Quando nos referimos a Venâncio Aires como a Capital Nacional do Chimarrão, não falamos apenas do hábito da população em apreciar a bebida símbolo dos gaúchos. Esse título também carrega muito da história de um município que sempre plantou erva-mate.
Em meio a essa trajetória, especialmente formada na região do barro vermelho, e pela projeção de retomada do setor, Venâncio sedia hoje a 2ª Festa da Colheita da Erva-Mate, que tem abrangência estadual. O local escolhido para receber o evento é uma propriedade em Vila Santa Emília, quase na divisa com Linha 17 de Junho, onde os ervais crescem há mais de um século.
O anfitrião é Egídio José Wagner, 69 anos, que toca a própria lavoura desde os 14 anos, quando o pai, Norberto, faleceu. “Eu cresci embaixo dos pés de erva, porque meu avô [Pedro Wagner], já plantava. Ele chegou a ter uma fabriqueta de erva e o pai teve soque, vendia direto para o consumo”, conta o agricultor.
Na propriedade de 6,5 hectares, ele e a esposa Cleria, 64 anos, plantam três hectares de erva e a outra parte é ocupada por aipim. Cleria, que é da família Becker, nasceu em Linha Travessa e também vem de uma família produtora de erva-mate, cultura, portanto, que seguiu com o marido, com quem é casada há 45 anos.
Representatividade
Egídio Wagner não é apenas mais um entre as 425 famílias produtoras em Venâncio Aires. Ele é um dos sócios fundadores da Associação dos Produtores de Erva-mate do Polo Ervateiro dos Vales (Aspemva) e é conselheiro do Instituto Brasileiro da Erva-Mate (Ibramate).
“O momento é especial porque é uma pequena propriedade da agricultura familiar. Seu Wagner está há mais de 50 anos trabalhando, persistente, consorciando com outras atividades, mas a erva sempre se manteve. Ele tem um compromisso social também, pela participação na Aspemva e no Ibramate, então ele nos representa e acaba sendo uma homenagem à família”, destaca Ismael Rosset, coordenador administrativo do Ibramate.
“Uma poupança na propriedade”
Lidando há 55 anos com o cultivo de erva-mate, Egídio Wagner já viveu momentos diferentes na atividade, principalmente quanto ao preço. “Nos anos 1980, com mil arrobas a gente conseguia comprar um carro novo. Hoje precisaria cinco vezes isso”, calcula.
O agricultor afirma que, embora os últimos anos não sejam ‘tão fortes’ como em outras épocas, sempre se espera pelo melhor. “Eu tenho esperança que as coisas melhorem, ainda mais com produtores se unindo, associações se fortalecendo. Porque eu sempre digo: a erva não requer muitos gastos e não sofre tanto com a estiagem, então é sempre uma poupança na propriedade e gera imposto para o município.”
Esse ano, Egídio e Cleria aproveitaram para adquirir mil mudas das 28 mil disponibilizadas pela Secretaria de Desenvolvimento Rural, que custeou metade do valor para 38 produtores.
Ao avaliar os desafios da atividade, Wagner menciona que uma das dificuldades é a mão de obra. Na propriedade dele, por exemplo, a colheita tem ficado a cargo, principalmente, de tarefeiros ligados a uma ervateira de Linha Travessa, para a qual o agricultor vende a erva.
Sobre o futuro da produção em casa, ele diz esperar pela continuidade da atividade. Isso porque o único filho, Marciano, 41 anos, mesmo morando em outra propriedade, segue ajudando na lida com a erva. “Nosso neto [Eduardo, 9 anos] gosta muito de chimarrão. Talvez seja um bom sinal”, comenta Wagner, entre risos.
“Para mim, que lembro do meu pai e avô, é uma honra receber esse evento, porque sempre plantamos erva-mate. E isso acontecer em Venâncio, é um incentivo para os produtores e para o próprio município, já que somos a Capital Nacional do Chimarrão.”
EGÍDIO JOSÉ WAGNER – Agricultor
Números
Conforme a Emater, a área plantada de erva pouco variou de 2018 até agora – gira em torno de 1.350 hectares. Mas em relação à produtividade alguns números são mais positivos. Não apenas na produção anual (de 6 mil toneladas para 6,3 mil toneladas), mas na qualidade da produção.
Isso refletiu no aumento das vendas e a comercialização da erva contribuiu com R$ 1,791 milhão dentro do Valor Bruto da Produção Agrícola (VBPA) de Venâncio Aires em 2021, sendo que em 2020 foi de R$ 1,358 milhão – aumento de 31%.
Autoridades confirmam presença em Santa Emília
O evento de hoje em Santa Emília, realizado pelo Ibramate e pela Prefeitura de Venâncio Aires, começa às 15h e deve durar cerca de uma hora e meia. Segundo Ismael Rosset, coordenador administrativo do Ibramate, ainda não há confirmação por parte do governador Ranolfo Vieira Júnior, mas já confirmaram presença a secretária de Estado da Cultura, Beatriz Araújo, e o coordenador da Câmara Setorial da Erva-mate da Secretaria Estadual da Agricultura, Tiago Fick.
Também estarão representantes da Emater, do Ibramate, dos cinco polos ervateiros do Rio Grande do Sul – Alto Taquari, Região dos Vales (Venâncio Aires), Missões/Celeiro (Novo Barreiro), Nordeste Gaúcho (Erechim) e Alto Uruguai (Machadinho) – , das universidades da região (Unisc e Univates) que têm trabalhado a inovação para o setor, das soberanas da 16ª Fenachim, da Escola do Chimarrão e até da escola de samba Academia Samba Puro, de Porto Alegre, que terá a erva-mate como tema do carnaval em 2023.
Conforme Ismael Rosset, além da apresentação da região e discursos das autoridades, haverá um momento explicativo sobre boas práticas de cultivo e manejo de ervais e a poda de um pé de erva-mate, destaque na programação da festa. A árvore escolhida, aliás, foi plantada pelo casal Wagner em 1981, ano de nascimento do filho, Marciano.
300 mil toneladas – é a expectativa de colheita da folha no Rio Grande do Sul em 2022.
A Festa da Colheita ocorre anualmente, de forma itinerante, entre os polos regionais. Ilópolis (Alto Taquari) sediou em 2021 e o município de Novo Barreiro (Missões) será o anfitrião em 2023.
Assembleia
• Na manhã hoje, o Ibramate também realiza eleição da nova diretoria. A assembleia ocorre na sala de evangelização da paróquia São Martinho, em Vila Palanque, a partir das 10h.