Espero que estejam errados, que as coisas mudem de rumo, mas até agora há uma situação sendo divulgada pela mídia que de tão incômoda, de tão cruel e de tão bárbara, não há como passar um dia sem lembrar. Os fatos apurados até o momento indicam uma realidade difícil de acreditar.
Quem acompanha esta coluna, sabe que procuro falar de coisas boas, de situações divertidas, de momentos alegres. Desculpem, não há como ficar à parte do que aconteceu com o Bernardo. Falando assim, parece que ele fica ainda mais próximo de todos nós. E como não ficaria para quem tem filhos e os ama sobre todas as coisas?
Carrego comigo uma bola no estômago desde aquela notícia. Tem um mal estar que vai e vem. Volta toda vez que alguém retoma o assunto, que aparece uma nova informação na mídia, que surge uma foto na rede social, como a da sala de aula onde há pais abraçados a seus filhos, exceto um.
Não tem explicação humana, não tem razão, não tem o porquê. Simplesmente, não dá para aceitar o que as acusações indicam que fizeram aquele pai e aquela outra que soube carregar o título de madrasta com todo o significado de um dicionário e um pouco mais. A má, que de tão má, matou.
Que me desculpem outras madrastas, mulheres que aprendem a amar filhos de outras pessoas, que cuidam, que protegem, ou que pelo menos respeitam os entes de seus amados. Por favor, a partir de agora, busquem outra classificação.
Chega a assustar o que encontrei no dicionário:
DO MICHAELIS ma.dras.ta
sf (lat vulg *matrasta) 1 A mulher casada, em relação aos filhos que seu marido teve de núpcias anteriores. 2 Mãe que maltrata os filhos. adj 1 Avara, ingrata, pouco carinhosa. 2 Diz-se do que traz dissabores e tristezas: Sorte madrasta.
E quantas tristezas…
Os autores dessa crueldade são seres, mas não são humanos. E acalmem-se os protetores dos animais, também não vou colocá-los nessa categoria. Para quem gosta de desenho infantil e conhece alguns personagens fofos e amáveis, nem de monstros dá para chamar. Desculpem de novo, mas a única classificação que me ocorre é de que são demônios. Seres apodrecidos, desprezíveis. Distância, por favor.
Terminaram com a vida de uma criança e, por consequência, de duas. Mataram a que odiavam e o que vai ser da que amavam? Como vai crescer este bebê sabendo que os pais cometeram uma brutalidade sem tamanho? Será que vão conseguir esconder? Não há como tapar essa sujeira toda.
Tanta gente no mundo fazendo o impossível para ter uma criança nos braços, lutando contra burocracias e leis, fazendo os mais difíceis e dolorosos tratamentos para ter um filho. Minha bola no estômago tem nome, se chama revolta. Tem explicação, é tristeza.
Não sei se espero justiça, pois não sei se há medida capaz de ser justa numa situação destas. Fico imaginando um menino de onze anos perambulando pela vida, pedindo atenção, ansiando um carinho, o vejo sob uma tarde cinza, de cabeça baixa. E espero que hoje esteja em algum outro lugar, correndo e sorrindo, num dia ensolarado de céu azul. Do fundo de meu coração, chego a pensar que Bernardo está melhor agora, que foi acolhido por um Deus amoroso e alegre, que o deixou entrar, que na reunião da escola lhe deu colo, um beijo na testa e disse para ele: Meu filho, eu te amo.
Já li sobre isso e aproveito o espaço para pedir: cuidem das crianças, sobretudo, amem as crianças. Não sejam coniventes com situações de violência, desprezo e desamor. Sempre podemos fazer alguma coisa. Quem se cala, se omite, permite. Não permita.
Encerro com uma frase tão verdadeira e humana que tudo o que fugir dela não deve fazer parte de nossas relações. Busquei suas referências, mas encontrei variações de escrita e de autores, então, peço licença a seu criador para compartilhá-la.
A essência da vida é amar as pessoas e usar as coisas, nunca o contrário.
Nunca o contrário, por favor.
>> Texto da coluna ‘Coisas de Mãe’, publicado hoje no caderno Mais Saúde, veiculado na Folha do Mate.