Desde ‘piazito’, Aldo José da Silveira é envolvido no meio tradicionalista e nas lidas do campo. Com 73 anos, o padre Aldo, como é conhecido, representa a cultura gaúcha por diversos cantos do mundo. Com uma lista de viagens internacionais, os maiores companheiros de Aldo são a pilcha e o mate. Natural de Alto Rio Pardinho, distrito de Gramado Xavier, Aldo possui 44 anos de vida religiosa. Neste ano, Aldo foi escolhido como patrono dos Festejos Farroupilhas de Venâncio Aires.
Folha do Mate – Desde quando reside em Venâncio Aires?
Aldo José da Silveira – Em 1997 residia em Vila Estância Nova, saí em fevereiro de 2007 e voltei em janeiro de 2015, morando na cidade de Venâncio Aires, para atender o povo nas diversas paróquias.
Quando iniciou seu envolvimento no tradicionalismo?
Desde piazito. Com uma hora de vida, o Dr. Anuar Aess que realizou o parto viu que estava com o bico na boca e disse: “Gauchinho, coloca essa porcaria fora”. Minha mãe conta que, imediatamente, não usei mais, nem mamadeira. Lembro também que com um ano já tomava chimarrão, até tinha a minha cuia sempre ao lado do fogão a lenha e, desde piazito, usava a bombacha. Aos 4 anos, quando comecei andar a cavalo, na égua tordilha, ‘égua madrinha’ (que puxa a tropa de mulas e burros) me levaram de caminhão de tabaco a Lajeado e lá encontraram um par de bota que me servia. Na vida de seminário, usei pouco a bombacha, por ter só uma e o lenço era branco, o que o meu pai usava e me deu um de presente.
Já participou de uma entidade tradicionalista?
Sim, em Viamão no Seminário Maior, nos anos de 1975 a 1978, no CTG Centauro dos Pampas. Na década dos anos 80, em Amaral Ferrador, no CTG Passo da Lealdade. Depois, não aceitei mais, porque eram muitos nas cidades em que passei.
Quando começou a celebrar missas crioulas?
Logo que me tornei padre, em 1979. Antes já ajudava nas celebrações das missas crioulas.
Qual a diferença de uma missa crioula para a missa tradicional?
É a mesma missa, a diferença é o linguajar gaúcho e a simbologia, o ambiente é diferente, trazendo fortemente a nossa cultura gaúcha. A missa crioula é uma missa igual as outras. Só quem tem uma cultura própria, um jeito próprio. Não podemos esquecer que a missa crioula não pode ser um enfeite folclórico dentro de celebrações cívicas e culturais, ou para preencher uma programação. É importante lembrar sempre que é preciso fazer memória de um Deus crucificado e ressuscitado, pelo bem do seu povo dentro de sua história de salvação.
Qual a origem da missa crioula?
A missa foi criada pelo padre Paulo Aripe, em 1959, mais voltada para o campo, mas é a mesma missa católica, o que muda é a simbologia e os termos gauchescos. Desde o Concílio Vaticano II (1965), a Igreja adaptou a Missa Latina para a língua vernácula própria de cada região. Em 1967, os padres gaúchos Paulo Murab Aripe e Amadeu Gomes Canellas solicitaram uma autorização ao arcebispo de Porto Alegre, Dom Vicente Scherer, para se rezar a Missa Crioula, que é uma adaptação da missa católica em linguagem, rima, estilo e símbolos tradicionalistas.
A autorização foi apreciada, aprovada e concedida, na época, pelo episcopado gaúcho, para celebrá-la em ocasiões extraordinárias. Desde então, tornou-se comum entre os Centros de Tradições Gaúchas (CTGs) durante as comemorações da Semana Farroupilha. Portanto, a Missa Crioula é uma missa católica, do rito latino (Apostólico Romano), mas com cantos, preces, orações próprias em estilo campeiro.
Ela tem o mesmo sentido espiritual e religioso de uma missa tradicional, contudo por características particulares recebe a denominação de ‘Missa Crioula’. Nela, os peões e as prendas expressam seu amor a Deus e ao próximo e celebram a fé por meio da cultura gaúcha. Nesta missa, Jesus Cristo, por exemplo, é chamado de ‘Divino Tropeiro’, Nossa Senhora, de ‘Primeira Prenda Celeste’, Deus é chamado de ‘Pai Celeste’ e assim por diante.
Quantas missas crioulas já celebrou?
Nos meus 44 anos de padre, não tomei nota, mas calculo que foram mais de 300 missas crioulas.
Você celebra as missas crioulas em outras épocas do ano ou apenas em setembro?
Presido (celebro) em qualquer tempo, mas o mais forte é na Semana Farroupilha, no mês de setembro.
Quando não tem missas crioulas, você celebra missas tradicionais?
Sim presido (celebro). Alguém, um dia, lá em Arroio do Meio, me disse que as minhas missas sempre são crioulas. Entendi porque em cada reza trago essa marca dentro de mim.
Para você, qual a missa mais marcante que você já celebrou?
Não saberia dizer por que cada momento foi diferente e especial.
Durante as missas crioulas, há batizado, casamento ou outros sacramentos? Qual a mais tradicional de acontecer?
Sim. A mais tradicional é o batizado.
Por onde você passa sempre está pilchado. Qual é o sentimento de propagar a cultura do Rio Grande do Sul para outros lugares?
Sempre vou pilchado. O sentimento é de alegria de levar o Rio Grande junto comigo nas viagens.
Para você, qual a importância de disseminar a cultura gaúcha para as novas gerações?
De não ser apenas um sul-rio-grandense, mas um peão que através dessa cultura leva as marcas fortes de nossa tradição, como a liberdade, a paz, o amor, a união e o querer bem a todos.