À medida que os dias foram passando neste maio histórico, fomos nos dando conta das proporções da tragédia que se tornou a maior catástrofe climática do Rio Grande do Sul. Em meio à cobertura multimídia que Folha do Mate e Terra FM realizam, temos buscado ir além de noticiar os fatos e os estragos.
Ouvimos especialistas, projetamos os reflexos econômicos, sociais e ambientais, apontamos caminhos possíveis para prevenir e mitigar efeitos de novos eventos extremos. Exemplo disso é a entrevista com a professora da Unisc Priscila Pacheco Mariani, doutora em Recursos Hídricos e Saneamento, no caderno Nascentes que circula encartado nesta edição.
A especialista explica que chuvas intensas, enchentes e temporais tendem a ser cada vez mais frequentes, como efeito das mudanças climáticas, e aponta algumas estratégias que precisam ser adotadas nos municípios e de forma mais ampla, pensando no âmbito das bacias hidrográficas. Remover a população de áreas alagáveis é uma delas. Mas há outras tantas num contexto de reorganização das cidades. Enquanto vemos o avanço do asfaltamento nas ruas da cidade, o que se precisa fazer vai na contramão: é necessário ampliar espaços permeáveis, que facilitem a infiltração da água. Outra ação urgente e necessária é a recuperação da mata ciliar – vegetação no entorno de rios, sangas e arroios.
Há muito temos ouvido essas recomendações, assim como outros tantos alertas de especialistas e cientistas: é preciso reduzir a emissão de gases causadores do efeito estufa, o uso de combustíveis fósseis, o consumo desenfreado. Mas muito pouco tem se sido feito. É até difícil, muitas vezes, fazer essa relação com hábitos já tão comuns na nossa vida, como o uso de itens descartáveis, o descarte errado do lixo, a poluição da água.
Nesse momento em que a natureza mostra a sua fúria, como um grande desequilíbrio causado pelas mudanças climáticas, menos de um ano depois de duas enchentes de grandes proporções, infelizmente, a lição vem pela dor. Todos nós temos parte nisso e somos convocados a participar dessa reconstrução de nosso município e nosso estado, com responsabilidade socioambiental.
A esperança
Em meio à situação de calamidade, tristeza e incertezas por conta das enchentes, a esperança está sempre presente. E ela reverbera nas crianças. No fim de semana passado, conheci o recém-nascido José Felipe Pereira Lima. Ele nasceu na sexta-feira, 10, uma semana depois de a água do rio Taquari ter invadido a casa da família, em Picada Mariante, e eles perderem tudo. Como definiu a mãe, Joice Jociane Pereira, o caçula de três irmãos foi a “boa-nova em meio à tragédia”. José vai crescer tendo a idade como referência de quando aconteceu a maior enchente da história. Mas, muito além disso, vai sempre lembrar a esperança e alegria que trouxe em um momento difícil.
Na quinta-feira, 16, os colegas Letícia Wacholz, Leonardo Pereira e Renan Zarth estiveram na sede da Comunidade Nossa Senhora de Lourdes, em Vila Estância Nova, onde funciona um dos abrigos para pessoas afetadas pela enchente. Eles encontraram a família da pequena Heloísa (foto), que nasceu no dia 3 de setembro, quando outra grande enchente afetou Vila Mariante. Na época, a história dela foi contada pela Folha do Mate.
Agora, novamente a casa da família foi atingida, e a bebê de 8 meses está no abrigo, com os pais Sílvia Rodrigues Lima, 27 anos, e Danilo dos Santos Lima, 37, e as irmãs Ana Cláudia e Clara Danielly. A tranquilidade e a leveza das crianças também são doses de otimismo, para quem, assim como elas, aguardam para onde ir e recomeçar a vida.
E para finalizar esses relatos de esperança, não posso deixar de mencionar o exemplo da Lívia, filha dos colegas jornalistas Cassiane Rodrigues e Carlos Dickow. No auge dos seus 7 anos, ela está toda mobilizada na venda da ação entre amigos organizada pela Escola Municipal de Ensino Fundamental (Emef) Professora Odila Rosa Scherer, do bairro União, onde cursa o 2º ano.
Até mesmo gravou um vídeo para divulgação nas redes sociais, onde explica que a instituição teve muitos estragos por conta da enchente e convida as pessoas a auxiliar, adquirindo a rifa. Cada número custa R$ 2. Ontem, ela esteve pela Redação da Folha do Mate e Terra FM e vendeu diversos números. Não tem como ser diferente, vindo de uma menina tão estudiosa, dedicada e, agora, engajada para a recuperação da escola.