Casos e mortes por meningite bacteriana (versão mais ameaçadora da doença) voltaram a virar notícia no Brasil nos últimos dois meses. Só no Rio Grande do Sul, até julho, 20 pessoas morreram em 2023, quatro a mais que no mesmo período do ano passado.
Conforme a Secretaria Estadual de Saúde, também cresceu o número de casos, passando de 59 no primeiro semestre de 2022 para 76 no mesmo período deste ano – aumento de 29% nas infecções. Embora a subida de notificações, os órgãos de saúde ponderam que parte dessa elevação se justifica na comparação com 2020 e 2021 (anos de pandemia da Covid-19), quando o número de casos foi menor porque a população se cuidou mais, usando máscara e reforçando hábitos de higiene, por exemplo – lembrando que a meningite também é transmitida por via respiratória.
Em Venâncio Aires, até julho, foram registrados três casos de meningite bacteriana, um a mais que em todo 2022. Segundo a enfermeira da Vigilância Epidemiológica do município, Carla Lili Müller, esse caso a mais não representa surto, mas foi em paciente jovem adulto por Neisseria meningitidis (meningococo), uma bactéria altamente contagiosa que tem possibilidade de causar pequenos surtos com pessoas próximas ao doente. “Felizmente não aconteceu, mas estamos vigilantes. Estes pacientes, devido à sintomatologia que apresentam, procuram o hospital e UPA e os procedimentos necessários para diagnóstico estão à disposição dos profissionais de saúde”, destacou Carla.
A enfermeira observa ainda que o público que vem desenvolvendo meningite bacteriana (recém-nascidos e adultos) não estão nos públicos que podem receber as vacinas. “Mas é importante que a vacinação das crianças esteja em ordem para que elas não desenvolvam a meningite e também porque auxiliam na ‘proteção rebanho, que acaba protegendo os grupos que não recebem a vacinação.”
Quadro grave
A médica infectologista Sandra Knudsen explica que a meningite bacteriana sempre apresentará um quadro grave. “Paciente que tem a doença sempre é um quadro grave, que às vezes evoluiu rápido, já que é uma infecção nas meninges que recobrem o cérebro. Então é uma doença que tem risco elevado de morte e tem risco aumentado de ficar com sequela neurológica.”
Conforme a médica, no caso da bacteriana, é preciso tratar o mais rápido possível e esse tratamento é feito com antibiótico. “Nós temos três bactérias principais que causam a meningite bacteriana e para as três têm vacina. A meningite por Haemophilus, por exemplo, a gente praticamente não vê mais, desde que todas as crianças passaram a ser vacinadas. É uma doença que antigamente tinha muito mais. Mais um exemplo de como as vacinas são importantes na prevenção de doenças.”
Apesar de destacar a importância da imunização, a médica, que acompanhou os três casos locais de 2023 (todos se recuperaram), entende que eles não podem ser vinculados diretamente à falta de vacina. “São doenças sazonais, que aparecem casos de vez em quando. E nos três que acompanhei ultimamente, foram em adultos que não estão no público contemplado pelas vacinas na rede pública. Então o que a população precisa saber é que existe vacina para as três bactérias, mas a grande maioria das pessoas precisaria procurar na rede particular.”
Meningite bacteriana em Venâncio
• 2018: um caso (2 dias)
• 2019: um caso (55 anos)
• 2020: nenhum caso
• 2021: dois casos (14 anos e 84 anos)
• 2022: dois casos (4 dias e 53 anos)
• 2023 (até julho): três casos (33 anos, 36 anos e 56 anos)
Características
De acordo com a Secretaria Estadual de Saúde, a meningite é caracterizada por um processo inflamatório das meninges, membranas que revestem o encéfalo e a medula espinhal. É causada, principalmente, a partir da infecção por vírus ou bactérias. No entanto, outros agentes etiológicos também podem causar meningite, como fungos e parasitos.
Em crianças acima de um ano e adultos, os principais sintomas são: febre, dor de cabeça, vômitos, rigidez de nuca, convulsões e/ou manchas vermelhas no corpo. Em crianças com menos de um ano, os sintomas podem não ser tão evidentes.
As meningites são doenças com tendência de transmissão principalmente no inverno, período no qual as pessoas permanecem mais em ambientes fechados. Como em qualquer doença respiratória, a recomendação é evitar aglomerações e pessoas doentes, realizar a higienização correta das mãos e colocar a vacinação em dia, especialmente crianças e adolescentes.
Procura por vacinas já vem caindo desde antes da pandemia
Embora as infecções em moradores de Venâncio foram em pessoas não contempladas pelo esquema vacinal disponível da rede pública, a procura de quem pode receber as doses que protegem contra a meningite não tem sido das melhores.
Um exemplo é com a Meningo C, que se refere às crianças que fizeram o esquema primário de duas doses mais o reforço com um ano de idade. Em 2021 e 2022, a cobertura girou na casa de 70% e 80% em Venâncio, mesmo índice de 2018, sendo que a meta preconizada pelo Ministério da Saúde é 95% de cobertura.
Segundo a coordenadora do Setor de Imunizações da Prefeitura, Janete de Souza, de 2016 para cá é geral a queda na procura por vacinas. “A pandemia influenciou muito, mas há mais tempo tem havido uma descrença e uma falsa sensação nas pessoas de que certas doenças não existem mais”, avaliou a profissional de saúde.
Sobre os casos de meningite voltarem às manchetes no país e estado, Janete comenta que isso já foi identificado pelo Ministério da Saúde no ano passado, tanto que houve algumas mudanças: ampliação das vacinas Meningo C, para crianças de 5 a 10 anos sem doses dessa vacina, e também para trabalhadores da saúde, campanha que iniciou em junho de 2022 e encerrou em julho de 2023. Já no caso da meningocócica ACWY (conjugada), disponível aos 11 e 12 anos, também há possibilidade de adolescentes menores de 15 anos se vacinarem. A exceção, que começou em agosto de 2022 e segue até dezembro de 2023, vale para quem não fez nenhuma dose.
Vacinas contra meningite disponíveis no SUS
• BCG: protege contra a meningite tuberculosa, disponível ao nascer.
• Vacina meningocócica C (conjugada): protege contra a doença meningocócica causada pelo sorogrupo C, disponível aos 3 meses e 5 meses e reforço aos 12 meses de idade.
• Vacina meningocócica ACWY (conjugada): protege contra a doença meningocócica causada pelos sorogrupos A, C, W e Y, disponível aos 11 e 12 anos, como dose única.
• Vacina pneumocócica 10-valente (conjugada): protege contra as doenças invasivas causadas pelo Streptococcus pneumoniae, incluindo meningite, disponível aos 2 meses e 4 meses e reforço aos 12 meses de idade
• Pentavalente: protege contra as doenças invasivas causadas pelo Haemophilus influenzae sorotipo B, como meningite, disponível aos 2 meses, 4 meses e 6 meses.