Um homem ouviu falar de um sábio e resolveu procurá-lo para pedir conselhos. Sábios que se prezam sempre moram longe, num lugar inacessível, geralmente o topo de uma montanha pedregosa e deserta aonde só se consegue chegar depois de uma extenuante caminhada.
Pois o nosso homem finalmente está frente a frente com o sábio que, como não poderia deixar de ser, veste-se com uma túnica feita de sacos de aniagem, ostenta uma longa barba branco-amarelada e cabelos desalinhados que não veem tesoura há anos.
– Mestre, vim em busca de uma luz para a minha vida – diz o homem.
– A luz você tem dentro de si mesmo – responde o sábio – Basta acendê-la. Vou ajudá-lo a fazer isso.
– Posso começar a perguntar, mestre?
– Brróóó-burburburg…
– O que disse, mestre?
– Nada. Foi a minha barriga. Comi dois ovos de urubu fritos em banha de graxaim e isso não me caiu bem.
– Nossa! O senhor tem que comer essas coisas todos os dias?
– Não. Hoje foi um dia de fartura. Geralmente me alimento de insetos, umas folhas, às vezes uma lagartixa… Vida de sábio não é fácil.
– Mestre, como faço para subir na vida?
– Bem, vou dar o meu exemplo. Tentei várias profissões, não dei certo em nenhuma, larguei vários empregos, fiz dívidas, vim fugido para o alto deste monte e aqui fiquei. Virei um ermitão e passei a dar conselhos. Dá pra dizer que eu subi na vida uns dois mil metros, pelo menos.
– E de onde o senhor tira os conselhos que dá?
– Nem eu sei. As pessoas vêm aqui dispostas a ouvir o que querem e saem satisfeitas.
– Mestre, qual é a melhor maneira de a gente conviver com gente falsa e mentirosa?
– Ficando de boca fechada. Quando você é sincero o tempo todo com um sujeito falso, você está sempre em desvantagem. Então, se não quiser mentir também, pelo menos fique calado.
– E quando alguém me bater numa das faces devo sempre oferecer a outra, como dizem os ensinamentos cristãos?
– Sim, se você não se importar de andar por aí sempre com a cara inchada.
– Então o senhor me aconselha a reagir tipo “olho por olho, dente por dente”?
– Meu filho, a História está cheia de gente que foi tolerante demais e deu no que deu.
– Mestre, sempre ouvi que esta vida terrena é de sacrifícios, mas a recompensa virá depois. O senhor acredita na vida eterna?
– Ha-ha-ha-ha.
– Isto foi uma resposta?
– Não. Foi só uma risada. Mas vamos adiante nas suas dúvidas.
– Mestre, devo confessar que estou meio surpreso com algumas das suas respostas.
– Pensa que é fácil viver nessa cabana fedida, comendo grilos e ervas, fazendo as necessidades naquele monte de pedras, sem um mísero lampião a querosene, sem banho, sempre com a mesma peça de roupa? Pois eu aguentei aqui muito tempo, guardei todo o dinheirinho que as pessoas me davam pelos conselhos, consegui amealhar uma pequena fortuna. Quando eu me preparava para ir gozar a vida lá embaixo, me apareceu um sujeito aqui que começou me pedindo conselhos, mas acabou ele próprio me aconselhando a aplicar todo o meu dinheiro numa tal de ‘bitcoin’ que iria render quinze por cento ao mês. O sujeito levou meus sacos de dinheiro e nunca mais voltou! E eu estou sem saco!
– Pra botar dinheiro?
– Não!!! Pra dar conselhos!
– Mestre, fico triste com isso, mas não queria ir embora sem uma mensagem definitiva.
– Pois aqui vai: inteligência e ganância não cabem no mesmo cérebro. A ganância sempre cresce demais e engole a inteligência. E agora, meu filho, tchau pra ti! Mas põe uns troquinhos ali na caixinha, tá?