A previsão é que, em 2029, o total de brasileiros com mais de 60 anos ultrapasse, pela primeira vez, a quantidade daqueles até 14 anos, aponta o IBGE
A previsão é que, em 2029, o total de brasileiros com mais de 60 anos ultrapasse, pela primeira vez, a quantidade daqueles até 14 anos, aponta o IBGE

Venâncio Aires é hoje um dos possíveis retratos do Brasil do futuro. Não pelo avanço tecnológico e nem pela integração de diferentes etnias, que torna a cidade um símbolo em solidariedade. O que a torna futurista é o fato de concentrar uma população cada vez mais idosa e aposentada. Atualmente, 14,3% da população, estimada em 71.117 habitantes, – de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – possui mais de 60 anos. Acima da média brasileira, que no ano passado foi de 13%.

Basta dar uma volta nas principais ruas e nas praças centrais da cidade para constatar que são muitas as pessoas de mais de 60 anos que circulam nesses espaços diariamente. Embora a cidade tenha um Produto Interno Bruto (PIB) per capita 20% acima da média nacional – alcançando R$ 39.533,53 -, a cidade já enfrenta os desafios de uma população que se torna cada dia mais velha e acumula um grande número de aposentados.
O município tem uma cobertura de 64% de atenção primária na saúde, realizada em 26 unidades básicas, e algumas especialidades de média complexidade, atendidas diretamente na rede local (que inclui Hospital São Sebastião Mártir e UPA) ou em outros centros de referência da região.

Hoje, a cidade gasta 22% da arrecadação em saúde, quando o mínimo constitucional é de apenas 15%, informa secretário de Saúde de Venâncio Aires, Ramon Schwengber. Mas mesmo assim o investimento ainda está aquém do ideal.

Paralelo a isso trabalha-se para postergar a demanda por serviços de saúde. A cidade realiza atividades sociais e de recreação – como danças, passeios, voluntariado — para incentivar seus moradores a ter uma vida ativa e melhor. Além disso, Capital Nacional do Chimarrão conta com 25 grupos de terceira idade e eventos voltados para essa faixa etária todos os fins de semana. Atualmente, o município conta com apenas uma instituição de longa permanência para idosos – o Lar Novo Horizonte. O espaço atende há 26 anos no no bairro Bela Vista. Atualmente 49 idosos lá são atendidos, contudo a demanda municipal é maior.

Centro de Convivência do Idoso está em formação

A partir de emenda parlamentar no valor de R$ 500 mil, a intenção da Prefeitura de Venâncio Aires é estruturar um Centro Dia/Centro de Conivência do Idoso, popularmente chamado de “Creche do Idoso”. O valor foi garantido no ano passado pelo deputado federal Heitor Schuch (PSB).

Nesta sexta-feira, o secretário municipal de Habitação e Desenvolvimento Social, José Arnildo Camara disse que o projeto está em fase de elaboração e que a intenção é dar o pontapé inicial ainda neste ano. Ele destacou ainda que para a Creche do Idoso é estudada uma parceria com a União das Associações de Moradores de Venâncio Aires (Uamva). “O espaço da Uamva poderia ser revitalizado e lá poderia ser estruturada a Creche do Idoso. Já conversamos com moradores próximos que elogiaram a iniciativa. Agora negociamos com a própria Uamva essa parceria”, argumentou Camara.

O prefeito Giovane Wickert explicou, na oportunidade do anúncio, que a proposta consta em seu plano de governo e tem a finalidade de atender pessoas da melhor idade cujos filhos e netos precisam trabalhar e não têm um lugar para deixá-las. A intenção é oferecer na Cheche do Idoso atividades e oficinas.

A presidente do Conselho Municipal do Idoso de Venâncio Aires, Bárbara Lúcia Hickmann, também está atenta à situação. Ela informa que é um espaço que vai oferecer atendimento com profissionais capacitados, de forma diurna, à famílias com direitos violados, avaliadas e encaminhadas pelos serviços de assistência social Cras ou Creas, porém evitando o abrigamento em instituições de longa permanência. “É um atendimento voltado para a autonomia do indivíduo, buscando a superação das situações que levaram a violação de direitos”, informou.

Compra de vagas

Com isso, também existe possibilidade do Município reduzir os valores atualmente empregados para manter idosos de Venâncio Aires em clínicas geriátricas da região. Arnildo Camara diz que a pasta subsidia a internação de 14 idosos, atualmente. O custo médio mensal, por idoso, é de um salário mínimo.

O Governo Municipal mantém parceiras com três entidades para a compra de vagas em asilos para a população de baixa renda. São unidades em Venâncio Aires, Cruzeiro do Sul e Taquari. São critérios para solicitar o auxílio internação: comprovar residência no município há pelo menos cinco anos; estar no Cadastro Único do Governo Federal e ter renda familiar de até três salários mínimos.

Asilo clandestino é interditado

Pela complexidade em legalizar uma casa de repouso, muitos se aventuram no caminho da clandestinidade. Nesta semana ação conjunta da Vigilância Sanitária Municipal e Polícia Civil, interditaram um asilo irregular que funcionava em uma residência no bairro São Francisco Xavier. Quatro idosos acamados foram localizados no espaço. O coordenador da Vigilância Sanitária, Everton Luís Notti, disse que a casa, não apresentava as mínimas condições para funcionar. A Polícia Civil informou que o caso será investigado para saber o tipo de tratamento que era dispensado aos internos.

“Recebemos uma denúncia e por se tratar de uma atividade que funcionava em uma residência foi necessário uma mandado judicial. Foram localizados quatros senhores de 53 a 79 anos. Todos acamados”, informou nesta semana Notti. “Se fosse um local possível de regularização, a interdição não seria necessária. Mas neste caso não tivemos outra alternativa, pois muita coisa estava em desacordo com a legislação”.

A fiscal da Vigilância Sanitária da 13ª Coordenadoria Regional de Saúde, Júlia Fontoura Gonzalez, acompanhou a situação. Ela disse que instituições de longa permanência para idosos precisam, por lei, serem adaptadas e não podem ser uma casa comum. “A Vigilância não tem intenção nenhuma de sair fechando instituições, mas para que dê certo ela precisa seguir os trâmites legais”, destacou.

“Sabe-se que existe demanda em nosso município, porém, existe uma legislação específica que norteia esses espaços e define como eles necessitam ser. Cada Coordenadoria Regional de Saúde, conjuntamente com a Vigilância Sanitária do município, em parceria com Ministério Público são os responsáveis pela fiscalização das instituições habilitadas, e em caso de clandestinidade, são esses órgãos os responsáveis pela fiscalização e cumprimento da legislação”, disse a presidente do Conselho Municipal do Idoso, Bárbara Lúcia Hickmann.

Envelhecer requer políticas públicas

Professora da Universidade do Vale do Taquari (Univates), a doutora em Ambiente e Desenvolvimento Arlete Eli Kunz da Costa diz que envelhecer com qualidade demanda mudanças na estrutura das cidades, na economia e em políticas públicas. Ela, que é também coordenadora do curso de Enfermagem da universidade, verifica que o aumento da população idosa gera necessidades de mudanças na estrutura social para que as pessoas, ao terem suas vidas prolongadas, não fiquem distantes de um espaço social, em relativa alienação, inatividade, incapacidade física e dependência.

Em sua tese de doutorado, apresentada em 2016, a professora abordou as tendências e necessidades socioeconômicas de idosos de municípios de origem germânica, italiana e açoriana, do Vale do Taquari. Os serviços de saúde estiveram entre os aspectos abrangidos pela pesquisa. Entre as principais constatações estava a dificuldade do acesso da população a alta complexidade. Para a doutora com o desafio para se adaptar a uma sociedade mais idosa, é preciso haver uma política pública permanente.

Conselho Municipal do Idoso

De acordo com a presidente do Conselho Municipal do Idoso, Bárbara Lúcia Hickmann, agora que o órgão está restruturado, os trabalhos entram em uma nova fase. “Entramos na fase de fundamentar o conselho, trazer formação aos conselheiros, de forma que cada conselheiro, representando sua secretaria ou sua instituição da sociedade civil saiba qual o real sentido de fazer parte de um conselho municipal”, destaca ela. O conselho é órgão fiscalizador da política pública de atendimento ao idoso, “ele em si não realiza nenhum atendimento a famílias ou idosos, mas ele solicita informações de como os serviços de assistência social, saúde, educação entre outros, vem sendo ofertados no município, e pode assim, propôr mudanças à gestão pública municipal”, destaca Bárbara.

Brasil

Pesquisa Datafolha mostra que a maioria dos idosos têm visão pessimista sobre as condições do país: 69% deles avaliam que o Brasil está pior hoje do que na sua juventude. Saúde pública e condições de trabalho têm as piores avaliações. A previsão é que, em 2029, o total de brasileiros com mais de 60 anos ultrapasse, pela primeira vez, a quantidade daqueles até 14 anos, aponta o IBGE.