Conheça mais sobre a história de um venâncio-airense apaixonado por carros antigos e do quanto um modelo de Jeep Willys em especial o faz reviver a infância e as lembranças do avô.
Para qualquer criança, tem diversão maior que passar uns dias na casa dos avós? E quando essa casa está num ‘pacote’ chamado zona rural? Os animais, a fruta colhida no pé, o cheiro de um pão caseiro, um galpão que vira cenário para inúmeras aventuras… Endrigo Wenzel também desfrutou desse tipo de infância ‘raiz’, na casa dos avós maternos, em Linha Lucena, interior de Venâncio Aires, nos anos 1980.
Mas lá, houve um outro componente inesquecível: um Jeep Willys capota de aço 1963, que pertenceu ao avô, Alcido Herdina. Hoje, como se fosse a bordo de um DeLorean do clássico filme ‘De volta para o futuro’, Endrigo também consegue viajar no tempo e essa ‘viagem’ ele faz toda vez que dirige o próprio Jeep, ainda que seja um 1961. Porque dentro dele, as memórias do 63, do avô e dos tempos de criança, se tornam novamente realidade.
Um Jeep Willys zero que custou dois freezers
Alcido Herdina (1932-2014) ainda era um jovem agricultor em Linha Lucena, em 1963, quando decidiu que precisava de um carro. Morando no interior de Venâncio Aires, onde há mais 60 anos as estradas e os acessos eram ainda mais desafiadores, sabia que precisaria de um veículo que aguentasse as condições.
Encontrou o que procurava direto com Lothário Schmidt (que também teve a Motorsul, a primeira concessionária da Volkswagen de Venâncio Aires): um Jeep Willys capota de aço. Zero quilômetro, naquele 1963, o veículo custou, na época, o equivalente a dois freezers. Mas a maior curiosidade é que Alcido aprendeu a dirigir no mesmo dia, orientado por Lothário Schmidt. “O vô me contou que aprendeu na hora e foi dirigindo o Jeep para casa”, relata o comerciante Endrigo Rafael Wenzel, 45 anos. Alcido Herdina foi um dos primeiros moradores de Lucena a ter carro e o fato de ser um 4 x 4 tracionado era ainda mais útil. “Era o vô quem levava os doentes para o hospital e também muitas mulheres grávidas que estavam para ter bebês.”
Férias de inverno
Essas histórias Endrigo ouviu do avô materno nos tempos de criança, na metade dos anos 1980, quando ia para Linha Lucena e ficava as duas semanas das férias de inverno por lá. Uma das maiores diversões era acompanhar o vô até a cidade. Alcido tirava o banco traseiro do Jeep e colocava um pelego de ovelha sobre a ‘caixa’ das rodas, para acomodar Endrigo e a irmã Rafaela. Entre as crianças, empilhava melancias e outras frutas e verduras, cujo destino era a casa dos filhos que já moravam na parte urbana de Venâncio. Assim, igual era apaixonado pelo avô, Endrigo foi se apaixonando pelo Jeep e por tudo mais que envolvesse o mundo do automobilismo.
O Fusca e a ‘Super Máquina’ de plástico
Endrigo Wenzel estudou no Colégio Gaspar e revela que, desde criança, quando eram feitos aqueles testes de aptidão ou de futuras profissões, a indicação era que ele trabalharia com carros. Como o pai, Arcélio, hoje com 71 anos, também sempre gostou de automobilismo, Endrigo cresceu nesse ‘universo’ sobre quatro rodas.
Num Natal, quando tinha 4 anos, lembra com carinho do Fusca de plástico vermelho que ganhou de presente. Num outro dezembro, foi surpreendido com um Pontiac Trans Am preto, também de plástico. Era o carro da ‘Super Máquina’, série de TV que fez sucesso no Brasil nos anos 80.
“Eu gostava de ir até na frente da Motorsul, olhar as novas Paratis, e da Auto Geral [antiga revenda da Chevrolet de Venâncio Aires] e contemplar os Opalas. Eu era pequeno e aquilo me encantava.” Como os testes vocacionais já apontavam, naturalmente foi em meio aos carros o primeiro emprego de Endrigo. Aos 13 anos, começou varrendo a antiga oficina de Aldo Costa, no bairro Cruzeiro. Lá, foi uma espécie de ‘faz tudo’ e também aprendeu sobre mecânica.
O ‘Tema da Vitória’
Para um menino fã de carros que cresceu nos anos 1980, Endrigo teve o privilégio de ver um dos maiores desportistas brasileiros no auge. Ele se lembra bem das emoções nas manhãs de domingo com as vitórias de Ayrton Senna (1960-1994) na Fórmula 1. “Não perdia nenhum grande prêmio.”
Figura que conquistou fãs no automobilismo, o piloto era praticamente uma unanimidade e ainda é, para muitos, o maior da história da Fórmula 1 e um dos últimos ídolos no Brasil. Assim também entende Endrigo, que vibrou com o tricampeão mundial de Senna em 1988, 1990 e 1991.
Os títulos do piloto, vale lembrar, foram embalados por uma canção nas transmissões da Rede Globo, capaz de emocionar mesmo quem não viveu a época: o Tema da Vitória. A música é tão emblemática para Endrigo, que há anos é toque do celular dele. “Posso até trocar de celular, mas de toque não.”
Antes do próprio Jeep Willys, as voltas de Passat, Fusca e Chevette Tubarão
Endrigo Wenzel, que ainda pequeno se apaixonou pelo Jeep capota de aço do vô Alcido e brincou com os carrinhos de plástico, também teve outros ‘amores’ de quatro rodas. Aprendeu a dirigir num Passat branco 1980, que pertenceu ao pai, e foi num Fusca verde 1968 que muitas vezes foi até Linha Travessa para as boates no salão Gigante.
O primeiro carro que comprou com o próprio dinheiro foi um Chevette Tubarão branco, 1974. Como o ‘destino’ já tinha decidido por ele sobre a profissão, depois da oficina de Aldo Costa, Endrigo ainda trabalhou na Auto Peças Hermes e na Auto Elétrica Braun, até abrir a própria loja, de som e acessórios automotivos, quando tinha 19 anos, negócio que mantém ainda hoje, ao lado da esposa Jeany Schuch, 46 anos. O casal chegou a ter um ônibus Marcopolo III rodoviário 1976, que até serviu de casa durante oito meses durante a pandemia, quando realizavam obras na chácara para onde se mudaram e moram atualmente, em Linha Barbosa. “Para a Pietra foi uma festa”, conta, se referindo à filha de 13 anos.
A busca pelo Jeep Willys capota de aço
Embora tenha tido outras relíquias sobre rodas, Endrigo nunca tirou da cabeça a ideia de ter um Jeep Willys capota de aço igual do avô. Alcido ficou com o veículo por mais de 40 anos e ele foi vendido. “Está com uma pessoa de Lajeado e bem cuidado. Então depois que o vô faleceu, em 2014, eu comecei a pesquisar e procurar um igual.”
Endrigo encontrou o que procurava em Caxias do Sul: um Jeep como do avô, sendo que as únicas diferenças são o ano e a cor– o comerciante achou um 1961, dois anos mais velho que o de Alcido, e nas cores azul e branca. Do avô era um 1963, branco com marrom. O Jeep 1961 chegou na vida de Endrigo em 2019. Ele pertenceu a uma única família, que decidiu vendê-lo para cobrir despesas com um tratamento médico. “Foram necessários alguns reparos, mas ele é 100% original. Tem as mesmas peças com as quais saiu da fábrica, em 1961.”
Cuidados e voltas curtas
Endrigo, que não nega o cuidado, diz que dentro da garagem, “carro se guarda limpo, de ré e com tanque cheio.” O Jeep dele, que tão bem cuidado já era pela primeira família proprietária, segue assim e é usado para voltas mais curtas, geralmente aos sábados. Tem apenas 32 mil quilômetros rodados, o que é pouco para um veículo com essa idade. Diferente do avô, que não era de emprestar o Jeep para outros conduzirem, Endrigo não é ciumento. A esposa Jeany também o dirige (e adora!) e até esta repórter teve oportunidade de dar uma voltinha (e adorou também!), ainda que o câmbio, com apenas três marchas, e o tamanho do volante, causaram estranheza no início.
“Esse Jeep eu não pretendo vender. Um carro que lembra do meu vô e da minha infância, é especial demais.”
Endrigo Wenzel – Comerciante
Detalhes em casa
- Para realizar o sonho de ter o próprio Jeep Willys capota de aço, Endrigo revela que deu parte do valor em dinheiro mais um Gol GT 1984 – outro carro marcante na vida dele e que segue eternizado num quadro dentro de casa.
- Na residência dele, aliás, muitas coisas remetem à paixão pelo universo do automobilismo. Entre elas, a coleção de réplicas de carros clássicos, assim como na estrutura da casa, na qual duas aberturas são as janelas de um ônibus, compradas num desmanche.
Você sabia?
Antes de se tornar um clássico entre os off-road (fora da estrada – fabricados para suportar locais de natureza extrema e de difícil acesso), o Jeep Willys integrou cenários bélicos e sua origem está relacionada à Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Desenvolvido pela Willys-Overland Motors a pedido do exército dos Estados Unidos, se tornou um veículo militar indispensável para as tropas.
Segundo o site jeep.com.br, o mais longevo de todos os Jeep civis é o CJ-5. Tornou-se um dos veículos mais populares do planeta. Mais de 603 mil unidades foram produzidas até 1983.
A série Relíquias sobre rodas tem o patrocínio de Ark Impressão Digital, Posto Schmitz Ipiranga, Tiago Pneus e Via Som Auto Center.