Tenente-coronel Marconatto e major Michele Vargas (ex-comandante da BM de Venâncio): trabalho técnico (Foto: Divulgação)
Tenente-coronel Marconatto e major Michele Vargas (ex-comandante da BM de Venâncio): trabalho técnico (Foto: Divulgação)

Rio Grande do Sul e Venâncio Aires - O sonho de muita gente é residir em um município do interior, onde a criminalidade não esteja em descontrole e seja possível ter mais de tranquilidade, na comparação com cidades, por exemplo, da Região Metropolitana. Levando isso em consideração, é bem possível que Venâncio Aires – no ‘coração’ dos vales do Rio Pardo e Taquari – seja um destino escolhido: povo acolhedor e voluntário, emprego disponível e com saúde e educação dentro do que se entende como aceitável.

Um lugar, em tese, acima de qualquer suspeita, excelente para criar os filhos e que se desenvolve cada vez mais. Só que, ultimamente, muito se ouve falar em sensação de insegurança na Capital do Chimarrão, principalmente pelas ocorrências de furtos, muitas delas motivadas pela necessidade que usuários de drogas têm de manter vícios. As imagens de ladrões carregando aparelhos de TV, arrombando lojas ou pulando cercas e muros para cometer crimes têm se multiplicado.

As cúpulas da Polícia Civil e Brigada Militar, quando questionadas sobre os efetivos muito aquém do ideal, argumentam que, embora saibam que o município carece de mais agentes de segurança, há outros tantos em situação ainda pior. E assim a comunidade vai se conformando e convivendo com uma realidade que, talvez, não tenha conhecimento: Venâncio Aires está entre os municípios do Rio Grande do Sul com os maiores índices de furtos quando comparado o número de ocorrências com o total de habitantes.

Até o fim de setembro, conforme dados disponibilizados pela Secretaria de Segurança Pública (SSP), 757 furtos foram registrados na Capital Nacional do Chimarrão. Talvez o dado não cause alarme inicialmente, no entanto, quem faz o cálculo, se dá conta de que são aproximadamente 85 crimes por mês – ou quase três por dia, sem contar aquelas ocorrências que não chegam à Delegacia de Polícia. Números que colocam o município na 18ª colocação no estado no ranking dos furtos, crimes de menor potencial ofensivo, sem grave ameaça.

Só que, ao comparar o total de furtos com o número de habitantes, o problema salta aos olhos, com Venâncio Aires aparecendo na quarta posição, atrás apenas de Porto Alegre, Tramandaí e Capão da Canoa. Uma é a capital do estado, onde a população alcança 1,3 milhão de habitantes, e as outras duas são cidades do Litoral Norte, onde os crimes estão diretamente ligados a residências que ficam fechadas e à temporada de veraneio, quando o número de pessoas circulando dispara – e, em razão disso, as ocorrências também.

Crimes diretamente relacionados ao tráfico

Mas, afinal, o que explica esse número expressivo de furtos no município, tanto na área urbana quanto no interior? De acordo com o comandante do 23º Batalhão da Polícia Militar (BPM), tenente-coronel Cristiano Cuozzo Marconatto, o aumento de ocorrências de furto está diretamente ligado às recentes ofensivas das forças de segurança, tanto em Venâncio Aires quanto em outras cidades da região, que resultaram em várias prisões e apreensões relacionadas ao tráfico de drogas.

“Não vamos admitir que essas ordens sejam dadas por esse tipo de gente. Isso vem em prejuízo à comunidade de Venâncio Aires e o nosso dever é devolver a situação de normalidade. Se tem alguém que pode ganhar esse jogo são as forças de segurança.”

CRISTIANO MARCONATTO
Comandante do 23º Batalhão
da Polícia Militar (BPM)

“Recentemente, tivemos vários crimes contra o patrimônio, inclusive roubos a pedestres, roubos de veículos e arrombamentos, alguns praticados até mesmo com violência. E a gente sabe que a situação tem relação com o tráfico”, reforça. No caso da série de crimes na Capital do Chimarrão, o oficial afirma que há ordens de dentro da Penitenciária Estadual de Venâncio Aires (Peva), em Vila Estância Nova, para que integrantes de grupos criminosos atuem no sentido de ‘levantar dinheiro’.

Identificação

Conforme Marconatto, o Setor de Inteligência da Brigada Militar, em parceria com a Polícia Civil, trabalha para identificar as principais lideranças de grupos e facções detidas na Peva e tomar as medidas cabíveis, seja aumentando as penas de quem já está recluso ou prendendo quem está atuando nas ruas. “No momento, estamos dando maior ênfase a Venâncio Aires, onde notamos um aumento nos crimes de roubos e furtos praticados no mês de outubro. Isso não será admitido”, reiterou.

Estatísticas

  • Dados da Secretaria de Segurança Pública (SSP) mostram que, entre os dias 1º de janeiro e 30 de setembro deste ano, foram registrados 80.223 furtos nas delegacias de Polícia do Rio Grande do Sul.
  • No mesmo período, 746 pessoas foram vítimas de homicídios, houve 24 latrocínios e 803 pessoas morreram em acidentes de trânsito nas ruas e rodovias gaúchas.
  • Em Venâncio Aires, 757 pessoas comunicaram que tiveram suas casas, propriedades ou estabelecimentos invadidos, com prejuízos decorrentes das investidas.
  • Nos crimes contra a vida, há sete casos no ano (um latrocínio). No trânsito, 12 pessoas morreram nas ruas e rodovias da Capital do Chimarrão.

Ousadia

Era por volta das 16h do dia 27 de outubro, quando uma aposentada chegou em casa, no bairro Cidade Alta, e notou que a porta da garagem estava entreaberta. Imaginou que sua filha pudesse estar na residência e a chamou, mas não escutou resposta. Foi entrando e viu um vulto saindo do quarto da filha, mas notou que não era ela.

Já imaginando o que poderia ser, a mulher se deparou com um ladrão dentro de casa, mas não se intimidou. Gritou e viu ele sair em disparada. As imagens das câmeras de segurança mostram ele empurrando e fugindo por uma brecha do portão eletrônico.

As imagens também revelam que o criminoso estava acompanhado de um comparsa, que passou em frente à residência, observou a movimentação e ajudou a escolher o alvo. Um detalhe: os dois carregavam sacos plásticos nas costas, como se fossem catadores de materiais recicláveis. A aposentada só não teve prejuízo porque impediu o ladrão de levar os objetos que já estavam separados. Havia sacolas com joias, perfumes, calçados, roupas e outros objetos.

Mas não é só a área central que é vítima frequente de furtos. Na tarde do dia 29 de outubro, ladrões invadiram uma casa na localidade de Linha Grão-Pará Baixo. Arrombaram uma janela e furtaram tudo o que foi possível. Três dias depois, também durante a tarde, a mesma propriedade voltou a ser atacada.

Um galpão foi invadido e um motor d’água furtado. Os ladrões ainda separaram outros objetos, mas não conseguiram levá-los. De semelhante com os furtos na cidade são os indivíduos com sacos plásticos, passando-se por catadores.

Ocorrências e índice por habitante