Dizem que na cordilheira do Himalaia mora um homem que todos conhecem por Oráculo. Você sabe, oráculo é alguém que tudo sabe e tudo vê, dá conselhos, e ainda é capaz de prever o futuro, tudo isso em qualquer idioma. Quase um deus. Atualmente, ele vive numa montanha de cinco mil metros de altitude situada no Butão, onde é procurado por peregrinos de todo o mundo. Hoje, está recebendo a visita de uma autoridade de um grande país. No meio da nuvem de poeira provocada pelo pouso de treze potentes helicópteros da comitiva, o ilustre visitante se aproxima do Oráculo que está sentado sob uma tenda rústica.
— Meus respeitos e minha reverência, grande Mestre — diz o visitante.
— Cof! Cof! Cof! — tosse o Oráculo. — Precisava trazer tanta gente junto e levantar essa poeira toda? Outros visitantes poderosos vêm a pé, às vezes pegam carona com um montanhês, levam dias para chegar aqui em cima.
— Minha comitiva é pequena, Mestre, são só 69 pessoas, incluindo minha amada esposa que estava louca para conhecer o Butão.
— Sei, sei. A fama dela a precede. Fiquei sabendo que já comprou lá em baixo 77 tapetes e uma tonelada de sal rosa do Himalaia… Enfim, qual é o motivo da sua visita?
— Bem, eu sou o presidente do…
— Já sei quem é, não se esqueça que eu sou um oráculo. Diga logo o que o aflige.
— Mestre, estou convencido de que o meu governo é muito, muito bom, mas o povo não acha assim.
— Hum… Convencido. Essa é uma palavra-chave. Você não está convencido, você É convencido, você se acha.
— Mas, mestre, eu cuido muito dos pobres e…
— Cuida para que eles nunca acabem, não é mesmo? Porque, se os pobres acabarem, tchau pra tí! Primeiro conselho: governe para acabar com a pobreza, deixe de atrapalhar quem trabalha, aí os pobres vão conseguir prosperar na vida. Você e sua enorme corte existem para servir ao país, e não o contrário! E pare de aumentar impostos.
— Mas eu preciso de dinheiro para governar.
— Então corte a gastança. Sua república é caríssima, perdulária, sua democracia é a mais cara do mundo. E está desgovernada, só pende para o lado esquerdo. Quem são os seus conselheiros, ou você vive só na sala dos espelhos onde sempre enxerga a mesma coisa?
— Tenho quatro dezenas de excelentes ministros, coloquei companheiros em todas as estatais, sindicatos, universidades, imprensa, nos poderes legislativos e judiciários.
— Sei, sei. Promoveram uma descondenação geral, todo mundo foi solto, inclusive você. Estavam temendo uma linha dura, um poder absolutista, onde a sua corte ia desaparecer. Aí, soltaram todo mundo para tomar o poder.
— Mestre Oráculo, eu vim aqui pedir orientação e não condenação. Não devo nada à justiça, até na televisão saiu isso.
— Pois perdeu a viagem. Nem a minha sabedoria milenar vai poder orientá-lo. Só vou lhe dizer duas palavras-chave: Saudade e Vergonha.
— Como assim?
— Saudade: seu povo sente saudade dos governos que já passaram, porque os que vêm vindo são sempre piores. Vergonha: essa é uma coisa que, quem perdeu, nunca mais encontra. E aí, é como água morro abaixo e fogo morro acima: ninguém segura, vira um vale-tudo! Então, obrigado pela visita, adeus, boa viagem. Ah, cuida pra não fazer tanta poeira com esse enxame de helicópteros.