UMA LUTA DE TODOS

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Na última semana, o caso da influencer Mari Ferrer, 23 anos, voltou a ser discussão na mídia, após divulgação de imagens da audiência on-line. Em 2018, quando tinha 21 anos, a jovem denunciou ter sido vítima de estupro, em uma festa onde trabalhava como promoter, em Florianópolis (SC). No entanto, o empresário André de Camargo Aranha foi absolvido, pois o Judiciário considerou que havia falta de provas para o abuso sexual e que o acusado não tinha intenção de estuprá-la.

O caso ganhou repercussão na internet, especialmente, por conta do termo ‘estupro culposo’ – que caracterizaria um estupro sem intenção – o que não está previsto na legislação.

Entre os venâncio-airenses que usaram as redes sociais para se manifestar sobre o assunto estão Vitor Maciel da Silveira, 23 anos, e Janaica Cecchim da Rosa, 22 anos.
A pauta feminista está constantemente nas conversas do casal de namorados. Vitor explica que sempre foi orientado pela mãe para ser respeitoso com as mulheres e defender a igualdade de gênero. Há cerca de 5 anos, quando começou a namorar, passou a dar ainda mais atenção ao tema.

Para Vitor, “todo homem é machista”, mas isso precisa ser mudado, por meio da educação de toda a sociedade. Ele acredita que essas atitudes estão ligadas à forma de criação e à falta de informação, o que perpetua a ideia de que o homem é superior à mulher. “Eu já achei normal passar por uma mulher e ficar olhando. Mas depois pensava porque eu fazia isso. Com o tempo, me policiei. A Jana me chamava atenção, não por ciúmes, mas por saber como é ruim para a guria, e assim fui mudando isso”, relata.

Com a ajuda da namorada, o fotógrafo também passou a ser mais atencioso na relação com as meninas, já que trabalha fazendo ensaios com muitas mulheres. “Sempre que vou arrumar algo nelas, como o cabelo, eu peço antes, porque vou encostar no corpo delas, preciso pedir”, argumenta.

Segundo Vitor, o que auxiliou a mudar de postura e que acredita que deve ser feito por todas as pessoas, é buscar informações sobre o assunto, se abrir para novos conceitos e ideias. “Acredito que pessoas influenciadoras e os meios de comunicação devem falar sobre isso, trazer discussões e tirar o estupro do tabu, porque é um assunto sério que precisa ser falado”, acrescenta ele.

Atualmente, nos stories dos seus perfis no Instagram – @vitormsilveira e
@jannacecchim -, Vitor e Jana costumam compartilhar questões reflexivas sobre as lutas feministas. Quando o assunto estupro estava sendo muito comentado na semana passada, não foi diferente. “Quando aconteceu o caso da Mari, em 2018, teve muito conteúdo interessante nas redes e nós lemos muito sobre isso e nos munimos de informações, o que para mim ajudou a entender mais ainda sobre como isso é errado”, salienta o fotógrafo.

CONSTRANGIMENTO

Para Jana e Vitor, a reeducação para combater o assédio contra as mulheres é urgente na sociedade. Porém, eles acreditam que o processo pode demorar. “Muita gente acha que em cidade pequena não tem estupro, mas tem sim”, diz Jana.

A guria conta que já passou por alguns constrangimentos na rua, simplesmente por ser mulher. Uma vez, em uma loja, se sentiu mal e saiu por causa de um homem que não parava de olhar para ela. “Percebemos quando é um olhar malicioso. Eu me senti mal, queria xingar, porém tinha medo também, então saí. E esse cara não pode nem usar a desculpa da roupa, pois estava de bermuda até o joelho”, diz a jovem.

Jana também relata que não gosta de fazer caminhadas sozinha, por medo. “Quero fazer exercício na rua, mas me sinto insegura.” Outra situação citada por ela é quando deixa de comprar uma roupa ou compra e depois se sente mal, por ser curta ou decotada. “O Vitor sempre fala que não devo me sentir mal por isso e que a roupa tá linda, mas é um medo de usar e ser assediada”, lamenta.

Vitor e Jana trazem assuntos do cotidiano sobre feminismo para o relacionamento e buscam sempre conversar com amigos sobre
Vitor e Jana trazem assuntos do cotidiano sobre feminismo para o relacionamento e buscam sempre conversar com amigos sobre (Foto: Eduarda Wenzel)

“Um homem nunca vai saber o que é um estupro para uma mulher. Mas podemos ajudar a reeducar a sociedade e evitar essa violência.”
VITOR MACIEL SILVEIRA
Técnico em comunicação visual e fotógrafo

A VÍTIMA NUNCA É CULPADA

As psicólogas da Delegacia da Mulher de Venâncio Aires, pelo Programa de Atendimento a Mulher (PAM), Márcia Preuss, 47 anos, e Aneline Schneider Decker, 40 anos, esclarecem que a vítima de assédio nunca pode ser considerada culpada pelo fato. Elas explicam que o estupro está ligado à cultura machista, assim como as outras formas de violência contra a mulher.

Segundo Márcia, isso tem relação com a questão de o homem ser educado com uma ideia de posse, de poder, de ver a mulher como algo pertencente.

Ela comenta que um dos aspectos culturais que propicia a violência é a criação de meninos e meninas de forma diferente, induzindo a menina ao lar, ao papel de submissão, e dando mais espaço público ao menino. “Dou o exemplo do brinquedo de menino e de menina. Os masculinos induzem ele à violência e ao mundo externo, pois são carrinhos e super-heróis, que incentivam a força e potência. Já para as meninas induzem ao espaço privado, do lar. São poderes diferentes desde a infância, quase que um empoderamento do homem ao machismo”, lamenta.

A submissão, conforme a psicóloga Aneline, tem ligação com a vítima se sentir e ser vista como culpada pela sociedade. “A nossa sociedade tem tendência de culpabilizar a vítima. Mas precisamos educar todos a se responsabilizarem pelos seus atos e saber que cada ato tem consequência, além de sabermos o limite e o limite do outro. Por isso, o estupro é injustificável”, reforça.

As profissionais do PAM ainda observam que, muitas vezes, os agressores argumentam que a “mulher ‘pediu’ por estar com tal roupa ou por estar tal hora na rua”, mas todos têm responsabilidade por seus atos e precisam saber se controlar.

Márcia acrescenta que falar sobre violência sexual ainda é tabu na sociedade, contudo, é necessário para evitar o aumento de casos. “É fundamental falar disso, mostrar que tem uma rede de apoio, para que todas as vítimas de violência saibam que não são culpadas disso, que podem mudar esse ciclo e terão ajuda”, conclui.

Márcia Preuss e Aneline Schneider Decker atuam como psicólogas no Programa de Atendimento a Mulher (PAM)
Márcia Preuss e Aneline Schneider Decker atuam como psicólogas no Programa de Atendimento a Mulher (PAM) (Foto: Eduarda Wenzel)

APOIO ÀS VÍTIMAS

Segundo as psicólogas, é importante que a vítima denuncie casos de assédio para que o agressor não fique impune e também para ter acesso à rede de apoio. Além disso, a denúncia pode ser uma forma de romper com esse ciclo. “Em um primeiro momento, oferecemos o acolhimento à vítima, depois vamos fazendo o tratamento psicológico e trabalhar o autocuidado. É um serviço para mostrar que a mulher não está sozinha, nós estamos juntas e vamos ajudá-la”, enfatiza a psicóloga Márcia Preuss.

VENÂNCIO AIRES

No município, grande parte dos casos está relacionado à própria família e, na maioria deles, a vítima demora mais para denunciar. “Muitas vezes, na família, a vítima acaba não tendo coragem de denunciar porque o abusador é alguém que ajuda na economia familiar, ou porque tem medo de denunciar. São muitas questões de segredos e ameaças”, relata a psicóloga Márcia Preuss.

SOS

Se você está passando por alguma violência, não tenha medo de falar e procurar ajuda. Vá até a Delegacia de Polícia, na rua Tiradentes, 578, e registre um Boletim de Ocorrência.

  • SE LIGA

O assédio sexual é definido por lei como o ato de “constranger alguém, com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função” (Código Penal, art. 216-A). Em palavras mais simples, assédio ocorre sempre que não houver consentimento da outra parte. E, ao contrário do que muita gente pensa, não é somente o ato sexual consumado. Palavras, gestos e insinuações também podem ser consideradas assédio.

  • É ASSÉDIO:

  1. Abraçar, tocar, beijar ou encostar em uma pessoa sem permissão;
  2. Piadas ou uso de expressões de conteúdo sexual
  3. Contato físico não desejado
  4. Seguir uma pessoa ou tentar controlá-la
  5. Tocar uma pessoa para que outros vejam
  6. Convites impertinentes
  7.  Pressão para participar de ‘encontros’ e saídas
  8. Gestos ou palavras pornográficas, escritas ou faladas
  9. Ter conversas indesejáveis sobre sexo
  10.  Olhar de forma ofensiva
  11.  Atacar sexualmente

Fonte: Cartilha Assédio Moral e Sexual do Senado Federal e Blog Jurídico Certo

    

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