Foi no fim da tarde de 26 de abril de 1965 que Cônego Albino Juchem ‘caiu de cama’ com fortes dores na região do abdômen. Era o ‘começo do fim’ da vida do vigário de Venâncio Aires, que adoeceu gravemente devido à diabetes, nefrite e pancreatite. Mesmo sob cuidados médicos, nada foi suficiente para ele se recuperar. Acabou falecendo na madrugada de 30 de abril, aos 72 anos, 48 deles dedicados a Venâncio.
Nesse quase meio século no município, foram 16.613 batizados. E foi justamente este sacramento a última celebração de Juchem, realizada ainda em 26 de abril de 1965, no mesmo dia em que adoeceu. Aquela criança que então teve sua ‘iniciação cristã’ pelas mãos do padre é Vilson Roque Barden, hoje com 57 anos, e cujo registro está nas páginas já amareladas dos livros guardados pela Paróquia Católica São Sebastião Mártir.
“Eu ter sido a última criança que ele batizou? Jamais imaginaria isso”, destacou Barden, espantado, quando a reportagem lhe mostrou o registro. A surpresa do técnico em refrigeração, que mora em Travessa São José, se justifica porque ele não tem a tradicional ‘lembrança de batismo’, geralmente assinada por quem celebra o ritual.
Pelo registro na paróquia católica, Vilson Barden (então escrito com W) foi batizado com 10 dias de vida, na Igreja Matriz São Sebastião Mártir. Os padrinhos foram Geraldo Kipper e Melita Jaeger (já falecidos).
Barden é o terceiro filho de Cyro (1931-2001) e Noely (1934-1996), que tiveram quatro meninos: Clécio (falecido); Aureo, 59 anos; Vilson, 57; e Marcos, que tem 48 anos, todos criados no Grão-Pará, já na entrada para Linha 17 de Junho. Era lá perto, na igreja São Judas Tadeu, que o casal levava os filhos regularmente nas missas. “O pai e a mãe nos criaram nos costumes e participar das atividades da igreja fazia parte. Foi na São Judas que fiz a 1ª Comunhão, em 1975”, recorda Barden.
Casamento
Além do batizado, a Igreja Matriz São Sebastião Mártir também foi palco do casamento de Vilson Barden. Em 9 de janeiro de 1988, ele, com 22 anos, subiu ao altar com Lourdes Kappaun, então com 20 anos. A celebração foi feito pelo padre Elo Back.
Nas fotos do álbum de casamento, um registro mostra um fato inusitado daquela noite: o noivo entrou na igreja acompanhado pela tia, Clari. “De tardezinha, ainda na ‘lida’, a mãe foi tirar leite e a vaca pisou no pé dela. Precisou imobilizar o pé e não tinha como caminhar, por isso a tia me acompanhou”, conta Barden, entre risos.
Vilson e Lourdes, que completaram 34 anos de matrimônio, têm três filhos: Daiane, 33 anos; Daniela, de 26; e Eduardo, com 20. Também são avós do Ryan, 12 anos, e da Sofia, de 5.
Atuação na comunidade
Talvez seja apenas uma coincidência, mas a última criança batizada por Cônego Albino (reconhecido pela grande participação em ações na comunidade), também virou um homem atuante na comunidade onde mora.
“Sempre participamos ativamente de tudo, seja nas escolas dos filhos, na comunidade São José, ou na Matriz, nas festas do Bastião. E sempre foi assim, a gente está disposto a contribuir”, destacou Barden, que está há oito anos na presidência da sociedade.
Além da sociedade, Barden já presidiu e passou por outros cargos da diretoria da comunidade católica da igreja São José, na Travessa. Em 2019, por exemplo, foi um dos festeiros no evento da localidade.
Para o técnico em refrigeração, embora muita coisa tenha mudado em relação aos costumes religiosos, a vida em comunidade é importante. “A igreja sempre foi um local de reunião e isso, para as famílias, é muito importante. Mas não só na igreja, nas sociedades e comunidades também. Isso deveria estar mais presente nas famílias.”
“O sacerdote que batizou quase todos os habitantes”
De acordo com informações da publicação ‘Fé e obras: a vida de Cônego Albino’, organizada pela historiadora Angelita da Rosa, Albino Juchem foi ordenado padre em 1916, aos 23 anos e, logo depois, designado para Venâncio Aires, única paróquia onde trabalhou, entre janeiro de 1917 e abril de 1965.
Esse quase meio século na cidade o fez criar raízes e participar ativamente de momentos importantes, como o início da construção da Igreja Matriz, em 1929, e do Hospital São Sebastião Mártir (HSSM), em 1935.
Já no fim da vida, literalmente, ele recebe o título de Cidadão Venâncio-Airense, conferido pelo Legislativo em 29 de abril de 1965 e sancionado pelo então prefeito Salvador Stein Goulart. Diz a lei: “Por ter seu nome diretamente ligado ao desenvolvimento e progresso dessa comuna, tornando-se, por isso, credor de gratidão e de respeito de toda coletividade.”
Quando faleceu, em 30 de abril, o ‘Jornal do Dia’, publicação religiosa, escreveu: “Venâncio perdeu seu cidadão mais importante e mais ilustre. Morreu o sacerdote que batizou quase todos os habitantes, que casou a maior parte. Conhecia todos e também seus problemas.”
Foi enterrado ao lado da Igreja Matriz, que tratava como “filha primogênita”. Em 1970, cinco anos após a morte, os restos mortais foram transferidos para a esquina da Travessa São Sebastião Mártir com a rua Tiradentes, onde foi erguido um busto em sua homenagem.
Além das obras da igreja e do hospital, Juchem foi uma das lideranças da organização sindical dos trabalhadores rurais, da fundação do Centro Promocional João XXIII e em benefício do Colégio Aparecida e outros educandários, tanto que uma das maiores escolas públicas da cidade leva o nome dele (o CAJ ou, para muitos, o ‘Estadual’, que aliás completou 57 anos ontem). Cônego Albino Juchem também é nome de rua, no bairro Cruzeiro.
2.564 – foi o número de casamentos celebrados pelo Cônego Albino em Venâncio. O último ocorreu em 24 de abril de 1965, quando casou José Geraldo Schuck (já falecido) e Maria Aparecida da Rocha. A reportagem não conseguiu contato com a família.
Cônego Albino nasceu em Forqueta, atual localidade de Arroio do Meio, em 10 de maio de 1892, há 130 anos. Curiosamente, ele é quase um ano mais novo que o município onde passou a maior parte da vida e que ‘nasceu’ em 11 de maio de 1891.