Elmo Baron com a Panasonic M9000, uma das primeiras filmadoras (Foto: Débora Kist/Folha do Mate)
Elmo Baron com a Panasonic M9000, uma das primeiras filmadoras (Foto: Débora Kist/Folha do Mate)

Venâncio Aires - Quem aqui, que for ler essas linhas e já passou dos 30 anos, não lembra de um costume familiar da década de 1990 e início dos anos 2000? O de sentar em frente à TV, num domingo à tarde, para assistir, na íntegra, a gravação de uma festa de casamento ou comunhão, por exemplo? Esse costume, talvez um quase ritual, também era um ‘atração’ dentro de casa, onde pais, filhos, avós, tios, primos, vizinhos ou qualquer visita, se reuniam na sala para prestigiar a filmagem de uma festa recentemente realizada. Não importava se a gravação tinha longas quatro horas: assistir, também era um evento à parte.

Em Venâncio Aires, dos milhares de eventos familiares registrados durante mais de 20 anos, muitos deles aconteceram pelo olhar e pelos ombros (onde apoiava das filmadoras) de Elmo Baron, 59 anos. O cinegrafista, que se dedicou às filmagens entre o fim dos anos 90 até o início da pandemia de Covid-19, ficou conhecido no município por eternizar, em vídeo, momentos marcantes para muitos venâncio-airenses. Em mais de duas décadas, foram mais de 5 mil eventos, a maioria registrada nas hoje nostálgicas fitas VHS.

Do jogo de salão, a primeira filmadora

Elmo Baron nasceu em Linha Julieta, no interior de Venâncio Aires, e, em 1979, começou a trabalhar na antiga Fumossul. Ele não tinha nem 13 anos e já teve assinada a carteira de trabalho. Foram 18 anos dentro da tabacaleira, até 1997, onde nos últimos anos foi encarregado de setor.

Naqueles anos, de vez em quando Baron ‘batia uma bolinha’ no ginásio da empresa e, num desses jogos de futebol de salão, um colega filmou a partida com uma máquina JVC Compact VHS. “Vi aquela filmagem e me interessei. Acabei comprando a filmadora”, recorda. Isso aconteceu em 1996 e, logo após, conhecidos dele, sabendo da aquisição, começaram a solicitar por imagens em festinhas particulares. “Foi assim que fui gostando e pegando gosto pela coisa.”

Foram cerca de três anos fazendo filmagens eventuais e começou ‘pra valer’ em 1999, quando adquiriu uma Panasonic M9000. “Não era fácil, a máquina pesava nos ombros, cerca de quatro quilos. E para fazer a iluminação, tinha que se virar com um rabicho. Dependendo do local, precisava um cabo de 80 metros”, descreve.

Três dias de edição

Quando decidiu seguir nessa profissão, Elmo Baron fez da sala de casa, na rua Duque de Caxias, um estúdio. Computador? Já existia, claro, mas não era algo acessível a todos e o cinegrafista começou o trabalho de edição com uma televisão de tubo e dois vídeos cassete. “Quando tinha uma festa de Bodas de Ouro, por exemplo, o pessoal queria tudo, na íntegra, nem que eram quatro horas. Às vezes arrebentava a fita, era trabalhoso. Dependendo, levava uns três dias editando”, lembra.

Nas contas do profissional, foram mais de 5 mil festas durante 22 anos, especialmente casamentos, bodas, comunhão, confirmação e batizados. Além da M9000, também trabalhou com uma filmadora Panasonic M3500 e com o passar dos anos foi fazendo a transição para as máquinas digitais e HD. “Essa transição tecnológica foi para melhor. Facilitou muito.”

Nas mãos, a JVC Compact VHS, a primeira filmadora, comprada em 1996. Sobre a mesa, alguns dos equipamentos usados durante os anos de trabalho (Foto: Débora Kist/Folha do Mate)

Parcerias

Com o aumento da demanda pelas filmagens, Elmo Baron montou uma equipe para ajudá-lo por volta de 2002. Houve dias que a turma se dividia em cinco eventos no mesmo horário, fazendo mais de 50 festas no mês. O profissional também trabalhou em parceria com alguns fotógrafos, como Paulo Sérgio Queiroz (Foto Arco-Íris) e Milton Klafke (Foto Visão), além da família Bitsch, de Mato Leitão.

Carreiras de cavalos

Uma curiosidade nas duas décadas como cinegrafista, foram as filmagens de aproximadamente duas mil carreiras de cavalo, em vários municípios dos Vales do Rio Pardo e Taquari.

Os organizadores o contratavam, basicamente, para tirar dúvidas na linha chegada. “Em me posicionava em cima de um andaime e vinha acompanhando os cavalos. Quando chegavam, às vezes era muito junto, então na filmagem dava para tirar a prova.”

Numa dessas carreiras, ele conta que passou um ‘perrengue’, quando uma senhora, que tinha apostado em determinado cavalo, o cobrou porque, segundo ela, Baron “fez o animal correr mais devagar na TV”.

A única fita VHS que guardou, após um temporal destruir o acervo de 6 mil fitas e DVDs (Foto: Débora Kist/Folha do Mate)

Momentos marcantes

Entre os milhares de eventos que testemunhou, Elmo Baron lembra de casos inusitados e emocionantes. Como um casamento coletivo, no bairro Gressler. “Eram seis casais e depois foi uma única festa para todos. Levei um ‘baile’ para conseguir dar conta”, recorda, entre risos. Baron também cita as mais de oito horas de filmagem que fez acompanhando as atividades de um Kerb, em Linha Isabel. “Saímos às 7h da escola 21 de Abril e acompanhei a turma nas animações pelas casas até as 15h.”

Embora tenha se divertido e emocionado participando de tantos eventos, o cinegrafista não pensa duas vezes para definir os mais marcantes: a festa de 15 anos da filha única, Bruna, e a comunhão do neto Braian. Bruna, aliás, que hoje tem 36 anos e cresceu em meio aos VHSs e DVDs, também trabalha no ramo e tem uma produtora de filmes focada em casamentos.

O olhar é o mais importante

Com a restrição de eventos durante a pandemia de Covid-19, Elmo Baron parou com as filmagens. E, quando poderia voltar, foi, nas palavras dele, “atrapalhado por problemas de saúde”. Assim, decidiu encerrar a carreira de cinegrafista e, atualmente, mora em Linha Antão, no interior de Venâncio Aires, numa casa centenária que pertenceu ao sogro Ello Henrique Baron. “Troquei as filmadoras pelos bichinhos e a horta. Assim me ocupo.”

Na casa onde manteve o estúdio, na cidade, um temporal em 2024 deixou um prejuízo irrecuperável. “Destelhou e a chuva destruiu meu arquivo de cerca de 6 mil fitas VHS e DVDs. Guardei apenas uma fita, de recordação, mas ela não funciona. É só pra lembrar mesmo”, conta.

Questionado sobre o que mais lhe orgulha em todos esses anos, Elmo Baron diz que foi trabalhar com honestidade e ter oportunidade de fazer parte de momentos importantes na vida de milhares de pessoas. “Eu sempre imaginava uma cena como se ela fosse apenas para mim. Então tinha que ter o melhor enquadramento, do momento especial. O olhar é mais importante que ter a melhor máquina em mãos.”

O cinegrafista aposentado também destaca o orgulho de ser reconhecido até hoje. “As pessoas me abordam na rua e dizem: ‘Elmo, tu filmou meu casamento, tu filmou o batizado do meu filho. Eu te recomendei para um conhecido’. Isso me orgulha muito, foi no ‘boca a boca’ que meu trabalho cresceu. As pessoas gostavam e recomendavam para outros. Então fico feliz de ter participado de tantos momentos felizes.”