A saca de 60 quilos da soja está sendo comercializada no valor de R$ 117,39 segundo levantamento do mercado agrícola, divulgado pela Emater. Em abril, o valor da saca era de R$ 90. O preço pago pelo grão é considerado um dos maiores do Plano Real.
Segundo o chefe do escritório local da Emater/RS-Ascar, Vicente Fin, existem vários motivos que elevaram o preço do grão. “Um dos primeiro motivos é a seca na região Sul. Foram três estados com perda na safra, a oferta é menor do que a normal, a produção final caiu bastante”, explica.
Fin também elenca o aumento de demanda a nível mundial. Outros países estão comprando mais o produto e, principalmente utilizando ele na ração de suínos e aves. “Tivemos problemas mundiais com a safra. Outras regiões produtivas tiveram prejuízos com o clima. Então, tem menos grão no mercado mundial”, frisa.
Todos os itens mencionados pelo engenheiro agrônomo levam a uma variável, os estoques mundiais baixaram. “Cresceu muito a demanda por soja nos países asiáticos. Nós [Brasil] tínhamos estoque de grãos para cinco anos. A soja em si estava estocada até três safras, mas como tivemos um prejuízo muito grande na lavoura, faltou grão para repôr o estoque”, comenta Fin.
A grande escassez de matéria-prima para as indústrias esmagadoras de soja, principalmente do Rio Grande do Sul, está provocando preços recordes na atual temporada da safra de soja 2019/2020. Com as exportações aquecidas, é um dos setores da economia que têm conseguido bom desempenho em meio à pandemia do novo coronavírus. A soja é o principal produto do agro brasileiro e item mais exportado pelo país.
Conforme o engenheiro agrônomo da Emater consegue-se ver um horizonte positivo sobre o mercado da soja a curto e médio prazo. “A tendência para a safra é se manter assim. É um bom momento para nosso produtor. Fazia anos que não chegávamos a esse patamar de preço. Estamos entre os cinco maiores valores da história”, enumera.
China
O engenheiro agrônomo também reforça que a China está buscando soja no exterior para recompor estoques e se preparar para o aumento do rebanho de porcos após a peste suína que matou milhares de animais no país. A soja do Brasil é uma das procuradas pelos chineses e é utilizada em forma de farelo para compor a ração. “Sem contar que a China está com uma briga comercial contra os Estados Unidos. O país busca estocar uma quantidade maior de grãos e não quer depender dos americanos”, observa Fin.
Expectativa é de aumento da safra de soja
A Emater já vislumbra um aumento significativo de área cultivada em Venâncio Aires. O plantio no município deve se iniciar depois do dia 20 de setembro e a expectativa é de um cultivo de 4,2 mil hectares. “Na safra passada a área plantada de soja foi em torno de 3,9 mil hectares”, relembra Fin.
O chefe do escritório local da Emater ressalta que já é perceptível o quanto que os produtores irão investir no cultivo do grão neste ano. “A soja vai ocupar algumas áreas onde os produtores cultivavam o milho, teremos uma pequena perda de área de milho. Mas a grande parte da soja será cultivada em locais onde tem trigo, aveia, cobertura verde e pastagens. O que chama atenção é o cultivo da soja no ciclo tarde. Aproximadamente 500 hectares onde são cultivados o tabaco irão receber a soja”.
Mercado favorável
Para esta safra a família Hermann, de Vila Teresinha, projeta o cultivo de 600 hectares de soja e vislumbram um cenário otimista. “Acredito que teremos um mercado muito positivo, preços bem altos. Não se imaginava que os valores chegariam a esses patamares. Esperávamos que passaria dos R$ 100, mas hoje já está bem mais. E acompanhando as notícias do mercado agrícola percebemos um mercado bom”, destaca Rodrigo Alex Hermann, que também explica que está na torcida para um ano com chuvas mais frequentes para evitar a quebra como aconteceu na safra passada, devido à estiagem.
Ele ao lado do pai, Paulo Hermann, está no aguardo da colheita do trigo para iniciar o plantio da soja. Apesar do valor da soja estar animador, Paulo é otimista e comenta: “o custo de produção também subiu, as sementes e adubos químicos também aumentaram devido à alta do dólar, é tudo um ciclo.”
“Com o valor da soja mais alto, a gente se anima em produzir mais e com qualidade. para isso pretendemos usar uma adubação maior. No entanto, com isso, os custos de produção também vão subir. A gente precisa de um ano bom, com chuvas regulares para ter esse retorno.”
RODRIGO HERMANN – Produtor de soja
Nas prateleiras dos supermercados, consumidor se assusta com o preço dos alimentos
Se por um lado o cenário é animador para os produtores e para as exportações brasileiras, a população já sente os efeitos nas gôndolas dos supermercados. Basta uma rápida pesquisa pelos principais itens da cesta básica e uma conversa com consumidores, que se identifica o aumento do valor de diversos itens.
Na manhã da quarta-feira, 2, a reportagem esteve em três supermercados de Venâncio Aires e conversou com alguns consumidores. Conforme eles, os itens que mais aumentaram foram arroz e óleo de soja. O óleo de soja de 900 ml pode ser encontrado de R$ 5,69 a R$ 5,99 em ambos os mercados. O pacote de cinco quilos de arroz variava de R$ 17,99 a R$ 26,99 em um dos supermercados. Em outro estabelecimento o valor era de R$ 19,80 a R$ 28,90.
Vera Lúcia Lord, de Estância São José, costuma fazer as compras mensalmente e, nesta quarta-feira, percebeu um aumento em praticamente todos os itens. Ela conta que ouviu queixas nas últimas semanas, mas não imaginava que os valores haviam aumentado tanto. “Como a gente é do interior o rancho é feito uma vez por mês. Tento aproveitar os dias de promoções, mas os mantimentos da cesta básica subiram muito. O arroz praticamente dobrou. O óleo de soja também foi um item que me assustei ao ver o valor”, disse.
Caroline Lenhardt, 15 anos, do bairro Macedo, foi ao supermercado ao lado da mãe. A jovem conta que a família vem observando um aumento significativo no aumento do valor do óleo de soja. “A gente até faz pesquisas. Mas está muito caro. O jeito é poupar.”
Procura X Oferta
Segundo a doutora em Ambiente e Desenvolvimento, Fernanda Cristina Wiebusch Sindelar, o valor dos alimentos está associado a oferta e a demanda, ou seja, a procura está muito maior que a oferta de mercado, fazendo os preços subirem. “A soja e o arroz tiveram uma redução na oferta de mercado e com o aumento da demanda decorrente da pandemia, fez os preços subirem. Com o pagamento do auxílio emergencial houve um acréscimo na renda da classe mais pobre da população que passou a demandar mais desses produtos”, destaca.
“É comum termos variação dos preços dos alimentos, especialmente sazonais, em todos os anos, mas este ano está mais expressivo, pelo aumento da demanda e menor oferta dos alimentos, e por isso o preço subiu tanto.”
FERNANDA SINDELAR – Doutora em Ambiente e Desenvolvimento
Fernanda, que é coordenadora do curso de Comércio Exterior e professora de Economia na Universidade do Vale do Taquari (Univates), informa que houve uma redução da área plantada de arroz, em favor da soja. “Em virtude da estiagem e da maior demanda internacional, já que os Estados Unidos também tiveram problemas com a produção de soja, o preço subiu em termos internacionais e afetando também a indústria de derivados. Para compensar a demanda doméstica, tem se importado alimentos de outros países.”
Óleo de soja
Com a compra do grão pelo exterior, o produto está faltando no Brasil. Fernanda comenta que como que o país está tendo que importar a soja, especialmente do Paraguai, com o câmbio desvalorizado mais tarifa de importação, o custo do produto sobe significativamente, e todos os derivados acabam subindo também. “A maior parte da oscilação dos preços está ocorrendo em virtude de movimentos na oferta e na demanda. Como a demanda está superior a oferta, os preços estão subindo”, evidencia a professora da Univates.
Entre os fatores que justificam a alta no valor, a doutora cita a estiagem que fez reduzir a produção de alimentos, e com isso a sua oferta nos supermercados. Além disso, Fernanda aponta que a moeda do país vem se depreciando novamente em relação ao dólar, o que faz com que produtos importados se tornem mais caros; além da produção brasileira ter sido inferior a demanda de mercado. “Com a pandemia do coronavírus, os brasileiros mudaram os seus hábitos de consumo, como muitos estão em casa e alguns perderam seus empregos/ou tiveram uma redução da jornada de trabalho, estão consumindo produtos mais básicos como o arroz e o óleo de cozinha, o que também justifica a maior demanda”, menciona a profissional.
Arroz
Além da soja, outro item que chama atenção pelo preço é o arroz. O aumento está relacionado a fatores como a produção reduzida, a dificuldade de transporte, a exportação para outros países e a alta do câmbio.
Além disso, segundo estudos do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), a safra de arroz 2019/2020 será a segunda menor da história, acima apenas da safra anterior, ocasionada pela migração de produtores para culturas mais rentáveis, como a soja. Conforme dados da Cepea, nos últimos dez anos, a produção de arroz no Brasil caiu, em média ,1,8% ao ano.
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