O homem de 39 anos veio consultar com dor no peito e o diagnóstico foi infarto agudo do miocárdio. Foi tratado seguindo os protocolos da época na CTE, uma unidade hospitalar que foi a precursora da UTI no HSSM. Decorridas algumas horas, fui novamente visitá-lo e o encontrei bem disposto, sem sintomas, sinais vitais estáveis, conversando como se nada houvesse ocorrido. Eis que, de repente, tem uma parada cardíaca bem na minha frente.
Era a morte instalando-se sem aviso. O aparelho cardioversor estava próximo e, já no primeiro choque que aplico, o ritmo cardíaco volta ao normal, o pulso pleno já podia ser sentido, o paciente recupera a consciência e pergunta: “O que foi que houve?”. E eu respondo: “Nada. Só um pequeno desmaio, já está tudo bem”. Depois da alta, não mais o vi. Tem idade para estar vivo, espero que assim esteja.
Não morreu porque não era a hora. Ouvimos muito essa frase. Será que existe mesmo uma hora inexorável e predeterminada para a morte casual, que ninguém consegue evitar de jeito nenhum? Eu acredito que não. Porém, como a morte é certa para todos, estamos sempre nos encaminhando para ela e, sim, haverá uma hora em que, esgotados todos os recursos, não poderemos evitá-la. Acidentes e violências de qualquer natureza são um capítulo à parte.
O que tenho observado na minha longa vida profissional é que a saúde não é a prioridade número um para a maioria das pessoas. Mais ou menos assim: meu carro, minha casa, minhas máquinas, todos os meus bens precisam de cuidados e de investimentos, mas o meu corpo é diferente, ele estará sempre inteiro e funcionante, no máximo adaptando-se ao passar da idade. Se ele me der uma surpresa, aí eu corro ao médico.
É preciso, sim, admitir que ‘saúde em primeiro lugar’ é um lema muito pronunciado, mas é pouco seguido. Aqui, tenho que falar no SUS. Saúde é direito de todos e dever do Estado, está na Constituição. Isso significa que, do bilionário ao indigente, todos têm o mesmo direito. Na prática: postos de saúde, UPAs, hospitais públicos sempre lotados, filas de espera virtuais infinitas. Enquanto isso, as clínicas e hospitais privados vivem uma realidade paralela: tudo está tranquilo, há vagas para consultas e internações sem atropelos. Ali, são atendidos convênios e particulares. Isso significa que algum dinheiro será gasto, desde a pequena taxa de participação da consulta até contas realmente altas.
Porém, está encrustado nas nossas mentes que saúde é grátis, é direito do povo, está na Constituição, nos discursos demagógicos e nas propagandas. Nenhum país do mundo, por mais rico e organizado que seja, está conseguindo cumprir isso. As reclamações de lá são as mesmas que as daqui. Enquanto isso, muitas pessoas se encontram precocemente com a morte, mesmo podendo gastar um pouco com a manutenção da sua saúde e da sua vida. Há exames, tratamentos e procedimentos na medicina que não podem esperar. Com meio século de vivência médica, sinto-me no dever de transmitir aqui, mesmo com limitação de espaço, o resumo do que digo aos meus pacientes e do que falo no meu programa de rádio que já dura 33 anos. Sim, mortes precoces podem ser evitadas em qualquer idade. Na maioria das vezes, isso só depende das prioridades de cada um.