Bate à porta do Congresso Nacional uma proposta de projeto de lei que prevê o aumento do prazo de validade da carteira de motorista e também da quantidade de pontos pela qual o motorista perde a habilitação em caso de acúmulo de infrações.
A bandeira há muito é defendida pelo presidente Jair Bolsonaro que, em fevereiro, falou da intenção de flexibilizar os itens, com a necessidade de “desburocratização e economia”. Recentemente, ele também criticou o que considera uma “indústria da multa” e falou em suspender a instalação de novos radares em rodovias federais do país.
O assunto trânsito, aliás, foi o centro das discussões em Venâncio Aires nesta quinta-feira, 11, devido ao grave acidente que vitimou fatalmente uma pessoa na RSC-453. O motorista que teria causado o acidente estava alcoolizado e tem a CNH cassada.
Embora a proposta não tenha sido detalhada, sabe-se que a maior validade e o aumento de pontos são itens contemplados. Atualmente, o motorista pode ter a carteira suspensa se acumular, ao longo de 12 meses, 20 ou mais pontos. Esses pontos são acumulados conforme as infrações cometidas no trânsito. Segundo o ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, o projeto vai tornar mais ágil a suspensão da CNH em casos de infrações muito graves, como dirigir sob o efeito de álcool.
Sobre o maior prazo para renovação (de cinco para 10 anos), Freitas disse que “não faz sentido tirar a carteira com 18 anos e com 23 ter que renovar”, já que “isso não resolve o problema das mortes.”
O ministério disse ainda que a ampliação do limite de pontos representaria o “aprimoramento da gestão e redução do número de processos administrativos tramitando nos Detrans” de todo o país.
RETROCESSO
O Sindicato dos Centros de Formação de Condutores do Rio Grande do Sul (SindiCFC-RS) criticou o aumento dos pontos da CNH. “Vejo como um retrocesso. Isso vai deixar na rua os maus condutores. Nesse tempo que já deveriam estar se reciclando e trabalhando a parte comportamental, estarão convivendo com outros motoristas. Por isso acho que esse projeto não passa pela Câmara”, afirma o vice-presidente do SindiCFC-RS, Luciano Aubin.
Quanto à validade da carteira, Aubin entende que isso depende da avaliação médica e se há necessidade de questionamento, ela deveria ser feita pela Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet). “Os médicos têm autonomia sobre isso, mas entendo que problemas de saúde como visão e pressão alta podem aparecer repentinamente.”
O médico Nilton Reis atua como perito de trânsito no CFC Venâncio Aires. Para ele, é arriscado ficar muito tempo sem acompanhamento. “Quanto mais longo, mais risco à população. Tem gente que só sabe que não enxerga bem ou está hipertenso quando vai renovar a carteira. Tem distúrbios musculares, neurológicos, diabetes. Esses problemas podem aparecer de um ano para outro.”
O que dizem os CFCs de Venâncio Aires
O diretor geral do CFC Venâncio Aires, Fábio Bencke, destacou que na última década vem se trabalhando fortemente na prevenção e houve muita evolução com o novo Detran. Bencke comentou ainda a ideia ventilada pelo Governo de tirar lombadas e radares. “As rodovias vão virar um ‘Deus nos acuda’. Muita gente ainda anda dentro do limite de velocidade pelo medo da punição. Mas se flexibilizar isso, é andar na contramão. Nossa população não está preparada para isso.”
O diretor do CFC Venâncio Aires disse também que muitas vezes os CFCs são vistos como vilões. “Acatamos o que nos é repassado. Se a questão da validade, por exemplo, for confirmada como válida e importante, ok. Mas minha preocupação é a educação no trânsito.”
A diretora geral do CFC Central, Rosemeri Rafanhim, afirma que a proposta do aumento de pontos é radical e precipitada. “Um governo que se apresentou como rígido na cobrança de leis punições, na verdade está propondo o contrário. Acho uma regressão e um incentivo ao motorista infrator.”
Rosemeri disse ainda que, mesmo com todos os trabalhos de conscientização e educação no trânsito, o Brasil ainda tem muitas mortes no trânsito. “Se for para mudar, que seja amplamente estudado e debatido. Mas assim como está sendo cogitado, vejo como uma precipitação.”
NÚMEROS
1 A Organização das Nações Unidos (ONU) lançou e o Brasil aplicou a Década de Ação pela Segurança no Trânsito (2011-2020), para prevenir acidentes de trânsito. Para o vice-presidente do SindiCFC-RS, Luciano Aubin, já houve avanços e o Rio Grande do Sul pode ser um exemplo.
2 Segundo estatísticas do Detran RS, em 2010 foram 2.190 mortes no trânsito para um frota de 4,709 milhões de veículos. Em 2018, foram 1.670 mortes para uma frota de 6,772 milhões de veículos. “Enquanto a frota aumentou, o número de mortes caiu. É importante melhor ainda mais.”