Há um ano, a reportagem da Folha do Mate esteve numa propriedade de Vila Palanque, interior de Venâncio Aires, para mostrar o sistema de irrigação feito por um casal que cultiva frutíferas. A iniciativa de Dirceu e Cleria Hinterholz foi considerada um exemplo para demais produtores, preocupados, na época, com a iminência de mais uma estiagem. Fato é que, atualmente, a preocupação é outra: os dias seguidos de chuva ou de pouco sol, desde o início de setembro, já afetaram seriamente a produção agrícola do município. Lavouras de tabaco, milho e trigo, por exemplo, desenvolveram fungos ou cresceram de forma irregular. As perdas são na quantidade e na qualidade. Agora, as frutas e hortaliças também já sentem os impactos.
Se considerar o pêssego, por exemplo, que deveria estar na fase final de maturação e pronto para a colheita, o desafio é encontrar as frutas nos pés. Na propriedade dos Hinterholz, onde no ano passado se viam pessegueiros carregados e o perfume da fruta se sentia de longe, hoje o que se vê são pomos escassos, com formas e tamanhos irregulares. “Vai dar uns 300 quilos e olhe lá”, projetou o agricultor. Se isso se confirmar, a queda será superior a 70%, já que, em 2022, com os mesmos 75 pés, foram vendidos 1,3 mil quilos. Dirceu explica que o clima, de forma geral, tem impactado as frutas. “Além da chuva, a situação do pêssego já foi consequência da seca. Porque começou a florescer em abril, quando o normal é junho. E ele precisa de frio, com várias horas abaixo de 7 graus. Mas nosso inverno, novamente, teve poucos dias de temperatura baixa. O clima deixou as culturas agrícolas completamente desreguladas.”
Quanto à uva, o casal quase dobrou os parreirais, o que lhe daria condições de estimar até 4 mil quilos. “Se empatar com os 2,3 mil quilos do ano passado é lucro”, afirmou Dirceu. Na propriedade, o que também está seriamente impactada é a produção de amora e a queda deve ser de 50%. “Ela precisa de polinização, mas as abelhas não trabalham em dia de chuva”, lamentou Cleria.
30% de perdas
No caso das frutíferas, a Emater informa que já há uma queda de 30% em toda a produção de Venâncio Aires. “Baixo voo de abelhas, polinização deficiente, doenças no florescimento e falta de luz. É um somatório de fatores climáticas negativos. Também estamos começando a ter perdas nas cítricas, como limão, bergamota e laranja”, citou o chefe da Emater local, Vicente Fin. Quanto às hortaliças, a Emater ainda não tem números exatos, mas informou que as perdas também são elevadas, principalmente as cultivadas a céu aberto. Mas, mesmo as protegidas, dependem de mais luminosidade.
Feirantes não estão conseguindo produzir
Com a escassez produtiva, naturalmente diminui a oferta para compra de estabelecimentos e consumidores finais. Mônica Moraes, vice-presidente da Cooperativa dos Produtores de Venâncio Aires (Cooprova), diz que, dentro dos programas que a cooperativa participa para fornecimento de alimentos, a maior parte das entregas já está na reta final, portanto, neste momento, não há um impacto tão grande com redução de volumes.
No entanto, quanto aos feirantes, o clima tem afetado diretamente. “A qualidade não está tão boa e não estão conseguindo produzir. Nossos feirantes, que realmente têm aquela produção semanal para participar da feira, estão tendo dificuldades. Muitos não têm cultivo protegido e aí prejudica mais ainda. E mesmo nos protegidos, estão sentindo efeitos”, relatou Mônica, citando que o morango e as folhosas, como alface, são os itens mais prejudicados. “Também tem o atraso no plantio, já que não conseguem preparar a terra.”
Entre os produtores que participam da feira da Cooprova estão Amanda Sartório e Aline Brenner, que cultivam morangos em Vila Palanque. “Geralmente participamos e ano passado começamos em setembro. Mas neste ano ainda não conseguimos ir, porque não tem suficiente”, lamentou Amanda.
Segundo ela, a expectativa é de um prejuízo de 60% em relação à temporada passada, devido à falta de luminosidade e excesso de umidade. Entre os problemas, estão o abortamento de flores, mofo, doenças fúngicas e o albinismo, descolorindo o tom vermelho característico. “Com isso perdemos a chance de ter um morango saudável e não podemos repassar para os clientes. Então nós absorvemos essa perda.”
Oferta e preço
Jovane Eckert, responsável pelas compras de hortifruti de um supermercado de Venâncio Aires, destacou que alguns itens já se tornaram bem mais caros devido aos impactos causados pelo clima. “Alface, por exemplo, dobrou o preço. E o morango, que por ser safra teria um preço mais acessível, também está mais caro.” Eckert também comentou sobre os problemas na qualidade dos produtos em virtude da chuva. “Diminui a oferta e aí também vai encarecendo. Brócolis e couve-flor, por exemplo, devemos sentir mais os impactos a partir de agora, porque não estão conseguindo cultivar.”