Quando era criança jamais me imaginava de óculos. Sempre me considerei uma pessoa ‘boa de vista’, como dizem nossas avós. Começar a usar óculos quando éramos pré-adolescentes/adolescentes precisava quase de terapia. No ambiente escolar, chegar de óculos na escola não era fácil. Por que não dizer, penoso. Trocar de lugar na sala era apenas uma consequência de quem precisava sentar próximo do quadro.
Não achava nada demais, mas como não precisava usar, era fácil falar, afinal, não fui eu que precisei encarar uma turma de escola e ser chamada de ‘caolha’.Para as meninas que sempre estão em descoberta e a vaidade sempre se faz presente, o óculos sempre era um acessório de ‘enfeiamento’. Se a lente fosse grossa então:
– óOO o fundo de garrafa ali!
Já adulta, as dores de cabeça constantes foram os primeiros sinais de que algo estava errado comigo. No fim do dia, os olhos vermelhos de quem passou o dia e passa, em frente ao computador no trabalho, em casa, na faculdade. Erros de digitação e imagens turvas foram o estopim para procurar um oftalmologista (segundo os Mamonas, o cara que cuida dos zóio). E o diagnóstico não podia ser outro:
– Letícia, você precisa de óculos.

Eu tinha 21 anos. Foi quando tive que me acostumar com a ideia e não podia me esconder, afinal, usá-lo para trabalhar era mais que óbvio.
Mas tive vergonha. Podem achar banal, mas me senti feia, estranha, como minha coleguinha do ensino fundamental quando era chamada de caolha. Até tentei me senti a intelectual, a professorinha, mas na verdade, nas primeiras semanas me sentia como uma vovó, que necessitava ‘daquilo’ para enxergar.
Até chegou a passar na minha cabeça que só porque usava óculos eu não poderia nem mesmo me maquiar. Lembro que na época muita gente disse que eu poderia optar pelas lentes. Nada contra elas, mas até hoje não penso em usá-las.
Não tinha volta. Era uma necessidade. Saí em busca do meu novo companheiro e com a lista de pré-requisitos: discreto, discretíssimo, quase transparente. Paguei um pouquinho mais do que imaginava e escolhi um modelo que me disseram que a fulana de tal tinha um igual. Consolo que deu certo.
No início usei ele em casa. Apareci com ele no trabalho e na maioria dos dias deixava o coitadinho na bolsa. Erro meu. O tempo só fez eu prejudicar ainda mais a visão. Depois de um ano, voltei ao oftalmologista e a visão estava pior. Isso me afetou e afeta ainda, tanto que sempre tenho a impressão de que estou ‘vendo’ menos.
Mas esse medo me fez acordar, a enxergar, literalmente. Até que passei a encará-lo como um acessório necessário e básico do dia a dia. E deu certo!
Hoje ele não pode sair mais da minha bolsa e passa, a maior parte do tempo nos meus olhos. De dia, à tarde, à noite.
Se eu não usar, sei que algo está faltando. Os olhos avisam. Só eles me permitem ver, de verdade, as coisas como devem ser e são. Só eles me deixam ver detalhes e aquele passarinho voando de uma janela à outra.
Ele se tornou tão fiel e necessário, que hoje encaro ele até no chimarrão com as amigas, em aniversários, jantas e no happy hour. óculos tornou-se, não só para mim, mas para todas nós, um acessório de luxo. é chique usar óculos. é da moda. Modelos variados, armações com cores diversas. Tem um modelo para cada ‘cara’, cada jeito mulher de ser.
Por falar nisso, acho que está mais do que na hora de adquirir um novo companheiro. Agora, não precisa ser mais discreto, discretíssimo, transparente. Já estou aceitando abusar um pouquinho.
Alguma sugestão?



