Dados das estradas rurais são da Secretaria de Infraestrutura e Serviços Públicos e se referem às capatazias do interior.
Venâncio Aires tem mais 772 quilômetros quadrados de área e apenas 25 quilômetros quadrados são urbanizados, de acordo com o IBGE. Isso significa que mais de 90% do território é área rural e, nele, uma infinidade de estradas, vias secundárias, travessões e acessos a propriedades formam um emaranhado de caminhos de ‘estrada de chão’. Segundo a Secretaria Municipal de Infraestrutura e Serviços Públicos (Sisp), Venâncio tem cerca de 2,2 mil quilômetros de estradas rurais. Se fosse percorrer isso numa única via, equivale à distância entre Venâncio e Brasília, no Centro-Oeste do país. Mas essa mesma quilometragem está concentrada dentro dos limites venâncio-airenses e cabe às patrolas e demais máquinas das capatazias dos oito distritos do interior, mantê-las em boas condições de trafegabilidade.
Para se ter uma ideia da importância da manutenção das estradas do interior, sempre é um dos assuntos mais destacados e cobrados a cada eleição para prefeito, por exemplo. Assim como uma das prioridades de emendas parlamentares, com indicação de recursos de deputados para compra de maquinário. Olhando o cenário local, não surpreende, afinal, são mais de 7,3 mil propriedades rurais e 60 tipos de culturas agrícolas para escoar, o que inclui as milhares de toneladas de tabaco, milho e soja, só para dar alguns exemplos do ‘peso’ econômico que também circula em caminhões nas vias rurais.
Fato é que não é pouco chão para dar conta e a responsabilidade está a cargo de aproximadamente 50 pessoas e 35 veículos pesados, entre carregadeiras, retroescavadeiras, motoniveladoras (patrolas), rolos compactadores e caminhões (veja abaixo). Esse é o ‘corpo’ das chamadas capatazias – atreladas à Sisp -, que historicamente têm esse nome porque o líder de cada grupo era (e ainda é) chamado de capataz.
As distâncias das estradas rurais na ponta do mapa
A capatazia que mais tem estrada para manter é a de Vila Deodoro, no 3º distrito. De acordo com números da Sisp, são 521 quilômetros, o que inclui a rodovia estadual ERS-422, da Haas Madeiras ‘para cima’ – cerca de 35 quilômetros de estrada sem pavimentação. Além disso, são mais 15 quilômetros na estrada principal de Linha Alto Paredão Pires, a localidade mais ao extremo do mapa venâncio-airense e faz divisa com Boqueirão do Leão, Sinimbu e Santa Cruz do Sul. A partir dessas estradas, abre-se um leque de vias secundárias, além de centenas de acessos a propriedades, que variam de 200 metros a seis quilômetros.
Na sexta, 4, a equipe liderada pelo capataz Ismael Fockink trabalhou num desses longos acessos em Paredão Pires, conhecido como Travessão Fernandes. A estrada não tem saída, mas concentra cerca de 15 famílias e o transporte escolar precisa acessar. Da capatazia até o local de trabalho são 34 quilômetros (praticamente a distância entre Venâncio e o município de Vera Cruz).
Desafios
Para Ismael Fockink, o tempo de deslocamento é um dos maiores desafios do trabalho diário. “Dá para dizer que são as distâncias, porque tudo é longe, como a questão da busca do material e do deslocamento.” Fockink é motorista concursado e trabalha em Deodoro há 13 anos, dos quais cinco é capataz. Ele também comenta sobre como o clima influencia na rotina. “Quando chove muito, complica, porque como o terreno é muito acidentado, lava e abre muita valeta. O tempo seco até nos favorece, porque daí trabalhamos naquelas regiões onde é mais úmido.”
O capataz revela, também, que há uma lista de pedidos de serviços, os quais envolve a Secretaria de Desenvolvimento Rural. “Hoje temos cerca de 170 solicitações. São pedidos de acessos a propriedades, construção de açudes, limpeza, terraplenagens e caminhos de roça. Isso a capatazia vai fazendo além das estradas. Quando dá uma oportunidade, vai encaixando, mas o foco principal é a estrada.”
Maior área e maior densidade demográfica
- Embora Vila Deodoro concentre a maior quilometragem em estradas e é o segundo maior distrito em área quadrada (125,44 km), tem a terceira menor população. São 1.938 habitantes, conforme o Censo 2022 (dados levantados pela Secretaria de Planejamento e Urbanismo) – 15,45 habitantes por quilômetro quadrado.
- O maior distrito em território é Vila Estância Nova, com 154,65 quilômetros quadrados e 4.401 pessoas. De acordo com os números da Sisp, são 493 quilômetros de estradas para manter.
- Em Vila Palanque, ainda que sejam ‘apenas’ 59,19 quilômetros quadrados e 186 quilômetros de estradas, está a maior densidade demográfica, com 48 habitantes por quilômetro quadrado.
Particularidades do relevo e do solo
Com mais de 772 quilômetros quadrados de território, Venâncio tem relevos e solos diferentes. Essas condições geográficas também influenciam no trabalho das capatazias. Segundo o coordenador, William da Silva, a região serrana (abrangida pela capatazia de Deodoro) é abundante em material, mas, por outro lado, traz dificuldades. “Estradas íngremes, encostas, deslizamentos de terra e toda vez que tem os extremos do clima, é muito afetada. No inverno, toda água que cai na estrada, já vai abrindo valetas e soltando material. E no verão, quando é muito seco, por ser uma área de muito pedregulho, também acaba soltando.”
Em Centro Linha Brasil, distrito ao lado, Silva explica que há características semelhantes. “Na sua região serrana tem áreas com terra vermelha que, principalmente em dias de chuvisqueiro, ficam muito lisas e com muito barro. Não é tão abundante de material e, nas partes baixas, como Linha Marechal Floriano e Linha Antão, o solo já é mais arenoso.”
Barro vermelho e terra de areia
Em Vila Santa Emília, a maior parte é terra vermelha. “No inverno é mais complicado pelo barro que fica. E como essa capatazia também atende uma parte da região serrana, como Linha Monte Belo, Linha Lucena e parte de Linha Sexto Regimento, tem muita laje que as máquinas não conseguem soltar.”
Já em Vila Arlindo é mais plano, mas tem terra de areia. “É a região que mais temos problemas de buracos, porque o solo é arenoso. Em qualquer chuva, tem característica de abrir mais buracos. Exige o patrolamento mais frequente e também dá muitos borrachudos [quando o solo está muito úmido e compactado, causando ondulações] no inverno.”
Vila Estância Nova e Vila Mariante, William da Silva observa que são semelhantes. “Lá é o chamado ‘barro branco’, uma terra muito fértil para a produção agrícola, mas que demanda muito trabalho. No inverno tem problemas gravíssimos de borrachudos e também buracos nas estradas. Pelo tamanho, a grande quilometragem que tem na Estância, é uma das capatazias que mais tem demanda nos últimos anos.”
Em Vila Palanque, pelo barro vermelho, Silva diz que não abre tantos buracos, mas é uma região que, para fazer um bom patrolamento, precisa bastante material. “Se não colocar, dá muito barro e fica liso. Ali demanda muito material, com encascalhamento e britagem.” No Vale do Sampaio, o coordenador diz que a região é uma ‘mistura’ de serra com Santa Emília. “Boa parte do relevo é serra, tem a região de Alto Sampaio, Palmital e Santos Filhos. E tem parte com saibro e nas baixadas com terra vermelha.”
“Sabemos das dificuldades, mas temos dado resposta”, avalia Sid Ferreira
Sid Ferreira, secretário de Infraestrutura e Serviços Públicos (Sisp), avalia que, de forma geral, as estradas estão em boas condições. “Pelo fato que saímos de um ano muito duro, com as enchentes e enxurradas, praticamente destruindo todas as estradas do município e tivemos muito por refazer. E agora tem a manutenção, com limpeza de valetas, alargamento de algumas estradas e recolocação de material, para dar segurança e condições de trafegabilidade.”
Ferreira entende que as cobranças são normais e que há um esforço do poder público para atender a todos. “Temos um território muito grande, passamos de 2 mil quilômetros de estradas e para dar conta de tudo isso, só com muito trabalho. As equipes são empenhadas e temos investido em máquinas novas, para que não falte material, sempre lidando com a questão do combustível também. Sabemos das dificuldades e não são poucas. Mas em meio a tudo isso, temos dado resposta.” Só em diesel, em todo 2024, foram 292,6 mil litros – mais R$ 1,6 milhão, considerando a média de R$ 5,50 o litro, em dezembro do ano passado. O dinheiro para o diesel sai do orçamento anual da Sisp. “É um desafio todo ano, porque a Sisp não tem arrecadação própria, ela é uma secretaria que só presta o serviço”, destacou o secretário.
Aquisição de material para as estradas rurais
O coordenador das capatazias, William da Silva, vai ao encontro de Sid Ferreira, e avalia o trabalho como positivo. Ele ressalta que a Sisp tem um trabalho contínuo de reforço na aquisição de material também, seja brita, saibro ou cascalho. “O maior desafio sempre se refere à obtenção de material. Como se trabalha numa extensa área, a demanda é muito grande. E também o clima, que acaba nos prejudicando, não só danificando, mas tirando o tempo.”
A ajuda de Teresinha
Embora tenha ‘apenas’ 134 quilômetros de estradas, a capatazia do Vale do Sampaio, em Vila Teresinha, conta com sete funcionários e uma frota maior, se comparada à Vila Santa Emília, por exemplo, que tem 289 quilômetros de estradas, mas três funcionários e menos máquinas.
Segundo o coordenador, William da Silva, o 8º distrito acaba ajudando outros devido à localização. “A Santa Emília frequentemente é auxiliada pela capatazia de lá, assim como Deodoro. Fica mais fácil posicionar um pouco mais de equipamentos e funcionários na Teresinha, porque quando vamos a Marmeleiro ou Paredão, o maquinário fica lá por dias. Então se tem alguma emergência em Deodoro, Teresinha ajuda.”
Britadores e o material que vai nas estradas rurais
Atualmente, Venâncio extrai material das pedreiras de Linha São João, em Vila Estância Nova, e no Cerro do Baú, em Vila Arlindo. Em Linha São João, são cinco servidores, três britadores, uma escavadeira, uma carregadeira e uma retroescavadeira. No Cerro do Baú, há seis servidores, uma escavadeira, uma carregadeira, uma retroescavadeira, um caminhão e um britador.
Além disso, retiram cascalho e saibro em pontos licenciados nas próprias localidades, como de encostas na região serrana, e dos arroios Sampaio, Grande e Castelhano e do rio Taquari.
O 1º distrito, a Sede, não tem capatazia própria, mas também tem estradas rurais para manter. Segundo a Sisp, há vias nas Linhas Coronel Brito, Estrela, Ponte Queimada e Canto do Cedro, todas dentro da Sede.