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Quando o desenvolvimento sustentável nasce no quintal de casa

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Quando o desenvolvimento sustentável nasce no quintal de casa
Proprietária de uma agroindústria desde 2013, Ledi aposta no Café Colonial como alternativa de renda (Foto: Juliana Bencke/Folha do Mate)

Ledi Teresinha da Silva Maggioni, 51 anos, recebe os visitantes com pão caseiro, bolachas com gostinho da colônia e um sorriso de satisfação de quem vê no turismo uma nova opção de trabalho e desenvolvimento. No quiosque construído em meio às árvores, na propriedade rural em Linha Arroio Grande, no interior do município, ela cultiva um sonho e investe em um novo ramo de negócio, com o Café Colonial.

“Estou muito feliz porque o café está sendo bem aceito. É um café da colônia, mesmo. Quem vem, come coisas caseiras, que eu mesma faço”, destaca a empreendedora. Com menos de dois meses de funcionamento, o Café Colonial da Ledi já foi provado por mais de 200 pessoas e se consolida com uma das opções gastronômicas na zona rural de Venâncio Aires.

A aposta no turismo que faz Ledi vislumbrar novos negócios ultrapassa os limites de Linha Arroio Grande. Iniciativas como a dela viabilizam uma atividade considerada essencial para o desenvolvimento sustentável no mundo.

Angélica: “Os visitantes querem produtos locais, porque eles estão muito relacionados à memória afetiva” (Foto: Juliana Bencke/Folha do Mate)

Em 2016, a Organização das Nações Unidas (ONU) reconheceu o turismo como setor primordial para o desenvolvimento, pela capacidade de gerar empregos, promover a cultura local e gerir os recursos naturais. Com um entendimento amplo de sustentabilidade, o Plano Nacional de Turismo também evidencia a preservação dos recursos naturais, da cultura e da integridade das comunidades visitadas como princípios para o crescimento do setor.

Coordenadora do Departamento Municipal de Turismo, Angélica Diefenthäler comenta que o incentivo para “aproveitar o que já existe” no campo, proporcionar a interação dos visitantes com as lidas do interior e divulgar informações sobre as comunidades têm sido premissas do turismo rural em Venâncio Aires. “Buscamos orientar os empreendedores para que atendam o que as pessoas buscam, com menos impacto, e que estejam bem apropriados sobre o que a comunidade oferece, como uma festa de Kerb.”

Estímulo

Se a construção do quiosque no meio do mato, para receber os amigos e aproveitar momentos de descanso em família, era um sonho de Ledi desde que a família se mudou para a localidade, em 1994, o empurrão foi o convite para participar do projeto ‘Bergamoteando de Inverno – Sistema Colhe e Pague’, neste ano.

A ação, do Departamento Municipal de Turismo, integrou nove propriedades rurais que abriram as portas, durante os fins de semana, para visitação e colheita de bergamota e laranja. Ledi, que já tinha recebido na propriedade grupos de estudantes da cidade para vivenciar as experiências do interior, agarrou-se à proposta de agregar o turismo às atividades da agroindústria de panificados que gerencia desde 2013. “Estou adorando”, garante.

Angélica explica que o turismo rural na Capital Nacional do Chimarrão tem se ancorado na valorização da beleza e da simplicidade das propriedades do interior – um ‘prato cheio’ no município que tem mais de 85% de área territorial rural. “Incentivamos que os empreendedores percebam o que existe de atrativo natural nas suas propriedades, sem demandar muitas construções; que recebam as pessoas com coisas que têm em casa, para atender turistas que buscam, cada vez mais, qualidade de vida”, comenta.

Para ela, esse é um dos grandes diferenciais do turismo rural e aspecto decisivo quando se fala em desenvolvimento sustentável. “Quando penso em turismo rural, a primeira coisa que vem à cabeça é o inverso de turismo de massa. Aproveita-se o ambiente natural, pois ele é um atrativo, e os visitantes interagem com colheita, com os animais, com a alimentação natural.”

“Indústria sem chaminé”

Corrêa: “Sustentabilidade não é só cuidar da floresta, é cuidar da vida das pessoas” (Foto: Juliana Bencke/Folha do Mate)

Economista e administrador, o presidente do Instituto de Sustentabilidade e Resiliência, Volnei Corrêa, endossa as observações de Angélica Diefenthäler. Para ele, o turismo é um dos grandes exemplos de sustentabilidade – termo que, embora seja reconhecido pela ligação com o meio ambiente, também está diretamente atrelado ao equilíbrio econômico e social.

“Ser sustentável significa ser autossuficiente, desenvolver-se sem afetar o meio e sem criar desequilíbrio socioeconômico”, detalha. Ele observa que, muitas vezes, o resultado positivo de geração de emprego e renda de empresas, para o Município, é minimizado pelo custo de recolhimento de resíduos, pelo Poder Público, o que não ocorre em empreendimentos turísticos. “Turismo é um grande exemplo de sustentabilidade, é uma indústria sem chaminé”, enfatiza Corrêa.

Para o presidente do Instituto de Sustentabilidade e Resiliência, além de não poluir e gerar resíduos, o turismo é exemplo de desenvolvimento sustentável pois não demanda grandes investimentos e oferece possibilidade de agregar renda.

“É um negócio que exige pouco investimento, apenas infraestrutura do município”, afirma, ao salientar a importância de boas estradas para viabilizar o turismo rural. “O Poder Público deve manter as estradas em condições, tenha turismo ou não. Se ele puder manter e tirar proveito com isso, por que não? É uma lógica simples”, analisa.

Para Corrêa, a atração de pessoas de outras cidades para desfrutar do turismo local contribui tanto para os empreendedores quanto para o desenvolvimento do município. “Gramado e Canela são cidades que têm sua receita baseada no turismo. O desafio de Venâncio Aires é atrair pessoas de fora. Assim, posso assegurar que, dentro de alguns anos, o município sentirá os reflexos do turismo.”


Ledi recebe os visitantes com delícias caseiras, no quiosque construído ao lado de casa (Foto: Juliana Bencke/Folha do Mate)

Alternativa de renda e produto vendido na própria casa

Embora Ledi Maggioni tenha a agroindústria familiar de panificados como principal fonte de renda, a abertura do Café Colonial na propriedade em Linha Arroio Grande tem sido uma forma de agregar renda e, inclusive, aumentar a venda de produtos no próprio local.

O cardápio oferecido aos visitantes inclui pão integral, de aipim e de milho, além do pão ciabatta – recheado com presunto, queijo e requeijão. Os clientes também podem experimentar bolachas, bolos, abóbora e laranja em calda, torta, queijo, linguiça, morcilha, schmier e käschmier.

O café e o leite são colocados na mesas, cobertas com toalhas xadrez, e servidos na louça de porcelana. A linguiça fervida e o leite aquecido no fogão a lenha ajudam para criar o clima de ‘casa da vovó’ e resgatar sabores da infância dos visitantes. “Muita gente faz questão de ir até a panela no fogão, para servir o leite com a ‘natinha’. Acho incrível esse resgate”, comenta a proprietária do Café Colonial.

Além do cuidado com cada detalhe, Ledi lembra que todos os produtos são caseiros. “Faço praticamente tudo e todos os produtos são fresquinhos. Por isso, trabalhamos com reservas”, justifica. A empreendedora também salienta a preocupação em oferecer produtos de outras agroindústrias, como schmier, melado, linguiça e o queijo que integram o bufê.

Para ela, além de o café colonial ser uma nova forma de agregar renda, um dos benefícios ao receber os consumidores em casa é a venda de produtos da agroindústria no próprio local. “É um dinheiro certo, recebido na hora”, comenta ela, que também fornece produtos para o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) e em feiras e supermercados.

Para o economista Volnei Corrêa, a venda direta aos consumidores é uma alternativa que reforça a potencialidade dos empreendimentos turísticos. “Muitas vezes, as pessoas já produzem, e o que precisam fazer é apenas aumentar a produção, ou concentrar a venda no próprio local, sem a necessidade de ter que transportar até outros locais.”

Aposta e engajamento coletivo

Para a coordenadora do Departamento Municipal de Turismo, Angélica Diefenthäler, a abordagem democrática é um dos aspectos primordiais para a sustentação das iniciativas turísticas. Desde que foi retomado, em julho do ano passado, o Conselho Municipal de Turismo tem acompanhado de perto e participado ativamente dos projetos.

“A ideia é que se faça da forma mais democrática e coletiva possível, para gerar a sustentabilidade dessas ações, para que não se restrinja à Administração Municipal. Quando a comunidade participa, tem muito mais chance de dar certo.”



Juliana Bencke

Juliana Bencke

Editora de Cadernos, responsável pela coordenação de cadernos especiais, revistas e demais conteúdos publicitários da Folha do Mate

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