa e no jardim. Quando chegamos lá, a lama pegava quase no joelho. É muito triste ver todas as tuas conquistas se perderem assim.”
Ela também afirma que o objetivo é ficar na área urbana de Venâncio. “Eu nascei e me criei no Mariante. Quando era criança, enchente era motivo de brincadeira. Mas o que aconteceu esse ano foi triste demais. Para lá não voltamos mais. A casa está condenada e não dá para ficar arriscando a vida. Infelizmente virou área de risco.”
A faxineira diz ainda que a ideia é tentar se enquadrar no programa Minha Casa, Minha Vida – Reconstrução, por meio do Compra Casa Assistida, da Caixa Econômica Federal. Até lá, Rose e Antônio devem seguir com o benefício do aluguel social. “Graças a Deus a Prefeitura está nos ajudando e as outras famílias. E faço questão de agradecer também ao prefeito Jarbas da Rosa, que na enchente estava no Mariante, ajudando as pessoas. Ele foi muito humano e generoso.”
Abrigos
Nas primeiras semanas após a enchente, a Prefeitura de Venâncio Aires manteve ativos três abrigos. O ginásio da Sercsate, no bairro Santa Tecla, funcionou até 24 de maio; a Comunidade Nossa Senhora de Lourdes, em Vila Estância Nova, atendeu até 7 de junho; e o ginásio de Linha Mangueirão ficou ativo por quase dois meses, fechado em 28 de junho.
Considerando também aqueles que apenas passaram pelos abrigos em algum momento, seja para tomar um banho, se alimentar e depois sair para casas de parentes ou amigos, os três pontos receberam 600 pessoas.
R$ 200 mil – é o valor médio mensal que a Prefeitura de Venâncio gasta com aluguel social das famílias. Os contratos variam entre R$ 650 e R$ 1 mil.
Como são os contratos do aluguel social
A secretária de Habitação e Desenvolvimento Social, Camilla Capelão, explica que Venâncio Aires tem, regulamentado por lei e decreto, o benefício eventual do aluguel social para pessoas em situação de vulnerabilidade social e econômica.
Com as enchentes, foi regulamentado por decreto o benefício eventual por calamidade, então nesse caso não foi necessária avaliação por critério de renda, apenas o fato de ter a casa destruída ou inabitável. O contrato é de seis meses e, quando próximo do vencimento, os beneficiários são chamados para reavaliação/renovação por mais seis meses, podendo chegar, no máximo, a 18 meses.
Das atuais 258 famílias em aluguel social, Camilla diz que 62 estavam em abrigos. “O restante foi de requerimentos das pessoas que procuraram a secretaria, que estavam desalojadas em alguma casa de parentes ou amigos.” No caso de Rose Mari, por exemplo, ela ficou 15 dias abrigada na residência de uma sobrinha, em Lajeado.
Os aluguéis estão espalhados por diversos bairros de Venâncio, como Bela Vista, Centro, Cruzeiro, São Francisco Xavier, Coronel Brito, Xangrilá, Brígida, Aviação, Leopoldina, Cidade Alta, Santa Tecla, Morsch, União e Gressler, além das localidades de Rincão de Souza e Linha Mangueirão.
Também há pessoas de Venâncio morando em Tabaí, General Câmara, Bom Retiro do Sul, Taquari, Lajeado, Teutônia e Mato Leitão. “São moradores de Venâncio atingidos e onde eles escolheram as casas, nós liberamos. Muitos por ter familiares nesses municípios, mas essas famílias estão em acompanhamento pela nossa equipe”, observa a secretária Camilla Capelão.
Expectativa com os projetos habitacionais
Para encaminhar as famílias a lares definitivos, a Prefeitura de Venâncio Aires conta com projetos habitacionais. Caso das 72 casas previstas na área do antigo Instituto Penal de Mariante (IPM), em Vila Estância Nova, e as 30 casas no bairro Brands, ambas com recursos estaduais do programa A Casa é Sua – Calamidade.
Segundo a secretária de Planejamento e Urbanismo, Deizimara Souza, da área do IPM, o projeto urbanístico foi aprovado na última semana e a empresa está reunindo os documentos para entrega final. “Assim podermos licitar a execução da infraestrutura para a construção das unidades.” Já no Brands, a secretária explica que a empresa ALM Engenharia está apta a apresentar projeto na Caixa Federal e se aguarda a análise do projeto junto ao concedente do recurso, que é a Caixa.
Também estão previstas 52 casas no bairro Battisti, que não são oriundas de situação de calamidade, mas famílias em aluguel social poderão participar do programa. Nesse caso, Deizimara diz que a empresa MTX Construtora está em fase de apresentação de documentos da fiscalização do trabalho. “Acreditamos que ainda no mês de outubro conseguimos dar ordem de início.”
Quanto ao residencial Morada das Lavandas, no bairro Aviação, para 112 apartamentos, a obra da ALM começou em julho e o prazo é de 18 meses para conclusão. Segundo a secretária de Habitação e Desenvolvimento Social, Camilla Capelão, embora não seja um projeto de origem de situação de calamidade, vai atender a demanda de famílias vítimas das enchentes que ainda não tenham sido contempladas. “Em um ano, acredito que muitas famílias já estarão encaminhadas”, projeta.