Nos últimos tempos, mais um golpe vem causando dor de cabeça para aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Trata-se do golpe do crédito consignado, que é acionado sem a permissão do contribuinte e, mensalmente, ocorrem descontos das parcelas nas contas bancárias.
Na semana passada, o deputado federal Heitor Schuch (PSB/RS) denunciou a prática e entregou à Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara Federal um dossiê com mais de 70 páginas contendo relatos de casos de abusos no crédito consignado envolvendo aposentados e pensionistas rurais de todo o Brasil.
Os casos também estão ocorrendo em Venâncio Aires. Um deles foi com o industriário e produtor de Linha Santana, Valdir König, 65 anos, que fez questão de ser identificado para alertar a comunidade sobre o novo golpe. Ele conta que só percebeu o prejuízo quando foi tirar um extrato da conta para fazer a declaração de renda. “Logo fui ao STR pedir uma orientação. Depois, fui no Procon e fiz o registro da ocorrência. Agora, vou acionar o jurídico, não admito ser lesado dessa forma”, desabafa.
O produtor diz que teve cinco empréstimos consignados acionados na conta sem autorização. Foram três em 2020 e dois em 2021, todos indevidos, assegura. “Além disso, tive dois cartões de crédito que são descontados cerca de R$ 200 todo mês, de cada um, sendo que nunca os vi, nem assinei e muito menos aprovei nada”, comenta König. O produtor já fez o bloqueio do seu cadastro do INSS no Sindicato dos Trabalhadores Rurais e irá procurar ajuda para resolver o problema e escapar do prejuízo, que ainda não foi calculado.
Outro agricultor lesado, que preferiu não se identificar, percebeu o golpe em 2018. “Quando fui ver, do meu um salário mínimo da aposentadoria, tirei R$ 230,00. O resto pegaram tudo”, lamenta o morador de Linha Estrela. “Eu sei de mais cinco vizinhos que foram prejudicados. Já perdi mais de R$ 30 mil com esse golpe, tá rolando na Justiça, vamos ver se consigo meu dinheiro de volta”, acrescenta.
Dossiê
O documento entregue por Schuch foi produzido pela Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais e Agricultores Familiares (Contag) e repassado ao presidente da comissão, Celso Russomano (Republicanos/SP). Reúne extratos de contas bancárias, comprovantes de depósitos e descontos indevidos e boletins de ocorrência (BOs) registrados pelas vítimas do golpe. “É um assunto extremamente preocupante e as denúncias aumentaram muito nas últimas semanas, de pessoas que receberam valores na conta bancária sem sequer pedirem ou autorizarem, e só foram se dar conta disso quando as parcelas começaram a ser descontadas”, alerta Schuch.
O dossiê também já foi repassado ao presidente do INSS, Leonardo Rolim, apontando indícios de violação de dados pessoais cadastrados no sistema Meu INSS – como senha, e-mail e telefone – que foram alterados de forma a permitir o desbloqueio do benefício previdenciário para o desconto de parcelas do crédito consignado sem permissão dos aposentados e pensionistas. A outra prática ilegal identificada, os depósitos indevidos a titulo de empréstimo consignado, segundo os relatos, envolvem diversas instituições financeiras, mas chama atenção a situação do Banco C6 Consignados, que concentra o maior número de reclamações.
O deputado federal também já conversou com o presidente Rolim, pedindo providências urgentes. “Os transtornos enfrentados pelos agricultores lesados são enormes, agravados pelo fato de no meio rural nem sempre poderem contar com sinal de internet e telefonia de qualidade”, destaca Heitor Schuch.
Em entrevista ao Terra em Uma Hora, da Rádio Terra FM, na terça-feira, 18, o deputado falou da denúncia e trouxe casos de pessoas que encaminharam seu requerimento de aposentadoria em um dia e, na semana seguinte, já receberam um comunicado virtual de um banco dizendo que depositou um valor a título de crédito consignado. “Já temos pessoas da nossa região, do estado e país denunciando a prática na Delegacia de Polícia Civil, através de boletim de ocorrência. Ninguém é contra o crédito consignado, desde que a pessoa queira, autorize e que tenha um contrato, o que não está ocorrendo”, argumenta.
“Isso é uma máfia. Me sinto lesado, prejudicado por algo que nunca acionei. Meu conselho é que se for vítima, procure o STR, o Procon e preste queixa.”
VALDIR KÖNIG – Agricultor aposentado
Fetag-RS e STR alertam aposentados e pensionistas
O presidente do STR, Claudio Fengler, comenta que cerca de 15 pessoas por mês procuram a entidade alertando que foram lesadas. “Há casos de pessoas que nunca sequer fizeram um consignado. Outros fizeram uma vez e, depois de um tempo, outros são acionados sem autorização”, cita.
15
é o número médio de vítimas do golpe que procuram o Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR) mensalmente em busca de ajuda.
Fengler também esclarece que outros aposentados nem chegaram a receber a primeira parcela da aposentadoria e já tiveram o crédito consignado acionado. “São bancos de longe, às vezes de São Paulo, Rio de Janeiro, outros desconhecidos”, acrescenta. “Já percebemos que muitas vezes a parcela é baixa e, muitas delas, tivemos casos de até oito anos. Assim, fica mais difícil da pessoa perceber o desconto na conta bancária”, salienta Fengler.
Orientação
A auxiliar do Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR), Adriana Becker, orienta que os agricultores procurem o sindicato e, depois, o Procon. “Nosso conselho é que as pessoas acompanhem suas contas, tirem extratos bancários mesmo que não movimentem as contas. E realizem o bloqueio, para assim evitar futuros problemas”, afirma.
A Federação dos Trabalhadores na Agricultura no Rio Grande do Sul (Fetag-RS) realizou uma reunião com as Regionais Sindicais e com os Sindicatos dos Trabalhadores Rurais, na última semana, para discutir os problemas que estão sendo enfrentados por aposentados e pensionistas do INSS que estão recebendo depósitos indevidos em suas contas.
Fengler destaca que, na reunião, foram passadas aos participantes orientações sobre como auxiliar os aposentados e pensionistas que foram lesados. “Existem relatos de pessoas que tiveram 16 créditos consignados concedidos sem autorização”, cita o presidente do STR.
Devido aos diversos problemas evidenciados, a Fetag-RS e os Sindicatos dos Trabalhadores Rurais seguirão fazendo uma campanha de alerta e de orientação, além de propor medidas urgentes, inclusive judiciais para o enfrentamento dos problemas.
A Fetag-RS em nota, informou que considera a situação como de extrema gravidade, pois, para conseguir liberar o crédito, o sistema Meu INSS está sendo invadido, o que coloca em risco os dados pessoais e traz inúmeros transtornos para os aposentados e pensionistas. “Por isso, continuamos alertando os aposentados para que fiquem atentos, principalmente os que não retiram sua aposentadoria todo mês. Lembramos que continuamos fazendo o bloqueio para, assim, evitar futuros problemas. Qualquer dúvida, podem procurar o sindicato”, finaliza Fengler.
“Precisamos alertar nossos agricultores e ficar atentos. Qualquer pessoa pode ser vítima. Aqueles que quiserem evitar o problema, procurem o STR que faremos o bloqueio no site.”
CLAUDIO FENGLER – Presidente do STR
Ocorrências
- O delegado de Polícia Vinícius Lourenço de Assunção comenta que o golpe tem sido bastante comum. “Nós temos um número bastante expressivo de ocorrências relativas ao golpe do crédito consignado. Muitas pessoas são encaminhadas pelo Procon da nossa cidade. Elas encontram um valor depositado na conta bancária que não as pertence, só que, posteriormente, elas têm um valor a pagar, pois foi feito um crédito”, esclarece.
- Conforme o delegado, a orientação é de que a pessoa lesada vá ao Procon e também faça o registro na Delegacia. “Só assim conseguimos investigar o que está acontecendo. Esse golpe tem sido bastante comum. Nós suspeitamos que possa ter a participação de algum intermediário que participe dessas ações”, explica.
Projeto
• O deputado federal Heitor Schuch (PSB/RS) protocolou projeto de lei (PL 1892/2021) na Câmara Federal proibindo as instituições financeiras de contratarem empréstimo por telefone para aposentados e pensionistas. Conforme a proposta, essas operações devem ser realizadas mediante a assinatura de contrato, com apresentação de documento de identidade, não sendo aceita autorização dada por telefone e nem a gravação de voz como é possível atualmente.
• O objetivo, justifica o deputado, é impedir a prática de ações criminosas recorrentes envolvendo o crédito consignado. O projeto de Schuch determina que a celebração de contrato de empréstimo por canal não presencial obriga a instituição financeira a enviar as condições por e-mail, e em caso de impossibilidade, por via postal ou outro meio físico. Em caso de descumprimento, estabelece multa de cinco salários mínimos, e no caso de reincidências, o valor será sempre dobrado até o limite de 50 salários mínimos.
“É um horror o que está acontecendo. As pessoas encaminham o processo de aposentadoria e, antes mesmo de receberem, já tem um crédito consignado na conta deles, que eles nem sabem, ninguém autorizou. Sem falar no verdadeiro assédio por telefone, com ligações o dia inteiro, oferecendo empréstimos. Ninguém é contra o crédito consignado, desde que a pessoa autorize por escrito”.
HEITOR SCHUCH – Deputado federal