“O gerenciamento de resíduos tem papel importante para conter o avanço da poluição”

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Conter o avanço da poluição plástica e as consequências negativas dela para o meio ambiente, os animais e os seres humanos exige medidas conjuntas, em diversas frentes. Isso inclui as ações individuais, em casa ou no trabalho, com redução do uso do plástico e destinação correta do resíduo. Ao mesmo tempo, são fundamentais as ações do Poder Público, de empresas e instituições na gestão adequada dos resíduos.

A professora Adriane de Assis Lawisch Rodriguez, coordenadora dos cursos de Engenharia Agrícola, Engenharia Ambiental e Engenharia Química da Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc), afirma que muitas alternativas estão sendo estudadas para a substituição do material plástico e a redução do impacto no meio ambiente. “Entretanto, o plástico não pode ser considerado, sozinho, um vilão. A destinação incorreta gera muitos problemas ambientais. O gerenciamento de resíduos tem um papel importante para conter o avanço da poluição”, ressalta.

Engenheira química, com mestrado em Materiais e doutorado em Polímeros, Adriane cita o relatório ‘Da Poluição à Solução: Uma Análise Global sobre Resíduo Marinho e Poluição Plástica’. Conforme o estudo, ações para acelerar a transição para energias renováveis e abordagens circulares ajudarão a reduzir os resíduos plásticos na escala necessária. “O estudo destaca que a poluição plástica nos ecossistemas aquáticos cresceu consideravelmente nos últimos anos e deve dobrar até 2030, com consequências terríveis para a saúde, a economia, a biodiversidade e o clima”, menciona.

Professora Adriane Lawisch Rodriguez é coordenadora dos cursos de Engenharia Agrícola, Ambiental e Química da Unisc. (Foto: Arquivo Pessoal)

Em entrevista à Folha do Mate, a professora contextualiza como o plástico se tornou uma matéria-prima importante para a indústria de diferentes segmentos, sua relevância para sociedade e por que ele é um resíduo tão prejudicial quanto descartado de forma errada, no meio ambiente.

Folha do Mate: Qual a importância do plástico para a sociedade?

Adriane de Assis Lawisch Rodriguez: O plástico é um material resistente, leve, versátil e fácil de usar, o que resulta um importante material em substituição daqueles mais tradicionais. Sua utilização permitiu a redução do consumo de combustível para os carros por deixá-los mais leves e também, a partir dos filmes plásticos se conseguiu melhores rendimentos em certos tipos de culturas agrícolas.

Destaca-se também que a dita cadeia produtiva do plástico tem uma importância fundamental na economia, gerando milhares de empregos diretos e indiretos. Outro fato que merece destaque é que seu ciclo de vida pode ser mais favorável tanto nas questões de gerenciamento de recursos, efeito estufa, saúde humana e preservação de recursos materiais desde que aplicado com gerenciamento ambiental sustentável.

Desde quando o plástico começou a ser utilizado em larga escala e por que ele se tornou um poluente?

Houve uma evolução gradual da produção de plásticos durante o final do século 19 e início do século 20, acompanhando o desenvolvimento dos processos fabris e industriais pelo mundo e, no início da década de 50 começou a sua produção em grande escala. A produção anual de plástico foi multiplicando-se com o passar dos anos, passando de dois milhões de toneladas métricas em 1950 para 390 milhões em 2022.

O plástico é difícil de ser compactado e gera um grande volume resíduo. Portanto, ele ocupa um grande espaço no meio ambiente, o que dificulta também na decomposição de outros materiais orgânicos. A durabilidade e resistência do plástico viram problemas após o descarte. Como é à prova de fungos e bactérias, sua degradação é extremamente lenta, podendo demorar muito tempo. Além disso, o plástico nos oceanos se fragmenta em pequenas partículas plásticas, os chamados microplásticos, que acabam participando da cadeia alimentar.

Quanto tempo o plástico leva para se decompor? Por que sua decomposição é tão lenta?

Segundo dados do Ministério do Meio Ambiente, o resíduo plástico pode levar mais de 400 anos para se decompor. No entanto, não há informações concretas a respeito do tempo de decomposição de cada tipo de plástico. Cada uma de suas moléculas possui centenas de milhares de átomos, principalmente carbono e hidrogênio. Como as ligações entre os átomos são muito estáveis, os decompositores não conseguem quebrar o material em partes menores para destruí-lo. Assim, como é à prova de fungos e bactérias, sua degradação é extremamente lenta, podendo demorar muito tempo.

Quais os principais prejuízos do descarte inadequado?

Quando descartado de forma incorreta, o resíduo plástico pode causar entupimentos de valas e bueiros, que geram as enchentes. O plástico é difícil de ser compactado e gera um grande volume de lixo. Portanto, ele ocupa um grande espaço no meio ambiente, o que dificulta também na decomposição de outros materiais orgânicos. A poluição visual é outro ponto negativo. Somado a isso está o impacto dos plásticos no ecossistema marinho. A partir do contato com o ambiente marinho, altas temperaturas, energia das ondas, ambientes abrasivos ele se fragmenta e acaba entrando na cadeia alimentar de muitos animais.

O que pode e precisa ser feito para conter o avanço da poluição plástica? De que forma empresas, instituições e pessoas podem contribuir?

Aqui, o sistema de gerenciamento de resíduos assume um papel importante. O plástico, ‘sozinho’, não é o vilão da história. Repensar, reduzir, recusar, reutilizar e reciclar são as cinco palavras necessárias para ter uma grande resposta para a sustentabilidade, respeitando o meio ambiente. Entre as ações que podem colaborar e muito para a redução da utilização dos plásticos de uso único está ter sempre consigo um kit de ‘sobrevivência’ – garfo, faca, copo – e seguir a linha do consumo consciente. Outro destaque vai para o fato de que cada vez há mais países que estão adotando políticas para reduzir o consumo de plástico com o intuito de diminuir/parar a contaminação — mais de 60 de acordo com um relatório da Organização das Nações Unidas (ONU) de 2018.

“O plástico, ‘sozinho’, não é o vilão da história. Repensar, reduzir, recusar, reutilizar e reciclar são as cinco palavras necessárias para ter uma grande resposta para a sustentabilidade, respeitando o meio ambiente.”
ADRIANE DE ASSIS LAWISCH RODRIGUEZ
Engenheira química, doutora em Polímeros e professora da Unisc

Um alerta para os microplásticos

Microplásticos são pequenas partículas sólidas de materiais baseados em polímero (plástico) com menos de cinco milímetros de diâmetro. A professora Adriane Rodrigues explica que os existem duas categorias de microplásticos: primários e secundários. Os primários são partículas projetadas para uso comercial, ou seja, em produtos como os cosméticos e as microfibras de tecidos. Já os secundários resultam da quebra de itens plásticos maiores, como canudos e garrafas de água.

Plásticos de uso único, como os copos descartáveis, são considerados os principais problemas pois contribuem com uma grande geração de resíduo. (Foto: Julia Filirovska/Divulgação Pexels)

Adriane observa que boa parte do plástico que não é descartado corretamente e acaba no meio ambiente chega aos mares e oceanos. “Os microplásticos podem causar danos tóxicos aos seres vivos, uma vez que, por conta do seu tamanho, apresentam uma grande capacidade de adsorção de compostos de alta toxicidade, como metais pesados, como cádmio e mercúrio”, cita. Estudos já identificaram a presença de microplásticos no estômago de animais marinhos, na água potável e, inclusive, no corpo humano – em pulmões, no sangue, na placenta e no leite materno.

Bioplástico

O termo “bioplástico” aparece muitas vezes como uma solução em substituição ao “plástico”, entretanto, a professora Adriane de Assis Lawisch Rodriguez chama atenção aos conceitos. Ela esclarece que o bioplástico é aquele que tem produção por meio de uma fonte renovável, a partir de biomateriais – matérias-primas de fontes naturais, como plantas e bactérias. “Até mesmo plásticos derivados de petróleo têm sido chamados de bioplásticos.”

Segundo a engenheira química, para a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), um material só pode ser chamado de biodegradável se ele for ‘quebrado’ por micro-organismos, como fungos e bactérias, em pedacinhos menores que dois milímetros. Esse processo não pode demorar mais que 90 dias, nem ultrapassar alguns limites de toxicidade e de emissões de CO2 para ser concluído.

“O caso do polietileno verde, produzido a partir da cana-de-açúcar, não é biodegradável. Mas pode ser classificado como um bioplástico, pois, de acordo com a definição da European Bioplastics Association, plásticos produzidos a partir de fontes renováveis ou plásticos biodegradáveis são classificados como bioplásticos ou biopolímeros”, explica.



Juliana Bencke

Juliana Bencke

Editora de Cadernos, responsável pela coordenação de cadernos especiais, revistas e demais conteúdos publicitários da Folha do Mate

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