Defendida por uns, questionada por outros, a polêmica reforma do ensino médio foi aprovada, na quarta-feira, pelo Senado, e encaminhada para sanção do presidente Michel Temer. Entre os principais pontos do projeto estão a flexibilização das disciplinas, a carga horária ampliada e a possibilidade de profissionais de outras áreas ministrarem aulas.

Entre as alterações previstas pelo projeto está a ampliação da carga horária, das atuais 800 horas para mil horas anuais. A reforma também divide o currículo entre conteúdos da Base Nacional Comum Curricular (60% da carga horária) e itinerários formativos (40%) – áreas do conhecimento que poderão ser escolhidas pelos alunos. Já no início do ensino médio, o estudante poderá optar por uma das cinco áreas: linguagens, matemática, ciências da natureza, ciências humanas e formação técnica e profissional. 

Foto: Kethin Meurer / Folha do MateEstudantes poderão optar pela área de conhecimento que quiserem estudar
Estudantes poderão optar pela área de conhecimento que quiserem estudar

De acordo com a Medida Provisória (MP) que estabelece a reforma, cada escola organizará as áreas e as respectivas competências e habilidades esperadas do aluno segundo seus próprios critérios. Disciplinas de artes, sociologia, filosofia e educação física – que estavam excluídas do projeto inicial – serão mantidas no currículo básico.

Escolas estaduais

De acordo com o titular da 6ª Coordenadoria Regional de Educação (6ª CRE), Luiz Ricardo Pinho de Moura, ainda não há uma posição oficial do Estado a respeito de como a reforma funcionará nas escolas públicas. Em breve, será realizada uma reunião onde será definido como tudo irá proceder. 

Quanto ao ensino médio Politécnico – implantado na rede estadual de educação há cinco anos -, o coordenador de Educação ressalta que, independentemente da Medida Provisória (MP), ele não existe mais. A partir deste ano, o Ensino Médio passará a ter um ensino regular com carga horária de mil horas – uma das exigências da MP. “O Rio Grande do Sul já tem a carga horária de mil horas, diferente de alguns estados que têm 800 horas”, explica. 

Moura avalia a reforma do ensino médio de forma positiva, porque suprime algumas necessidades e tem um foco maior nos interesses dos estudantes. “Vejo como muito importante, pelo fato do aluno ter a oportunidade de opinar e participar, tendo um ensino médio voltado a um ensino técnico profissionalizante, canalizando mais para uma profissão.”

“Temos que nos perguntar sobre a viabilidade”

Foto: Juliana Bencke / Folha do MateHammes observa as dificuldades de efetivação da proposta
Hammes observa as dificuldades de efetivação da proposta

Para o professor do Instituto Federal Sul-rio-grandense (IFSul) e doutor em Filosofia Itamar Luís Hammes, a proposta de trabalhar com áreas de conhecimento e permitir que o aluno escolha uma área para estudar é positiva e acompanha uma tendência internacional. “O que preocupa é se a educação brasileira está preparada para isso. Temos que nos perguntar sobre a viabilidade dessa questão”, pondera. 

Com experiência de mais de 20 anos em sala de aula, Hammes observa que o adolescente chega ao ensino médio com muita dificuldade para fazer escolhas – reflexo das falhas na educação básica. “A nossa educação não incentiva o protagonismo. é necessária uma formação anterior muito mais forte para que o estudante possa fazer escolhas.”

Além disso, na opinião do docente, colocar em prática o novo ensino médio, priorizando a formação integral defendida na proposta, demanda estrutura.

“Se o aluno vai permanecer mais na escola, é necessário que se tenha espaços que possibilitem essa formação integral, que vai além da sala de aula. é preciso ter campo de futebol, biblioteca, espaço para aula de música, laboratórios bem equipados”, cita. 

Hammes também entende que a previsão de recursos para efetivar as mudanças deveria acompanhar o decreto, assim como um plano de carreira para os professores. “Uma reforma educacional exige investimento.”

Notório saber

Na visão do doutor em Filosofia, outro ponto da reforma que chama a atenção é a possibilidade de profissionais com notório saber – não, necessariamente, ligados à educação – ministrarem aulas no itinerário de formação técnica e profissional. 

“A educação tem que ser feita por profissionais, pessoas preparadas, que estudam e têm preparo para ensinar. Os países que têm modelos de ensino parecidos com o que está sendo proposto trabalham fortemente a formação dos professores”, compara. “Fico preocupado ao ver uma reforma sem uma discussão profunda com especialistas, professores e, principalmente, estudantes.”

Conheça alguns pontos do projeto

– As regras da reforma do ensino médio valerão para as redes de ensino público e privado, mas o cronograma de implantação deverá ser elaborado no primeiro ano letivo seguinte à data de publicação da Base Nacional Comum Curricular. A implementação ocorrerá no segundo ano letivo depois da homologação dessa base curricular.

– Português e matemática continuam obrigatórios nos três anos do ensino médio;

– As disciplinas de filosofia e sociologia, que tinham sido excluídas da proposta pelo Poder Executivo, passarão a ser obrigatórias apenas na Base Nacional Comum Curricular, assim como educação física e artes. Entre as línguas estrangeiras, o espanhol não será mais obrigatório, ao contrário do inglês.

– O texto aprovado pelos senadores estabelece uma transição para o ensino médio em tempo integral. Em cinco anos, a ampliação será das atuais 800 horas anuais para mil horas. Após isso, a meta será de 1,4 mil horas ao ano, mas o texto não estipula prazo.

Juliana Bencke

Editora de Cadernos

Responsável por coordenar as publicações especiais, considera o jornalismo uma ferramenta de desenvolvimento da comunidade.

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