Ireneu Lenz, o ‘quase’ prefeito de Venâncio Aires

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Neste domingo, 15, o corredor que leva ao Gabinete do Prefeito de Venâncio Aires pode permanecer como está ou ganhar uma foto a mais. Tudo depende de quem sairá vencedor entre Giovane Wickert (PSB), que concorre à reeleição, e Jarbas da Rosa (PDT) que, se eleito, fará com que Wickert já ganhe um quadro entre os ex-prefeitos.

Nessa galeria há rostos que podem até não ser conhecidos de muitos venâncio-airenses, mas os nomes estão em ruas, praças e escolas. Figuras públicas que governaram o município durante algum tempo, seja por meses ou até quatro mandatos, e estão eternizados no prédio principal da Prefeitura.

O que talvez as gerações mais novas não saibam, é que essa mesma galeria já poderia ter tido um quadro extra, pendurado há mais de 40 anos, quando um candidato fez mais votos que o vencedor. Se o processo eleitoral fosse como é hoje, Ireneu Lenz teria sido eleito prefeito em 1976.

“Eu queria governar, não pagar promessas”

Quinhentos e oito votos. Em 1976, foi essa ‘imensa’ diferença que fez de Ireneu Lenz, candidato da Arena à Prefeitura, ser o mais votado. Ainda assim, as centenas de votos a mais não foram suficientes e Alfredo Scherer acabou eleito para aquele que seria o último de seus quatro mandatos.

Mas para entender esse ‘parênteses’ na história política de Venâncio Aires, é preciso considerar que o sistema eleitoral era outro há mais de quatro décadas. Devido ao chamado bipartidarismo (veja box), a soma final considerava os votos recebidos pelos partidos (Arena ou MDB).

Há 44 anos, a Arena venâncio-airense lançou dois candidatos: Lauro Büchner e Ireneu Lenz. Já o MDB teve três: Salvador Stein Goulart, Plínio Luís da Silva e Alfredo Scherer. Como o MDB somou mais votos (10.219 contra 8.850), Scherer, o mais votado na sua sigla, acabou eleito.

“Como um rapaz como eu teria condições de fazer mais votos que o Alfredo Scherer?” A pergunta Ireneu Lenz se fez muitas vezes, quando se lançou candidato a prefeito, com apenas 37 anos, frente a Scherer, então com 67 anos. Em 1976, Lenz diz que sua candidatura foi uma ‘imposição’ da Arena. “Pediram para me candidatar. Na verdade fui quase obrigado”, lembra.

Segundo ele, o partido buscava um nome ‘forte’ para substituir Rony Mylius, eleito em 1972. “Eu era muito conhecido no município, pelo meu trabalho na Caixa Estadual. Nas ruas, muitas pessoas comentavam de mim e acho que por isso fui o escolhido.”

Pela primeira vez concorrendo à Prefeitura, Lenz conta que em sua campanha não prometeu obras, mesmo em tempos de uma cidade que ainda ‘engatinhava’ em infraestrutura. Segundo o aposentado, se ele tivesse prometido ‘mundos e fundos’, sua eleição seria uma ‘barbada’. “Eu queria governar o município e não ser um pagador de promessas. Peço desculpas aos que votaram em mim, que talvez esperassem minha eleição. Mas não fiz promessas, nem artimanhas, e por isso não fiz mais votos.”

Comício

Ireneu Lenz conta que não prometeu grandes obras, mas uma promessa foi feita durante um comício para centenas de pessoas, em um antigo galpão que até rinhadeiro já tinha sido, próximo ao Colégio Oliveira Castilhos. “Tinha muito funcionário da Prefeitura naquela noite e disse que não haveria perseguição. Minha única cobrança seria na conduta. Não aceitaria que dançassem tango quando tocasse uma valsa. Acho que ali conquistei a confiança de muita gente.”

Edição da Folha do Mate de 17 de novembro de 1976 destaca a vitória do MDB

História

Ireneu Lenz é natural de Linha Travessa e, aos 24 anos, decidiu concorrer pela primeira vez a um cargo político. Em 1963, se lançou candidato a vereador, pelo extinto Partido de Representação Popular (PRP). Com 214 votos, ficou na suplência da Câmara.

Lenz conta que o partido tinha a militância do pai, Willibaldo, sócio da fábrica de sabão que foi a origem do Supermercado Lenz. Pela questão partidária, o patriarca era opositor de Alfredo Scherer.

Mas essa oposição política dos Scherer virou aliança em 1996, quando Ireneu foi candidato a vice-prefeito de Milton Deves (do então Partido Progressista Brasileiro – PPB). A campanha dos dois foi apoiada por Gleno Scherer, ex-deputado estadual, filho de Alfredo.

Durante um comício em Linha Travessa, Ireneu Lenz lembra que brincou com a situação. “Eu, nanico do lado do Gleno, olhei para ele, bem mais alto, e perguntei: o que será que nossos pais estão pensando disso ‘lá em cima’?”

Além de 1963 para vereador, 1976 para prefeito e 1996 como vice, Ireneu Lenz ainda concorreu a prefeito em 1982. Na época, pelo Partido Democrático Social (PDS), fez 4.885 votos. O eleito daquele ano foi Almedo Dettenborn (MDB), que assumia o primeiro de seus três mandatos.

Da junta governativa aos prefeitos

A galeria de ex-prefeitos não está completa em imagens, até porque fotografia era artigo de luxo e alguns nomes permaneceram no posto por pouquíssimo tempo.

Ao longo da história, a Administração foi formada unicamente por homens e tudo começou com a junta governativa formada por Rupperti Filho, Coronel Agra e Henrique Mylius (que dão nome a três ruas paralelas do centro da cidade). O trio atuou de 11 de maio de 1891 (quando ocorre a instalação da Câmara Municipal) a 12 de dezembro de 1892.

A partir deles, o município teve coronéis, intendentes e interventores. Alguns nomeados nem tinham relação com a cidade, outros assumiram por meses e até presidentes da Câmara ficaram por certos períodos. Já o termo ‘prefeito’ foi adotado quando Getúlio Vargas assume a presidência, em 1930.

Em Venâncio, o primeiro eleito de forma popular foi Alfredo Scherer, em 1951. No entanto, segundo a historiadora Angelita da Rosa, é preciso destacar o que era considerado ‘voto popular’ na época, já que, durante muito tempo, a política foi feita apenas por homens brancos que eram ricos.

Nomes

Conforme Angelita da Rosa, de 1891 até agora, os nomes que estiveram à frente da Administração foram: Rupperti Filho, Coronel Agra, Henrique Mylius, Antônio Azambuja Villa Nova Filho, Ismael Marques da Costa, Antônio Quindauva Vila Nova, Antônio Berlim da Cruz, Narciso Mariante de Campos, Thomaz José Pereira Junior, João Luís Ferreira de Brito, Jacob Becker, José Ferreira Silva Júnior, Arthur da Rocha, Vicente Schuck, Gaspar dos Reis, Flavio Menna Barreto de Mattos, Carlos Júlio Sperb, Hermilo Gallant, Hermes Jorge Pereira, Pedro Abott Romero, Alfredo Scherer, Salvador Stein Goulardt, Rony José Myllius, Almedo Dettenborn, Glauco Scherer, Celso Artus, Airton Artus e Giovane Wickert.

Vale ressaltar que aqui não foram considerados presidentes mais recentes do Legislativo, que assumem a Prefeitura por poucos dias quando prefeito e vice estão fora por qualquer motivo.

Galeria do ex-prefeitos está no prédio principal da Prefeitura (Foto: Leandro Osório/AI Prefeitura)

Você sabia?

No ano que Lenz concorreu pela segunda vez a prefeito, 1982, foi o início da trajetória de Paulo Mathias Ferreira (MDB) no Legislativo. Ele, que foi eleito para sete mandatos, foi vereador por 30 anos e hoje, aos 61, diz que não pretende mais concorrer. Na história política de Venâncio Aires, ele carrega outra marca: a de vereador mais votado. Isso aconteceu em 1996, quando fez 2.074 votos.

A evolução do voto

Pode parecer estranho, mas se vota no Brasil desde o período colonial. Claro que até o início do século XX havia muitas limitações, como nível de renda, gênero e analfabetismo. Todos eram fatores que impediam grande parte das pessoas de votar.
“Também havia formas de pressão escancarada em favor dos coronéis. Mulheres puderam votar somente a partir de 1932, analfabetos somente a partir de 1988. A partir de 1945, ampliaram-se as condições de participação eleitoral, mas havia algumas diferenças em relação a hoje”, destaca o professor e cientista político, João Pedro Schmidt.

Bipartidarismo

O professor João Pedro Schimidt explica que durante a ditadura militar foram permitidos apenas dois partidos: Arena (situação) e MDB (oposição).

A Arena foi constituída pelas forças que apoiaram a ditadura, reunindo lideranças do PSD, UDN, PDC e PR. Já o MDB foi formado basicamente por lideranças provenientes do PTB e todos os outros de oposição ao regime militar.

Na prática, não se podiam ter vários partidos, mas os partidos podiam ter vários candidatos. Depois somava-se os votos e vencia o candidato mais votado da sublegenda.

Mas o que era a sublegenda? Um partido podia apresentar até três candidatos ao mesmo cargo majoritário (prefeito, governador e senador). Havendo mais de um candidato por partido para um cargo, na apuração somava-se os votos obtidos pelos candidatos do partido, e a soma frequentemente superava os votos do partido adversário.

Esse sistema foi extinto em 1986. “A interferência dos governos militares nas regras eleitorais deu-se de várias formas, sempre em vista da sobrevivência do regime, que vinha perdendo espaço nas eleições da década de 1970”, explicou Schmidt.

Seis anos

Entre a década de 1970 e 1980, houve momentos de mandatos ‘alongados – 6 anos ao invés de 4. Segundo a historiadora Angelita da Rosa, isso aconteceu com a reabertura política brasileira. “Em 1980 começa o processo de anistia dos presos políticos do Brasil e a criação de novos partidos, como o PT, e a saída da clandestinidade de outros, como o PTB, criado por Getúlio Vargas. Nesse momento seria complicado fazer eleição e fazem um mandato tampão de mais dois anos.” Por isso, depois da eleição de 1976, os pleitos seguintes aconteceram em 1982 e 1988.

E o futuro?

Até 1988, ano da Constituição, o sistema eleitoral brasileiro teve muitos formatos, particularidades, imposições e até improvisos, tudo que faz parte da História e de quem a conduz.

No formato atual, os cargos do Executivo têm mandato de quatro anos, sendo possível uma reeleição. Além disso, com a Constituição, a eleição para cargos majoritários – prefeito, governador, senador e presidente da República – obedece à formação de uma única chapa por partido ou coligação, sendo vitoriosa a chapa com mais votos. Doze anos antes, quando Ireneu Lenz concorreu pela primeira vez à Prefeitura, a conta não era assim.

Mas, o ‘quase’ prefeito de Venâncio Aires afirma que nunca teve frustração quanto a isso e que “se Deus assim quis, está tudo bem.” Para o futuro, a poucas semanas de completar 82 anos, o experiente cidadão e conhecedor da histórica política, deixa um recado para quem sairá vencedor nas urnas amanhã, entre Giovane Wickert e Jarbas da Rosa. “Que se relacione com a sociedade de Venâncio com propriedade das necessidades e confiança mútua para trabalhar.”



Débora Kist

Débora Kist

Formada em Comunicação Social - Jornalismo pela Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc) em 2013. Trabalhou como produtora executiva e jornalista na Rádio Terra FM entre 2008 e 2017. Jornalista no jornal Folha do Mate desde 2018 e atualmente também integra a equipe do programa jornalístico Terra em Uma Hora, veiculado de segunda a sexta, das 12h às 13h, na Terra FM.

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