Há um ano os europeus se deparavam com a incidência do coronavírus em alguns países da região. Rapidamente, o velho continente foi tomado pelo vírus e as fronteiras se fecharam numa tentativa de conter o inimigo. Um inimigo na época pouco conhecido mas sua potência em ceifar vidas ficou logo evidente. Em poucas semanas a Europa inteira entrou em lockdown – tudo fechado, comércio, fábricas, escritórios, escolas, ninguém saia de casa na esperança de vencer o vírus. O primeiro confinamento na Europa perdurou por semanas, e chegou a três meses no Reino Unido, de março a junho. Os europeus tiveram que se adaptar ao novo jeito de viver, sem a liberdade de ir e vir. Desde então já tivemos três quarentenas, mas foi em dezembro do ano passado, quando o povo se preparava para as festas de fim de ano que as autoridades deram um novo sinal de alarme. As novas variantes aumentaram a transmissão do vírus de maneira exponencial, atingindo a população mais jovem. E a Europa ficou blindada novamente.
O fechamento do comércio e todos serviços não essenciais foi e continua sendo a estratégia da maioria dos governos europeus na tentativa de combater o vírus. Aqui não existe tratamento precoce com kit-covid, muito menos a automedicação. Na verdade, os períodos de confinamento e toque de recolher acontecem porque as autoridades sabem que sistema de saúde algum tem capacidade de enfrentar a pandemia sem a redução de contágio. Temos números contados de leitos e mesmo se construíssemos centenas de hospitais de campanha a demanda por leitos e oxigênio superaria a oferta. E é por isso, pelo medo de superlotação dos hospitais, que os governos continuam a impor restrições. O maior desafio do governo britânico, por exemplo, que demorou a impor o primeiro lockdown, é evitar que o sistema nacional de saúde (NHS) entre em colapso.O NHS é modelo de referência no mundo inteiro pois tem como base a integralidade, a universalidade e a equidade de todos os pacientes e trabalhadores. O SUS do Brasil foi baseado no sistema britânico. A diferença, no entanto, está no investimento que o sistema britânico recebe em comparação ao brasileiro. O NHS é o maior empregador do Reino Unido com 1,7 milhão de funcionários. E são eles os grandes heróis desta pandemia que assola o mundo inteiro. Nunca antes a saúde pública mundial foi tão desafiada. E os profissionais da saúde estão sentindo bem de perto o efeito devastador do vírus. A maioria está cansada e desgastada pois os últimos doze meses aqui na Europa foram de sobrecarga em todos hospitais. Cirurgias eletivas foram canceladas e muitos procedimentos não urgentes foram postergados. Consultas são por telefone or vídeo. Nos postos de saúde o foco está na vacinação.
Médica brasileira em Vilnius
Em toda Europa profissionais médicos de todo mundo trabalham na linha de frente contra a Covid. Na Inglaterra, cerca de 40% dos profissionais são estrangeiros. E aqui em Vilnius, temos uma médica brasileira atuando no sistema público de saúde lituano. Nesta semana conversei com Nadja Gircis Satyro, 40, urologista formada pela Unilus em Santos e atualmente atendendo pelo SUS daqui. Nadja tem descendência lituana por parte da mãe e desde 1995 visitava regularmente os familiares no país.
Depois da formatura em Medicina em 2008 ela decidiu se aventurar pela Europa e iniciou um programa de residência na Inglaterra, trabalhando em vários hospitais do NHS durante cinco anos. Dos plantões ingleses intensos a paulistana foi para a Alemanha, onde concluiu a especialização em urologia e continuou a atuar como médica durante quatro anos. O coração de Nadja, no entanto, esteve sempre na Lituânia e há três anos ela se transferiu para Vilnius para, com muita honra – segundo ela, cuidar da saúde dos lituanos. O sistema de saúde aqui é semelhante ao Brasil pois existem os hospitais particulares e universitários modernos e as instituições públicas nem tão bem equipadas, que carecem infraestrutura e investimento.
O atendimento é gratuito aos lituanos para consultas, exames, cirurgias e hospitalizações. Já para os estrangeiros o seguro saúde é obrigatório. Se na Inglaterra o encaminhamento para consulta com especialista passa obrigatoriamente pelo médico de família, aqui na Lituânia aqueles que têm convênio particular podem escolher o médico de preferência. Durante a pandemia os hospitais lituanos viveram um momento de pico em janeiro, com número elevado de hospitalizações e falta de profissionais. No hospital universitário Santaros grupos de voluntários, sem experiência médica, auxiliaram no manejo de pacientes e limpeza de leitos durante o pico da pandemia. Um dos meus colegas no trabalho participou do voluntariado. Enquanto a maioria da população jovem na Lituânia fala inglês fluentemente, Nadja nos contou que a maior dificuldade no trabalho aqui foi a adaptação à língua local. Mesmo tendo proficiência no lituano, o início foi difícil na conversação. Para consultas com pacientes mais velhos, e que falam russo, Nadja conta a ajuda de enfermeiras bilíngues. Além de atuar como urologista Nadja também atende em clínica particular como profissional de Acupuntura. A comunidade brasileira em Vilnius conta com cerca de 60-70 pessoas, bem pequena se comparada a outras capitais europeias. Aqui a maioria tem descendência lituana ou são estudantes residindo no país e trabalham em sua área profissional, como é o caso de Nadja.