Venâncio Aires - A primeira vez que dirigi um veículo foi aos nove anos. Sob a supervisão do meu pai e a vigilância dos meus jovens tios, prontos para qualquer eventualidade, arrisquei-me na direção de um pequeno trator Ford e fiz algumas voltas no terreiro da nossa propriedade. Depois, já mais crescido, tive ‘aulas’ nas estradas desertas do Interior a bordo do automóvel Simca do meu pai. Aos 19 anos, fui aprovado no exame de direção e ganhei a minha primeira Carteira Nacional de Habilitação.
Já meus três filhos me tiveram como instrutor eventual, mas foi a mãe deles que se encarregou de ensiná-los a dirigir lá no Parque do Chimarrão quando estava deserto, ou nas ruas periféricas da cidade onde raramente passava um carro. Era assim que se aprendia a dirigir quando ainda não havia a obrigação das autoescolas.
Em 1998, a criação do sistema de formação de condutores, recentemente derrubado pelo Conselho Nacional de Trânsito, se deu justamente porque o número de veículos cresceu muito no país e as vias públicas ficaram apertadas e perigosas para tanto amadorismo. Com o tempo, o preço para a obtenção da primeira CNH foi crescendo e atinge, agora, cerca de 4,5 mil reais.
Não passou pelas cabeças iluminadas do atual Governo a ideia de baratear esse preço eliminando taxas e negociando valores menores com os centros de formação de condutores. Simplesmente, resolveram abolir um sistema de formação de motoristas que, se não elimina as limitações próprias de cada indivíduo, pelo menos fornecia um razoável nível de conhecimento prático e teórico sobre o trânsito. Se assim já assistimos às tragédias diárias nas rodovias e às inexplicáveis colisões em qualquer rua das cidades, imaginemos como será o nosso trânsito invadido dentro de alguns anos por um exército de motoristas ainda mais despreparados.
Ou será razoável e prudente um leigo ensinar alguém a dirigir em meio ao movimento assustador nas ruas e estradas, usando um carro sem nenhum dos instrumentos de segurança presentes nos veículos das autoescolas? Há poucos dias, o Jornal da Band exibiu um triste episódio onde um “professor” tentava ensinar outra pessoa a dirigir e o carro desabalou numa marcha a ré desenfreada que matou um menino de dois anos.
O ano de 2026 tem o sobrenome mágico de “Eleitoral”. Qualquer coisa vale para tentar ganhar mais votos. Governos populistas são muito criativos em estabelecer regras ou aboli-las sempre de olho na popularidade. Vai piorar a segurança no trânsito? Azar. Danem-se. Não vai fazer muita diferença num pais onde sair à rua ou abrir a porta de casa é um perigo permanente.
Já há bolsas para tudo; bem que o populismo podia ter criado a Bolsa-CNH em vez de rasgar o Código de Trânsito Brasileiro.