Os ‘espelhos reais’ da autoaceitação

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Seria exagero dizer que a rede social, quando bem usada, é uma espécie de Oráculo de Delfos, aquele, citado no capítulo sobre a Grécia Antiga, nos livros de História. Mas talvez a comparação não pareça tão estranha se pensarmos que, na prática, os espaços têm lá suas semelhanças.

Em Delfos, há mais de 2 mil anos, o local funcionava como um ponto de encontro para troca de ideias e conselhos, tanto para problemas pessoais e até políticos. E, pegando alguns bons exemplos da internet, também há quem exerça uma influência mais do que positiva sobre seus seguidores.

Mas o interessante é que parte dos influenciadores modernos, mesmo que não tenha pretensão de influenciar, considera fundamental algo que já era defendido pelos gregos e estava à porta do oráculo: a máxima que diz ‘conhece a ti mesmo’. É sobre esse conceito, considerado um ponto de partida para uma vida equilibrada, que a Folha traz as opiniões e as histórias de Bárbara Teixeira e Amanda Machry. Duas mulheres que entenderam e aceitam o verdadeiro reflexo dos espelhos.

Sobre guerras e vitórias

Bárbara Teixeira diz que nunca foi magrinha, mas, mesmo quando o peso estava só nas bochechas e não no resto do corpo, os comentários vinham. E foram acumulando, ano após ano. Na infância, na adolescência, na faculdade em Porto Alegre e no retorno para o próprio negócio em Venâncio Aires.

“As pessoas cobram isso. Cobram de ti um corpo magro e bonito. Tu achas que é clichê, mas se reconhece em todo comentário e isso vai acumulando dentro de ti”, define a publicitária e empresária, que está com 30 anos.

Nos últimos dias, uma publicação dela repercutiu no Instagram (veja publicação original abaixo) e falava, entre outros conceitos, sobre guerra e vitória. Bárbara falava da vitória que foi ver um pedacinho da barriga, uma ‘nesga’ como ela definiu, de fora. “É sobre se olhar, levantar bandeiras nossas e que façam sentido. Isso é se autoconhecer para então se autoaceitar.”

Esse processo de se reconhecer sem se preocupar com o que os outros irão achar não foi rápido e talvez ainda não acabou. Da tentativa frustrada de tomar medicação e que rendeu uma depressão química, até a busca de uma psicóloga, foram anos de negociações consigo mesma, de lutas, de ataques, de baixar a guarda e de conquistas. Assim como numa guerra.

“As pessoas apontam o dedo e isso vira uma culpa daquele que é apontado. Carregamos essa culpa como se ser assim fosse algo ruim. Falta empatia, falta acolhimento para entender e ajudar.”

Para Bárbara, que na academia comemora a diminuição das dores nas costas e não dos números na balança, o assunto ‘corpo’ importa sim, mas não pela estética. “Os corpos importam pela acessibilidade, por exemplo. Tem gente que não passa numa catraca ou não pode usar banheiro em estabelecimento comercial. Então como fazer média, se sempre tem alguém que não se encaixa?”

Como se livrar desse ‘peso’

A vendedora Amanda Machry, 24 anos, sempre deu muita atenção à moda e ao estilo, se a roupa fica bem ou não no corpo, algo comum para muitas mulheres. Mas a Amanda, que em algum momento já teve menos ‘dobrinhas’ do que hoje, entendeu que precisava se adaptar, com roupas e cortes diferentes. “Porque a roupa precisa caber em mim, não eu na roupa”, definiu, justificando uma recente publicação nas suas redes sociais (veja abaixo).

Para ela, o tamanho do corpo ainda é algo que importa na sociedade, mas que as pessoas precisam entender que não é preciso seguir um padrão. “Cada um tem seu corpo, sua luz, sua personalidade e não serão uns quilinhos a mais ou a menos que vão apagar isso. Precisamos ir em busca do que nos faz bem. Se é emagrecer, beleza, o importante é estar feliz nesse processo.”

Amanda, sobre a oscilação normal da confiança diante do espelho. “Às vezes, precisamos pensar em outras qualidades que temos, não apenas frisar aquilo que não gostamos.” (Foto: Arquivo pessoal)

O processo que ela se refere é o do autoconhecimento, essencial na busca do bem-estar. “Aos poucos vamos nos desencanando das opiniões, dos olhares e dos julgamentos, nos livrando desse peso diário. Tenho certeza que muitas meninas se sentem assim e, ao mesmo tempo, muitos não acreditam ou pensam que é besteira.”

“Acho que a autoaceitação é um processo longo, não é de um dia para o outro, mas um passo de cada vez. Nos conhecendo melhor, também podemos evitar certos gatilhos emocionais que nos deixam em situações negativas e assim saberemos como reagir a essas situações.”
AMANDA MACHRY – Vendedora

Mulheres que falam sobre autoaceitação

  • Alexandra Gurgel – https://www.instagram.com/alexandrismos/. Jornalista, escreveu o livro ‘Pare de se odiar: porque amar o próprio corpo é um ato revolucionário’ e é fundadora do ‘Movimento Corpo Livre’.
  • Letticia Munniz – https://www.instagram.com/letticia.munniz/?hl=pt-br. É modelo e usa a frase ‘amor próprio é o novo sexy.’

Publicações originais

Bárbara Teixeira

Hoje o look do dia permitiu que essa nesguinha de barriga ficasse aparecendo e não se enganem, essa é uma vitória, pq eu não troquei de roupa, inclusive me achei bem moderninha! Essa nesguinha está presente em muitas opções fashionistas das blogueiras de moda que eu gosto de seguir, mas que aqui na minha casa (o meu corpito) não conseguia fazer habitar.

A autoaceitação é um tipo de guerra. Às vezes a gente vence umas batalhas e tem dias que somos assolados por outras. Hoje, foi minha vez de ganhar. Mas claro, é preciso que saibam que eu não planejei estar de panz de fora. Mas a blusa que botei dobra pra dentro e a barra da saia que eu adoro usar não é suficiente alta para encontrar com a costura da blusa e aí ficou aparecendo essa borda de pele, macia e hidratada com os meus Boticários, mas que tantas vezes eu insisto que ‘me incomoda’. Hoje não! Ah, e por falar em macia, e eu que dei um abraço em uma criança e ela me disse que era muito bom me abraçar pq eu era macia? Maciez gente, isso é um elogio delicioso, não acham?

Mas voltando ao assunto. Sair com a nesga é uma vitória grandiosa. Como seu eu tivesse dado a mão para um inimigo, para andarmos juntos no caminho que nos levará ao perdão. Porque aceitar-se é ir se perdoando daquilo que você julgou “errado”, quando na verdade, era só você.

Conversando com meu pai, despretensiosamente, falamos que as vezes nossa busca não deveria ser por atingir alguma coisa, mas por apreciar o que conquistamos. Por amar o que e quem somos e onde estamos. Hoje estou comemorando a minha nesga, a minha maciez, a minha saúde. A gente precisa focar nas vitórias, né? No caso, as nossas. #bodypositive

Amanda

Tanta roupa linda deixamos de usar, porque o braço tá muito grande, porque as costas estão com gordurinhas a mais, porque marca a barriga, ou porque estamos magra demais. porque não?

Tantos lugares deixamos de ir por acharmos que todo mundo ficará olhando e julgando o quanto engordamos ou mesmo emagrecemos.

Tantos momentos bons da vida perdemos por se importar com a opinião dos outros em relação ao que vestimos, ao que pesamos, ao que temos ou, simplesmente, ao que somos.

Tantas fotos lindas deixamos de postar depois de olhar 10x e dizer: não dá, to muito feia, eu deveria ter isso, ter aquilo, ser assim ou assado.

E o padrão, que a gente corre atrás, mas ninguém sabe qual realmente é ? em busca do que estamos indo mesmo ? qual é o ideal? o que perdemos nesse caminho ? será que vale a pena ?

Do que você tem vergonha? você se acha mesmo feia ou te fizeram achar?

O verão tá aí, e eu sei que a gente sempre acha que o corpo dos outros é mais bonito, mais magro, mais sarado, mas todo mundo tem problemas com seu corpo, acredite. ninguém está satisfeito.

O que não dá mais é perder tempo achando que os outros estão olhando e deixar de viver a vida. se liga, guria. a vida é uma só.
Bora ser feliz ?

(carta pra mim, e pra quem se sentir igual)



Débora Kist

Débora Kist

Formada em Comunicação Social - Jornalismo pela Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc) em 2013. Trabalhou como produtora executiva e jornalista na Rádio Terra FM entre 2008 e 2017. Jornalista no jornal Folha do Mate desde 2018 e atualmente também integra a equipe do programa jornalístico Terra em Uma Hora, veiculado de segunda a sexta, das 12h às 13h, na Terra FM.

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