O desafio do pós-Covid

-

A professora Daiane Beatriz Konzen, 37 anos, teve Covid-19 em julho deste ano. No entanto, faz apenas duas semanas que ela voltou a sentir o olfato e o paladar. Além das dores de cabeça persistentes por um longo período, foram quase três meses sem sentir o cheiro e o gosto de forma normal.

“Não sentia o gosto de nenhum tempero e percebi que meu paladar ficou muito aguçado para doce e salgado. Era como se a comida fosse três vezes mais salgada do que o normal e não percebia diferença de gosto de nenhum tipo de tempero”, conta. “Os cheiros de ‘longe’, como do churrasco do vizinho ou de grama molhada, por exemplo, ainda não sinto.”

A ausência de paladar e de olfato, aliás, foi o sinal que fez Daiane desconfiar que estava com coronavírus – dias antes, ela já estava com dor no corpo e de cabeça. Quando provou um doce de fio de ovos, percebeu que algo estava errado, ao não identificar o tradicional gosto que tanto apreciava. Logo depois, percebeu que não sentia nenhum aroma ao abrir a garrafa de vinagre ou mesmo de água sanitária.

A tosse veio dias depois do diagnóstico. Com 25% dos pulmões comprometidos pelo coronavírus, ela ficou hospitalizada e, depois, concluiu o tratamento em casa, com visita diária de enfermagem, para aplicação de medicamentos.

“Não tenho nenhuma comorbidade, nunca tive problemas respiratórios ou cardíacos, mas, mesmo assim, tive uma recuperação muito lenta. Fiquei bastante debilitada. A dor de cabeça era constante, os corticoides e anticoagulantes deixaram efeito de inchaço e também tinha muita fome”, conta Daiane.

Ela também observa os efeitos psicológicos. “Fiquei muito neurótica. Mesmo com o anticorpo, temo contrair o vírus de novo. Isso junto à pressão do home office, me deixou muito ansiosa e com crises de pânico. Fico triste e preocupada de ver as pessoas que não acreditam no quanto a doença é séria e a recuperação complicada.”

Casos graves tendem a ter uma recuperação mais lenta

Em geral, pessoas que tiveram quadros mais leves de coronavírus ficam até três semanas com sintomas como cansaço, fadiga e dor de cabeça, além de perda do olfato e paladar, também registrado por algumas pessoas. “Os sintomas mais comuns que permanecem após o tratamento são o cansaço e falta de ar, por causa das cicatrizes no pulmão, fibrose e hipertensão pulmonar”, explica o médico infectologista Marcelo Carneiro.

A infectologista Sandra Knudsen complementa que o tempo de sintomas varia, mas, geralmente, pessoas com quadros mais graves, que tiveram pneumonia e comprometimento pulmonar, tendem a ter uma recuperação mais lenta. “O paciente não tem mais a presença do vírus no corpo, mas ainda precisa recuperar a função pulmonar que foi afetada. Para isso, muitos necessitam de fisioterapia.”

Isso acontece porque a doença gera lesões nos pulmões que demoram a se recuperar, o que gera cansaço e fadiga. Os pacientes mais afetados são aqueles que precisaram de internação mais prolongada na Unidade de Terapia Intensiva (UTI). “Existem estudos mostrando que esses pacientes podem manter sequela mais grave do ponto de vista pulmonar ou cardíaco. Por isso, é muito importante que sejam acompanhados por médicos após a alta.”

“Os sintomas mais comuns que permanecem após o tratamento são o cansaço e falta de ar, por causa das cicatrizes no pulmão, fibrose e hipertensão pulmonar. Tem pessoas que ficam com sequelas permanentes e vão ter que ter uma reabilitação para tentar achar um novo normal, porque podem não se recuperar 100%.”

MARCELO CARNEIRO – Médico infectologista

Outro aspecto observado pela médica é que, além dos pacientes que tiveram casos graves, quem já tinha problemas pulmonares antes da Covid, tem maior risco de ficar com sequelas. “Mesmo curado da doença, os pulmões não voltam a funcionar como antes da Covid, ficam com menos capacidade pulmonar, e o paciente tem falta de ar.”

Da mesma forma como a doença atinge o sistema cardiovascular e tende a ser trombogênica, há possibilidade de trombose tanto de membros inferiores quanto nas artérias, com infarto, Acidente Vascular Cerebral (AVC) ou embolia pulmonar.

Sandra também observa que alterações neuropsiquiátricas, como fadiga, prostração que demora para passar, dor de cabeça, sintomas depressivos, de ansiedade e estresse também são manifestações que podem permanecer por mais tempo. “Existem relatos de pacientes nos quais os sintomas persistem mesmo seis meses depois da doença.”



Juliana Bencke

Juliana Bencke

Editora de Cadernos, responsável pela coordenação de cadernos especiais, revistas e demais conteúdos publicitários da Folha do Mate

Clique Aqui para ver o autor

    

Destaques

Últimas

Exclusivo Assinantes

Template being used: /var/www/html/wp-content/plugins/td-cloud-library/wp_templates/tdb_view_single.php
error: Conteúdo protegido