Diversas formas de fé são encontradas em Venâncio Aires
(Foto: FreePik/Divulgação)
Diversas formas de fé são encontradas em Venâncio Aires (Foto: FreePik/Divulgação)

O Censo Demográfico 2022, desenvolvido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apontou que a população de Venâncio Aires cresceu 4,2% entre 2010 e 2022, de 65.946 para 68.763 – são mais 2.817 habitantes. No entanto, o número de pessoas que declararam não ter nenhuma religião triplicou neste período de 12 anos. É o que mostra a nova rodada da pesquisa, que destaca a religião dos brasileiros.

Em 2010, o levantamento apontava para 855 moradores sem religião e, no levantamento de 2022, 2.574 declararam não ter religião. Os dados também evidenciam queda no número de católicos (51.040 para 44.213) e crescimento dos evangélicos (11.285 para 12.667). Professor de Sociologia na Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc) e pesquisador sobre religiosidade, Cesar Goes afirma que as mudanças estão ligadas a dois fatores: liberdade em relação às tradições e secularização do mundo (perda da vivência da fé na esfera das relações sociais).

Goes ressalta que, hoje, viver com religião é uma opção, ao contrário de outra época, quando os jovens estavam mais incluídos em círculos religiosos. “Como é uma decisão íntima e pessoal, a vida segue para ele ou ela com este novo sentido”, comenta. No entanto, ele também diz que isso pode causar uma crença na hiper-racionalidade como explicação do mundo, individualismo e exclusão de aspectos sensíveis do viver. “É uma espécie de desencantamento do mundo, que não exatamente é negativo, mas faz parte deste fenômeno”, esclarece.

Redução da religião católica

Com relação à mudança na quantidade de católicos, o pesquisador diz que, novamente, é possível citar alguns fatores principais: a ampliação do leque de opções, a perda do senso de comunidade e o distanciamento com os conceitos da religião.

Goes afirma que as características da sociedade brasileira nas últimas décadas favoreceram a essa migração das opções de fé, como a democratização, a alfabetização e a diminuição da miséria. “Por muito tempo o catolicismo brasileiro se valeu do Estado, desde o período colonial e mesmo depois do advento da República, que em sua ideologia trazia ‘embutido’ o positivismo. E, neste caso, o catolicismo jogava a favor das elites, com princípios de ordem, docilidade e obediência”, destaca.

Outra questão que comprometeu o catolicismo, reforça o professor, foi a perda do senso de comunidade. “Seus agentes acabaram por se concentrar muito mais em tarefas administrativas do que pastorais e olhando mais para dentro da instituição do que para a população e suas necessidades fora do circuito da igreja”, analisa.

Matrizes africanas

As religiões de matrizes africanas, como candomblé e umbanda, também triplicaram na Capital do Chimarrão em 12 anos. Antes eram 230 adeptos, agora são 739. Contudo, Goes afirma que o Censo ainda carece de expressões e não percebe essas particularidades.

Como exemplo, o candomblé é uma tradição do Nordeste brasileiro, enquanto que no Sul, vários grupos étnicos, como os Jejes, Cabinda e Oyó, compuseram outra tradição que ficou denominada batuque ou nação. “O Censo não faz essa diferenciação e passa todas as denominações como candomblé, que apesar de existir aqui é minoria. As pessoas, quando entrevistadas, acabavam por registrar essa única opção oferecida”, ressalta.

A umbanda, por sua vez, incorpora uma dinâmica mais sincrética e, portanto, uma expressão mais nativa do Brasil. Ele explica que esta foi formada na encruzilhada das tradições cristãs, com ênfase no kardecismo (espiritismo de Allan Kardec) e das tradições de matriz africana. Se forjou como uma opção singular para expandir as fronteiras culturais da herança africana, incorporando ícones da cristandade europeia e do xamanismo indígena.

Este sincretismo herdou tradições voltadas para o acolhimento, a horizontalidade, a caridade e os conhecimentos tradicionais. Ainda é marcada pela música, dança e oferendas, que formam valores e apontam para uma estabilidade do grupo e uma valorização da pessoa que professa ali a fé. “Claro que esses espaços não ficam imunes aos problemas de outras religiões, mas a visibilidade das tradições de matriz africana deve ser saudada com sinônimo de liberdade e empoderamento dos segmentos até há pouco invisíveis no Brasil, quer pela sua pobreza, quer pela sua cor”, completa Goes.

Comparação em Venâncio Aires

Religião Censo 2022Censo 2010
Católica Apostólica Romana44.21351.040
Evangélicas 12.66711.285
Espírita 403 478
Umbanda e Candomblé739 230
Sem religião2.574855
Outras 587 353
Não sabe07

O Censo Demográfico de 2010 ainda incluía como alternativas católica apostólica brasileira (1.591) e católica ortodoxa (68). Na pesquisa de 2022, também foi possibilidade o item tradições indígenas, que não teve nenhum adepto em Venâncio Aires.

Religião no Brasil

• De 2010 a 2022, de acordo com os dados do Censo Demográfico, houve redução do percentual de católicos apostólicos romanos (56,7%) e aumento de evangélicos (26,9%) e sem religião (9,3%). Em 2010, os católicos eram 65,1% da população de 10 anos ou mais, os evangélicos, 21,6%, enquanto os sem religião correspondiam a 7,9% dos declarantes.

• Entre os católicos, a diminuição foi de 8,4 pontos percentuais frente a 2010. Já a proporção de evangélicos e sem religião no país cresceu, respectivamente, 5,2 pontos percentuais e 1,4 ponto percentual.

Evangélicos: aumento no Brasil e leve avanço em Venâncio Aires

Com aumento de 5,2% no Brasil, os evangélicos são o grupo religioso que mais cresce nacionalmente. Por outro lado, em Venâncio Aires o cenário é de leve avanço, alcançando 12.667 fiéis.

O professor César Goes explica que as igrejas evangélicas, no campo pentecostal, cresceram muito nas periferias urbanas, seja pela rapidez com que estas congregações organizam as comunidades, seja por investimentos institucionais.

Ele destaca que a existência de igrejas em comunidades rurais requer mais investimentos para um público muito menor. “Assim, é uma questão de tempo. Na medida que nossa região aumenta a sua densidade populacional na área urbana, vamos no equiparando ao padrão das cidades médias e grandes também quanto ao crescimento do pentecostalismo”, relata.