No século passado, o trânsito em Venâncio, ainda tranquilo, era orientado pela atuação política. Um vereador, por exemplo, podia sugerir um projeto de lei alterando uma via preferencial. Uma votação com maioria simples na Câmara de Vereadores aprovava o projeto. Já alterações maiores provinham do prefeito ou de algum secretário de mais prestígio. Lembro-me de que a rua Osvaldo Aranha, a nossa eterna Principal, chegou a ter mão única ainda na década de 70, não lembro bem o ano. Era uma tranquilidade descê-la sem trânsito contrário, ainda mais com o escasso número de veículos existentes, o que permitia que motoristas até parassem no meio da pista para bater papo, por alguns minutos, com algum transeunte.
Eram tão poucos os carros que muita gente sabia a marca e a placa do veículo da maioria dos proprietários. Nós, os médicos, éramos localizados em qualquer lugar onde o carro estivesse estacionado, e até seguidos pelas ruas com direito a buzinadas e sinais de luz, como aconteceu algumas vezes comigo em urgências fora de hora. E sobre a mão única da Osvaldo Aranha: durou pouco. Na campanha política, um candidato a prefeito prometeu que, se eleito, a mão dupla ia voltar. Dito e feito, e assim permaneceu por muitos anos.
O alvorecer do século 21 já trouxe consigo a necessidade de algum estudo técnico para melhorar o trânsito nas ruas centrais. Porém, muitas mudanças sugeridas esbarravam em interesses comerciais e políticos. O certo, hoje, é que chegamos a um impasse. Estamos com uma frota de 54 mil veículos para 70 mil habitantes! E as ruas não podem ser alargadas, os cruzamentos são os mesmos, os pedestres aumentaram muito. Melhora-se a pavimentação, a sinalização, criam-se rótulas, faixas, mas a verdade é que temos um trânsito nervoso e perigoso nas ruas centrais e, ultimamente, também nas estradas do interior aonde o asfalto chegou. E aí vem um paradoxo: quanto mais melhorias, mais acidentes.
Nas redes sociais, a cada ocorrência os comentários xingam desde o prefeito até o presidente da república, sejam eles quem forem. Porém, na realidade, o que se vê é pouca gente respeitando os 40 km de limite de velocidade, alguns ignorando a sinalização, muitos distraindo-se com o celular e com o painel do carro, sem falar na ingestão de álcool e de drogas psicoativas. Tudo isso acontecendo sob a falta de uma fiscalização ostensiva.
Responsabilidade e paciência, eis o que o nosso trânsito precisa dos motoristas, motociclistas, ciclistas e pedestres. As gerações atuais ainda não verão túneis e elevadas no centro da cidade. Respeitemos, então, a realidade, respeitemos as pequenas rótulas da rua Armando Ruschel, por exemplo. Se o planeta Terra tivesse um rua circular que começasse e terminasse em Venâncio, essa seria a Armando Ruschel, que muitos consideram ser a ‘Preferencial do Mundo’, onde ninguém precisa parar para ninguém.