Maria Rodrigues: 86 anos de uma história de luta e fé

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Na semana em que se celebra o dia da Consciência Negra, Folha do Mate conta a história da moradora de Vila Arlindo, no interior de Venâncio Aires, Maria Nair Rodrigues

A história dela é de garra, de fé e muito trabalho. Filha mais velha de Manoel Rodrigues e Sebastiana dos Santos, Maria Nair Rodrigues, 86 anos, viveu a vida toda em Vila Arlindo, interior de Venâncio Aires. Foi lá que criou os seis filhos e mais dois netos. Com o passar dos anos e muito suor, conseguiu construir e ampliar a casa, deixá-la bonita como sempre quis.

Quem chega na residência da quase nonagenária dona Maria, encontra tudo arrumadinho. Apesar da idade, ela é quem cuida da casa e só precisa de ajuda para tarefas mais pesadas. Do lado de fora, o destaque são as flores no pátio, que ela tanto gosta de cuidar. Dentro de casa, os bibelôs, os guardanapos de crochê e os arranjos de flor artificial deixam a casa enfeitada. “Agora nessa idade tenho uma vida boa. Com o dinheiro da aposentadoria posso comprar o que eu quero e o que tenho vontade de comer. Gosto de ter minha cama sempre limpinha e a casa arrumada. Antigamente não tinha isso, às vezes nem um lençol eu tinha”, relembra dona Maria.

As marcas do tempo se sobressaem na pele negra e enrugada, mas contrastam com a memória firme na hora de relembrar o que passou. Embora nunca tenha tido a oportunidade de estar na escola e, por isso, seja analfabeta, dona Maria escreveu uma história de luta, de esperança e resignação. Conversar com ela é aprender sobre a vida, em lições embaladas em sorrisos e serenidade. “Se eu não tivesse Deus, não estaria aqui”, resume.

maria nair rodrigues
Ter a casa arrumada e enfeitada é uma satisfação para a idosa, que também adora receber bem as visitas (Foto: Juliana Bencke/Folha do Mate)

Filha mais velha, entre quatro irmãos, ela aprendeu cedo a se virar. Trabalhou em troca de roupa e comida. Colhia arroz com foice, era ‘peão’ na lida do tabaco e fazia faxina em outras propriedades. Ela conta que sempre se deslocava a pé, até localidades como Seival, e voltava ao meio-dia para amamentar os filhos pequenos – isso, quando não os levava a tiracolo para a roça. “Ainda bem que as pernas eram fortes”, brinca.

Quando o cansaço batia e a fome apertava, foi sempre à fé em Deus, em São Sebastião Mártir e Santo Antônio que dona Maria se apegou. “Trabalhava de dia para comer de noite. Meu falecido marido tinha problema com bebida, mas Deus é bom e graças a Ele consegui criar meus filhos. Eu deixava de comer para dar para as crianças.”

Do que ela mais se orgulha é, apesar da pobreza, ter conseguido ‘encaminhar’ os filhos. “Sou feliz porque todos estão bem. No meu aniversário, sempre digo que não preciso de presente. É só eles continuarem assim que cada vez ganho um ano a mais de vida. Sempre ensinei a terem respeito, não fazerem coisa errada”, ressalta a mãe de José Ari, 66 anos; Clair Terezinha, 60; Angela Maria, 56; Claudiomiro, 54; Marinês, 52; e Sergio Leandro da Rosa, 46. São ainda 16 netos, entre os quais Sandro e Marcelo foram criados por dona Maria como filhos, além de 10 bisnetos.

Maria com os seis filhos, seu principal orgulho (Foto: Arquivo pessoal)

Rotina e passatempos

O rádio é a principal companhia de dona Maria, que mora sozinha, apesar do acompanhamento dos filhos. Ela adora escutar música e dançar, especialmente ‘bandinhas’. Também gosta de ficar junto ao fogão a lenha.

Quando recebe visita, fica contente em poder oferecer um café, um chimarrão e uns doces. Entre os principais passatempos estão a lida com o pátio. “Adoro mexer com as flores, vou tirando as flores secas e conversando com elas”, relata

Consciência Negra

  • Novembro é reconhecido como o mês de Consciência Negra. O dia 20 de novembro homenageia Zumbi, o líder do Quilombo de Palmares, que morreu nesse dia, em 1695. Em 2024, pela primeira vez, a data foi feriado nacional.
  • Para Maria Nair Rodrigues, apesar de muita coisa ter mudado ao longo dos anos, ainda há racismo. Um dos exemplos citados por ela é que ainda há resistência, em bailes da terceira idade, em dançar com quem é negro. “O racismo ainda não terminou. Alguns olham a gente dos pés à cabeça e não tiram para dançar por causa da cor.”


Juliana Bencke

Juliana Bencke

Editora de Cadernos, responsável pela coordenação de cadernos especiais, revistas e demais conteúdos publicitários da Folha do Mate

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