O roteiro de ação e reação na crise entre Rússia e Ucrânia

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Na manhã desta quinta-feira, 24, o mundo acordou com a notícia de que o presidente russo, Vladimir Putin, havia autorizado os ataques ao seu país vizinho, a Ucrânia, em busca da incorporação da regiões separatistas de Luhansk e Donetsk e buscando reverter ações tomadas pela Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) e outras potências ocidentes. Contudo, o enredo do conflito já dura quase uma década.

O presidente ucraniano, Volodimir Zelensky, confirmou em comunicado oficial na sexta-feira, 25, que pelo menos 137 cidadãos do país morreram no primeiro dia de invasão. Apesar de não ter data para seu encerramento, o conflito teve avanços na tarde desta sexta-feira. O Kremlin anunciou que o presidente Vladimir Putin concordou em abrir negociações com o governo ucraniano. Para isso, o presidente russo teria pedido para o presidente bielorusso Alexander Lukashenko intermediar as conversas com Zelensky. A reunião deve ser realizada na capital bielorussa, Minsk.

De acordo com o professor Mateus Dalmáz, que possui graduação, mestrado e doutorado em História, e é docente da área de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas na Universidade do Vale do Taquari (Univates), o evento tem seus primórdios em 2013. “Nesse ano, houve eleições que renovaram o parlamento e elegeram um novo presidente. Que mostrou um interesse da maioria do eleitor de se aproximar da Europa Central. O que fez com que governos ucranianos ficassem, a partir de então, mais sensíveis a uma aproximação com o Ocidente. A União Europeia (UE) chegou a fazer um convite em 2014, e não foram adiante por pressão da Rússia, o que Vladimir Putin utilizou como pressuposto para intervir ocupando a região da Crimeia, onde a maioria da população tem proximidade com a Rússia.”

(Foto: Divulgação)

Atualmente, contudo, o conflito é uma espécie de ação e reação entre a Otan e a Rússia. “Em 2022, a ousadia veio por parte da Otan. Caso a Ucrânia entrasse na Otan, a organização poderia instalar bases militares próximas da Rússia, o que criaria um espaço geopolítico interessante no Leste Europeu”, pontua o professor.

Segundo Dalmáz, a organização e o país tomam atitudes visando frear as ofensivas adversárias, sem abrir mão de seus objetivos. “A Rússia reagiu pedindo para a Otan não expandir seus membros. Para pressionar, Putin deslocou tropa para a fronteira ucraniana. A reação dos Estados Unidos (EUA) e da UE foi de ameaçar com sanções financeiras, caso ela mantivesse o cerco. O que acabou acontecendo.”

Nessa semana, o presidente russo declarou apoio à soberania das regiões de Luhansk e Donetsk, locais que haviam se rebelado em 2014 e buscaram a independência da Ucrânia, utilizando desse pretexto, para invadir as duas localidades. “A estratégia do Putin é utilizar os ataques a Ucrânia como uma espécie de carta na manga para barganhar os seus objetivos com o Ocidente, seja os Estados Unidos, a Otan, a UE, ou qualquer outro. Condicionar um cessar fogo e essa compromissos no Leste Europeu”, destaca Dalmáz.

Sanções no mundo

O presidente do Estados Unidos, Joe Biden, anunciou as maiores sanções econômicas da história contra a Rússia vetando qualquer transferência envolvendo banco russo e diversas limitações em importações e exportações para o país. A Otan pediu para que a Rússia obedecesse as leis internacionais e respeitasse a autonomia do estado ucraniano. “Com os acordos, é possível ver uma Ucrânia independente. No entanto, a Ucrânia pode acabar sendo incorporada à Rússia, revivendo outros momentos da história, afastando a Rússia do Ocidente”, destaca o professor.

Apesar das ameaças, Dalmáz não acredita que a Rússia possa invadir outros países. “É pouco provável, pelos custos, o cansaço. A Rússia não dispende de tanto poderio econômico para sustentar uma guerra. As coisas devem ficar restritas ao território ucraniano”, avalia.

Impactos no Brasil

Até o momento, o Brasil se posicionou de forma neutra com o conflito. “No século XXI, o Brasil manteve relações próximas com o hemisférios Sul e com a Rússia, em especial, pelo BRICS (grupo formado por Brasil, Rússia, Índia, China e Africa do Sul). Em nome dos acordos, não teria porque romper relações com a Rússia, e o país também tem boas relações com o hemisfério Norte, sendo assim deve se manter neutro”, pontua o historiador.
O país deve ser impactado com uma crescente nos preços, principalmente, no barril de petróleo, que já ultrapassou os R$ 100 após a eclosão do confronto. O Brasil também é um grande exportador de commodities agrícolas, como trilho e milho, e energéticas, como o petróleo, para esse países, o que pode gerar um dano na economia do país.

“A Rússia gostaria de voltar a ser uma superpotência, o que não é desde o fim da União Soviética (URSS). Para ser é preciso desenvolver a economia, principalmente com acordos com os antigos integrantes da URSS. A Ucrânia é peça essencial, além disso, é um parceiro histórico. Perdê-lo seria uma derrota moral.”
MATHEUS DALMÁZ
Professor e doutor em História

  • Os objetivos russos

  • Segundo o professor, a Rússia exige três obrigações:
  • A Otan precisa se comprometer com a não expansão
  • Ocorra uma desmilitarização entre as regiões fronteiriças do países Bálticos – Estônia, Letônia e Lituania
  • Aja uma desmilitarização em todas as fronteiras russas baseada no tratado de 1997

Venâncio-airense relata o medo de viver próximo do confronto

A venâncio-airense Yasmin Monteiro, de 23 anos, esposa do jogador Matheus Monteiro (ex-Internacional) do Torphedo Belaz da Bielorússia, vive há um ano no país e relata a rotina dos últimos dias no país vizinho da Rússia e da Ucrânia. “A população está com medo. Quem tem familiar na Ucrânia não consegue trazer para cá. É um país rígido, com um ditador na presidência. Os únicos voos que têm são para Moscou, sendo assim, a única alternativa é esperar.”

(Foto: Divulgação)

O presidente do país é Alexander Lukashenko, no poder desde 1994. “Não conseguimos muitas informações porque elas não chegam até nós. Não temos acesso à televisão ou rádio. Os meus contatos são com o clube (Torphedo Belaz), a dona do apartamento que moro e o Consulado. Sabemos que a maioria das pessoas aqui são russas ou tem relação com a Ucrânia. Então as pessoas estão sofrendo muito, estão apreensivas. As fronteiras estão fechadas, nem é possível mudar a moeda para o dólar.” destaca Yasmin.

Yasmin ainda comenta que tem poucas informações e as autoridades do país pedem apenas para esperar, sem apresentar detalhes. “Estamos com medo. Sendo estrangeiro, eles não passam muitas informações. Eles pedem para aguardar, esperar. Tivemos menos informações que o Brasil. Na quinta-feira, 24, a dona do apartamento me buscou porque tinha que ir na polícia, pois o meu seguro viria da Ucrânia. Entramos em desespero porque ela pediu um adiantamento em dólar para fugir do país. A polícia tava um caos, muitos soldados na rua. Foi assustador”, frisa.

“O governo daqui, a princípio, apoiou a Rússia, pois são dependentes da Rússia, a sorte que a dona do apartamento que eu moro nos passou as informações. As pessoas tem medo dos dois ditadores – Lukashenko e Putin. Temos que ter cuidado com o que fala, o que posta. Ninguém fala nada.”
YASMIN MONTEIRO
Brasileira na Bielorússia

A vida de um estudante na Europa

O aluno de Relações Internacionais da Univates, o venâncio-airense Gustavo Henrique Schuh, está realizando intercâmbio na Hradec Králové University, da República Tcheca, país da Europa Central. Ele enfatiza o medo após a invasão russa. “O maior medo hoje da população em geral é que, caso a situação se agrave e comece a envolver mais países e a guerra se alastrar, até porque a Rússia hoje não tem medo da utilização total de sua força bélica, até porque o presidente Putin já deixou claro, que para conseguir conquistar os interesses do governo russo, qualquer medida será cabível.”

A sensação do estudante é de, na Europa, o sentimento é de apreensão e apoio aos ucranianos. “Os relatos de russos a qual conversei até quinta-feira, 23, falavam que a ‘guerra’ não é coisa dos russos, e sim do partido que está ali presente. Os ucranianos também estão abismados com a situação, porque é quase que inacreditável na calada da noite acontecer ataques a qual ninguém estava esperando. A situação na Europa se mostra a favor da Ucrânia, ninguém até o momento relatou estar ‘torcendo” para a Rússia.”

(Foto: Divulgação)

Schuh chegou na República Tcheca dia 2 de fevereiro e irá permanecer até junho, estudando e morando na Europa. Baseado no futuro recente do país, onde foi aliado do governo soviético, o estudante conta que o país tem cuidado ao tomar suas decisões. “Sabendo um pouco do passado que já foi conturbado aqui, o governo entende que a situação é crítica e que envolve não só dois países, e sim o mundo todo. Alguns atos já tomados pelo governo Tcheco demonstraram que estão do lado da Ucrânia e que irão tentar ajudar o máximo possível. Por exemplo, foi autorizado a renovação de vistos de pessoas ucranianas, pois cerca de 60 mil ucranianos moram aqui.”

“Os relatos são de incerteza do que as consequências futuras podem causar com as pessoas, porque já estamos sofrendo em geral com a pandemia e agora mais uma guerra. As pessoas estão ficando completamente sem muita esperança em uma era de ‘paz’.”
GUSTAVO HENRIQUE SCHUH
Estudante de intercâmbio



Leonardo Pereira

Leonardo Pereira

Natural de Vila Mariante, no interior de Venâncio Aires, jornalista formado na Universidade de Santa Cruz do Sul e repórter do jornal Folha do Mate desde 2022.

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