A pandemia do novo coronavírus mudou a rotina do mundo. Com a propagação da Covid-19, foram suspensas as aulas, shows e todos os eventos onde havia aglomerações julgadas desnecessárias. Nas casas prisionais, as visitas foram suspensas e adotadas medidas para evitar uma contaminação da massa carcerária. Mas o que fazer para manter uma rotina prisional sadia e evitar que o vírus cause um mal ainda maior?
Na Penitenciária Estadual de Venâncio Aires (Peva), uma das alternativas que vem dando resultado é o incentivo à leitura – que é feito paralelo às atividades à distância do Núcleo Estadual de Educação de Jovens e Adultos (Neeja) Mário Quintana. Mensalmente, cada uma das quatro galerias, mais a ala dos trabalhadores, recebe uma caixa com livros dos mais variados títulos.
Para que tudo funcione, os profissionais têm responsáveis pela distribuição, cuidados e recolhimento dos livros. Como ganham remissão pelos dias trabalhados, um dos pré-requisitos é que sejam alunos do Neeja. “São os chamados facilitadores de leitura”, explica a psicóloga Gabriela Moysés Kilian.
Entre eles está um homem de 30 anos, morador de Estância Velha, que está na Peva desde setembro de 2016. A cada mês, ele recebe uma caixa com 20 livros e sua função é passar de cela em cela, oferecer, distribuir e anotar com quem ficou cada obra.
Cerca de quatro delas são lidas mensalmente por ele, que trabalha na faxina administrativa. “Mudei totalmente minha mente, depois que conheci meu gosto pela leitura, que adquiri aqui”, explica o apenado, que lê um livro por semana e é descrito pelas profissionais como um dos mais assíduos leitores.
Entre suas obras prediletas, estão as da literatura brasileira. Atualmente, está lendo Tieta do Agreste, de Jorge Amado. Interessado, refere que gosta da maneira como o escritor narra os fatos é desenvolve a história. “De todo o lado ruim de estar preso, o lado bom é que estou aprendendo muito nas aulas e através dos livros”, descreve ele, que é aluno do ensino médio do Neeja.
Em dezembro deste ano, o morador de Estância Velha tem direito a progressão do regime e espera começar uma nova vida. “Agora sei que realmente o conhecimento transforma a pessoa”, afirma. Questionado, preferiu não mencionar o crime que o levou para trás das grades.
Alunos interessados
De acordo com a psicóloga Gabriela, os apenados têm ao seu dispor mais de 2.300 obras. As mais solicitadas são de auto ajuda e de espiritismo. “Mas nossa biblioteca possui livros de literatura brasileira e estrangeira, entre muitos outros”, revela a diretora do Neeja, Mariela Borba.
A professora cita que além dos livros, 82 apenados da casa prisional – de uma massa carcerária que oscila em torno dos 530 presos – estudam no Neeja. Por conta da pandemia, as aulas presenciais foram suspensas, mas desde o dia 6 de julho, as atividades foram retomadas, no modelo à distância.
“A leitura me faz viajar e me permite fugir um pouco daqui.”
Interno da Peva – Facilitador de leitura
Semanalmente, os professores elaboram e entregam atividades, que são repassadas ao alunos. “E eles têm uma semana para fazer e devolver o conteúdo e a entrega está sendo de quase 100%”, avalia Mariela.
Satisfeita com os resultados, a diretora faz uma referência especial aos professores, “que mesmo não mantendo contato presencial com os alunos, seguem pesquisando e elaborando atividades criativas, dinâmicas e lúdicas.”
Os bons resultados também são comemorados pelo diretor da casa prisional. Fábio dos Santos Machado destaca que o trabalho conjunto entre educadores e a equipe técnica é que possibilita estes resultados.