No próximo concurso que realizar, a Prefeitura de Venâncio Aires terá que reservar 10% das vagas para negros e outros 10% para pessoas com deficiência. Na sessão de segunda-feira, 14, ocorrida em Vila Deodoro, os vereadores aprovaram os projetos de leis números 089/2019 e 156/2019 – os dois de autoria do Executivo e que tratam das reservas de vagas. As cotas para os negros passaram por 8 a 6, já para deficientes de forma unânime. As legislações devem ser sancionadas pelo prefeito Giovane Wickert nos próximos dias.
Antes da votação, teses favoráveis e contrárias às cotas para negros foram apresentadas na tribuna. Integrante da ONG Alphorria – responsável pela sugestão do projeto de reserva de cotas -, Luciane da Silva Conrad abordou a necessidade de se buscar a igualdade entre as pessoas, destacando que a reserva de cotas não é um privilégio. “Não é uma entrada pela porta dos fundos, é um direito. Hoje, é fácil encontrarmos negros garis e em funções subalternas, mas onde estão os negros em cargos de primeiro escalão”, questionou ela.
O contraponto foi apresentado por Arthur Wickert, representante do Movimento Direita dos Vales. Ele defendeu que as cotas não devem ser asseguradas nos concursos públicos, pois neste momento, os candidatos já tiveram a oportunidade de se capacitar. “Aprovar este projeto é recuperar a tese de que a sociedade se divide em raças, além de sinalizar que os favorecidos têm menos capacidade que os outros. Precisamos investir em educação básica e acabar com esta demagogia das cotas de uma vez por todas”, declarou.
VOTAÇÃO
A votação do PL 089 (cotas para negros) foi demorada, pois a maior parte dos vereadores optou por adiantar a decisão. Quando o presidente Eduardo Kappel (PL) colocou a matéria em votação, foram oito votos favoráveis – Ana Cláudia do Amaral Teixeira e Sid Ferreira, ambos do PDT; Gilberto dos Santos e Clécio Espíndola, o Galo, ambos do PTB; Diana de Azeredo e Sandra Wagner, ambas do PSB; Zé da Rosa (PSD); e Izaura Landim (MDB) – e seis contrários – Tiago Quintana (PDT); Ciro Fernandes (PSC); André Puthin e Helena da Rosa, ambos do MDB; Ezequiel Sthal (PTB); e Nelsoir Battisti (PSD). O presidente, que só votaria em caso de empate, fez questão de dizer que é contrário à reserva de cotas. Na sequência, o projeto 156 (reserva de cotas para deficientes), foi aprovado por unanimidade.
CONCURSO
De acordo com informações da Secretaria de Administração, a Procuradoria Jurídica do Município estava aguardando o resultado das votações, na Câmara, para concluir a elaboração do edital para o concurso público previsto para ocorrer ainda este ano. Com as situações definidas, a Procuradoria e a Administração vão fazer os ajustes necessários no edital e providenciar o lançamento, para que as empresas interessadas em administrar o processo seletivo se habilitem à licitação. A previsão é de pelo menos 30 a 40 dias para a definição da empresa responsável pelo certame. Caso haja recursos, o tempo pode ser ainda maior. Já se especula que as provas do concurso não sejam realizadas ainda em 2019.
O QUE DISSERAM
- “Só haverá justiça no país se houver distribuição de renda e mais segurança. Precisamos ter oportunidades iguais para oferecer. A maior parte da população brasileira é formada por negros e precisamos, urgentemente, de políticas afirmativas. A pessoa pode ser muito pobre, mas se for negra, será mais pobre ainda, pois primeiro se olhar a cor e, depois, a conta bancária. A cor da pele determina para a sociedade quem a pessoa é. O Rio Grande do Sul é o estado mais racista do Brasil, e Venâncio Aires, acreditem, está entre os 20 municípios mais racistas do estado.”
Izaura Landim, vereadora do MDB, que votou a favor das cotas para negros - “A reserva de vagas ocorre na Europa e nos Estados Unidos. Portanto, estamos apenas inserindo Venâncio Aires neste cenário mundial de busca pela igualdade. Precisamos ir além da experiência individual e dos achismos e defender as políticas de reparação. A prova de competência dos negros é eles estarem aqui, unidos, para esta luta justa. Queremos ver os negros em cargos mais bem remunerados na Prefeitura, nas funções de alto escalão.”
Diana de Azeredo, vereadora do PSB, que votou a favor das cotas para negros - “Metade da população brasileira, pelo menos, é de negros. Não há dúvidas de que precisamos buscar a inclusão das minorias. Temos que ter responsabilidade em relação ao que falamos e propagamos. A política afirmativa tem de continuar enquanto houver a desigualdade. Ela pode não ser eterna, pode vir a ser extinta, mas enquanto tivermos a constatação da desigualdade tem de ser garantida.”
Ana Cláudia do Amaral Teixeira, vereadora do PDT que votou a favor das cotas para negros - “Respeito a posição de cada um, mas temos que defender o que é nossa convicção. É uma luta para o bem coletivo, que contempla aqueles que realmente precisam e merecem. Temos aqui na região os exemplos de Vera Cruz e Santa Cruz do Sul, municípios que já aprovaram projetos de reserva de cotas. Não é esmola para tirar o lugar dos outros, é direito e reparação.”
Sid Ferreira, vereador do PDT que votou a favor das cotas para negros - “Foi a matéria que tive mais dificuldade, até hoje, de formar convicção. Não estou votando para agradar ou desagradar, fazer pessoas tristes ou felizes. Me ative ao mérito do projeto e penso que não podemos analisar se há ou não racismo e discriminação. Precisamos ver se o que estamos votando contribui para a erradicação do racismo e da discriminação. A cor da pele não deve servir de diferença para nada. Estamos falando de grupos que se encontram em posições diferentes na sociedade. O racismo e a discriminação não estão entranhados no nosso DNA e, se não é físico, pode ser mudado. Penso que temos que oferecer a oportunidade no ponto de partida, que é a educação básica e também a universidade. Não podemos contemplar a chegada, pois isso pode estimular ainda mais o ódio entre as pessoas. E deixo um recado aos racistas: não comemorem o meu voto, pois vocês não me representam e eu não represento vocês. Vocês são a escória.”
Tiago Quintana, vereador do PDT que votou contra as cotas para negros - “Disseram que eu tinha ficado no muro na semana passada, mas na verdade o que eu queria, e vejo que mais colegas também precisavam, era ter mais tempo para buscar conhecimento a respeito desta proposição. Falei com as pessoas e encontrei muitos negros contrários às cotas, que dizem que as pessoas não podem ser vistas de forma diferente. Não podemos enxergar as pessoas de maneira diferente, nem oferecer tratamento diferente. Temos que fazer as políticas para as pessoas, para os seres humanos. Precisamos mudar e tentar mudar quem está na nossa volta.”
Nelsoir Battisti, vereador do PSD e que votou contra as cotas para negros - “Infelizmente o assunto virou para o lado do racismo. Deixamos de lado o fato de que a própria Constituição diz que somos todos iguais perante a lei. Estamos dividindo as pessoas e, isso sim, é preconceito. Cor da pele não mede capacidade e não podemos conceder privilégios para brancos, negros ou pardos. Este projeto das cotas é doloroso, mas na minha opinião o concurso público tem que ser por ordem de classificação. Se aprovarmos, estaremos tirando o lugar de alguém, sim. A prova e a nota não são visuais, elas vêm por meio do conhecimento adquirido.”
Helena da Rosa, vereadora do MDB, que votou contra as cotas para negros - “Penso que não há desigualdade quando as pessoas têm o mesmo estudo. Se chegaram para disputar os cargos, é porque tiveram as mesmas oportunidades. Precisamos pensar em organizar o acesso à universidade. Com a reserva de cotas, não estamos garantindo que o um branco com muitas oportunidades dará lugar a um negro sem condições. Um candidato nada mais é do que um número e uma nota. Se pensarmos dessa forma, teremos que levar em consideração que os alemães vieram para cá com a promessa de terras férteis e bom vinho e foram largados no meio do mato, para desbravar.”
Ezequiel Stahl, vereador do PTB, que votou contra as cotas para negros - “É um tema extremamente polêmico. Tenho um caso na família e, quando perguntam ‘tu entrou na cota?’, a pessoa responde ‘não, entrei na raça’. Esta mesma pessoa vive dizendo que só não abandona o cargo porque precisa trabalhar, mas que se arrepende amargamento de ter feito concurso como cotista. Afirma que é o maior constrangimento da vida dela, que se pudesse, voltaria atrás.”
Ciro Fernandes, vereador do PSC, que votou contra as cotas para negros - “Já tive um sócio negro, dei oportunidade a ele e, hoje, é dono do próprio negócio.”
Gilberto dos Santos, vereador do PTB, que votou a favor das cotas para negros
Importante: Zé da Rosa (PSD), Clécio Espíndola, o Galo (PTB), Sandra Wagner (PSB), André Puthin (MDB) e Eduardo Kappel (PL) não se manifestaram no período de discussão do projeto.