Por Débora Kist e Taís Fortes
“Mal saímos de uma estiagem e a chuva também já é problema.” A frase do agricultor Mateus de Borba, que pode parecer irônica ou um tanto contraditória, é mais do que verdadeira e retrata bem o que o campo tem enfrentado em relação ao clima: excessos em diferentes épocas do ano (seja de sol, seja de chuva) e o consequente prejuízo em lavouras.
Ainda no fim do verão, as contas eram sobre a quebra agrícola devido à estiagem, principalmente nos grãos. Já neste inverno, a contagem tem sido para ver o que se desenvolve ‘mais ou menos’ e pode ser colhido. Nesse caso, as hortaliças estão entre as culturas que mais sofrem, como na propriedade de Borba, em Linha Armando, no distrito de Vila Arlindo, interior de Venâncio Aires.
Em uma rápida caminhada entre os camalhões, após aumento da precipitação nos últimos dias, o cenário é esse: muita água empoçada, irregularidade no crescimento (tamanhos diferentes e baixa produtividade), plantas condenadas devido ao apodrecimento das raízes e canteiros desbarrancados. “Dá para dizer que já tem uma quebra de 30%”, destacou o agricultor, que tem 36 anos.
Como parte dos 5,3 hectares da propriedade está em região de várzea, naturalmente mais ‘molhada’ e onde há irrigação através de um açude, nesta faixa Borba planta mais no verão, por isso não tem enfrentando tantos problemas com a estiagem. “No inverno, concentro as hortaliças na parte alta, mas, mesmo assim, a chuva está judiando.”
De forma geral, a chuva excessiva vem prejudicando todas as variedades, como couve-flor, rúcula, brócolis, temperos, beterraba, cenoura, tomate e até alface, planta que ‘gosta’ de água. Por isso, Borba revela que já está se organizando para fazer duas estufas (investimento de cerca de R$ 70 mil). “A agricultura ainda depende muito do clima e para a gente não ficar refém dele, precisa encontrar alternativas, fazer investimentos. Se eu conseguir fazer as estufas, consigo lidar melhor com a rúcula, pimentão e o tomate, por exemplo.”
Venda
O agricultor, que comercializa toda a produção dentro do município para restaurantes, supermercados e na Cooperativa dos Produtores de Venâncio Aires (Cooprova), conta que não é o único a reclamar da situação nos últimos dias, já que o consumidor final também ‘sente’ os impactos. “Infelizmente o pessoal tem se queixado do valor alto para um produto pequeno, que não se desenvolveu. Mas não tem como ter um produto normal, se o tempo não é normal.”
Média acumulada
• De acordo com dados do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), nos últimos 28 dias, considerando a captação de três estações pluviométricas do município, choveu uma média de 175 milímetros.
• Embora Mateus de Borba não considere o número um exagero, o problema, segundo ele, é a irregularidade da chuva, já que foram mais de 80 milímetros apenas em sete dias e é essa concentração maior em uma única semana que acaba afetando determinadas culturas, principalmente as hortaliças.
Falta de sol prejudica o desenvolvimento das plantas
A extensionista rural da Emater de Venâncio Aires, Djeimi Janisch, explica que todas as plantas precisam de sol para se desenvolverem. Isso porque ele é um dos principais ingredientes da fotossíntese, processo realizado pelas plantas para geração de energia. Por isso, uma sequência de dias de chuva pode baixar a qualidade delas e retardar o crescimento.
“Para uma fruta ser doce é preciso ter temperaturas amenas e sol”, comenta. Segundo a engenheira agrônoma, nos morangos, por exemplo, o excesso de chuva e dias nublados favorece o surgimento de doenças, como a botrytis, mais conhecida como podridão cinzenta. “A baixa luminosidade e a alta umidade do ar atrasam o desenvolvimento da fruta”, esclarece.
A profissional ainda observa que a safra de morangos foi afetada no período em que se paga mais pela fruta, tendo em vista a menor oferta dela no mercado. Com as hortaliças, a situação é bastante semelhante, porque também envolve o processo de fotossíntese. No caso desses produtos, a alta umidade favorece as doenças folheosas.
Na beterraba, por exemplo, podem surgir manchas nas folhas. No brócolis, na couve-flor e no repolho podem aparecer manchas arredondadas, as chamadas alternarias. Além disso, é comum acontecer a podridão das raízes em função do solo encharcado. Outra dificuldade vivenciada pelos produtores é a continuidade do plantio, que muitas vezes pode ser atrasado por causa das precipitações.
Cuidados
Mesmo sem ter números das perdas, Djeimi estima que as cultivares mais afetadas são o brócolis e a couve-flor. Diante dessa situação, a extensionista rural da Emater orienta os agricultores a manterem o ambiente arejado e protegido, através da higienização da cobertura plástica, intensificarem a limpeza de plantas e realizarem o manejo preventivo, por meio de produtos biológicos. “É importante prevenir o desenvolvimento dessas doenças”, complementa.
O chefe do escritório local da Emater, Vicente Fin, acrescenta que a ocorrência de muitos dias de chuva em sequência também causou um atraso no plantio do trigo, em razão do aumento da área de cultivo do grão. Além disso, ele menciona que a safra safrinha plantada mais tardiamente também sofreu prejuízos.
Segundo ele, são cerca de 450 hectares prejudicados, especialmente porque não deu para as máquinas entrarem na lavoura para fazerem a colheita em razão do solo muito úmido. De forma geral, Fin também avalia que a chuva dificulta o trabalho diário nas propriedades, como nos afazeres que envolvem o gado de leite e de corte.